CARTAS DE UM OUTRO MATOSINHOS
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Isabel Lago
Diretamente de Portugal

Caros amigos de SJDR

Hoje vou falar-vos de uma igreja do Bom Jesus de Matosinhos existente no Estado de S. Paulo e que mudou de nome e de patrono por um episódio um tanto ou quanto bizarro

  MOGI DAS CRUZES - São Paulo

 

 

Mogi das Cruzes situa-se na Região Leste do estado de S. Paulo, distando 63 kms da capital. Tem 721 kms 2 e uma população de mais de 332.000 habitantes

Está situada num lugar privilegiado para as ligaçõ es entre S. Paulo e Minas Gerais . Com a chegada dos bandeirantes ao Brasil, acreditava-se que esta região próxima ao rio Tietê pudesse ter as tão sonhadas minas de ouro. Os bandeirantes afirmavam ter sido atacados por índios, cujos nomes era "Mongi". Já outros falavam de índios Boigi, Bougi, Bogi. Naquela época eles não sabiam se a origem do vocábulo era tupi-guarani, ou português arcaico. De início a vila de Mogi, tinha recebido o nome de Santa Anna ou Sant'Ana, que era o nome de sua padroeira.

     Poucos anos depois surgiram nos documentos oficiais o nome de Santa Anna das Cruzes de Mogy, Santa Ana de Mogi-Mirim, Santa Ana de Bogi-Merí entre outras menos frequentes.

O surgimento do complemento "das Cruzes" :

Era costume judicial administrativo, marcar os limites de cada vila com cruzes pintadas em pedras ou fincadas no chão. Outra lenda diz que o surgimento da palavra "Cruzes" vem de uma história de amor proibido na qual o rapaz consegue chegar até sua amada seguindo cruzes que lhe haviam surgido no céu ou na floresta. Tempos depois o "Santa Ana" e o "Mirim", desapareceram e passou-se a utilizar só o nome Mogi das Cruzes.

 

 Com o decorrer dos anos, foram se formando famílias e residências e com o tempo apareceram necessidades como por exemplo o sistema de água encanada e esgoto, que abasteceria as residências através da coleta de água em poços, rios, bicas e chafarizes. Em Mogi, havia o córrego Ipiranga perto da Matriz, e várias bicas freqüentadas pela população. Há uma lenda que diz que Mogi teria crescido graças ao poder de uma bica d'água, quem bebesse dessa fonte acabava se fixando na cidade e contribuindo para o crescimento e o desenvolvimento da cidade

No início do século XVIII, todos partiam de S. Paulo para as lavras mineiras, utilizavam o caminho que saía em direcção à Penha, passando pelo local onde posteriormente foi levantada a igreja do Bom Jesus de Matozinhos do Brás e, mais à frente, atravessavam Mogi das Cruzes. Um negociante que percorreu esse trajecto em 1717, descreve-nos assim a vila:

Esta villa poderá ter athe duzentas cazas, mas muy solitaria; porque todos os moradores vivem nas rossas, e só vem em quinta feira de Endoenças, e outras festividades do anno. Há tambem hum collegio dos Padres do Carmo, e huma frequezia de que era vigario hum filho de hum ferrador (...) .

  Além da igreja de Mogi das Cruzes existem, na área deste percurso entre S. Paulo e Minas Gerais, várias outras dedicadas ao Bom Jesus que suspeito estarem ligadas à devoção do Senhor de Matosinhos, mas de que não consegui ter informações por falta de resposta das autoridades locais aos contactos que com elas tentei.    

Igreja do Bom Jesus de Matozinhos - 1781

 

 

Inicialmente denominada de Igreja do Bom Jesus de Matozinhos, acontecimentos ocorridos no século XIX, levaram-na a ser conhecida, mais tarde, também por Igreja de S. Benedito

O historiador local, Jurandyr Ferraz de Campos , explica-nos como as duas devoções aparecem a par na mesma igreja:

  ( ...) O Santuário do Senhor Bom Jesus (...) teve como fundador a José de Carvalho Pinto que, no ano de 1781 " por sua devoção se lembrou de fundar a dita capela", obtendo para isso, naquele mesmo ano, a autorização do senhor Bispo de São Paulo, Frei Manoel da Ressurreição. Por volta de 1805, a capela estava quase concluída, já podendo ser celebrados alguns ofícios divinos.

A questão que se coloca agora é a seguinte: quando terá a Irmandade de S. Benedito se estabelecido nesta Capela, de onde veio e por que razão teria feito a transferência para ela?

Sabemos, de fonte oral, que a Irmandade por não possuir capela própria no século passado, estava abrigada na Igreja da Ordem 3ª do Carmo de Mogi, ficando o nicho com a imagem do santo, em um dos seus corredores laterais, onde os irmãos, muitos dos quais o eram também da Ordem 3ª vinham para cultuar o querido santinho .

  Aborrecidos com um desentendimento havido com o padre carmelita, diretor espiritual da Ordem, um irmão, membro da tradicional família Arouche, dirigiu-se à Cúria Diocesana, que então ficava em São Paulo, para pedir permissão para mudarem-se, com a sua Imagem, para o santuário do Senhor Bom Jesus. Ali, além da beleza do templo, teriam a paz almejada. Conforme se lê no Livro do Tombo , de 1870 a 1926, registro 46, a autorização foi dada no dia 6 de março de 1879 e, desde então, anualmente as grandiosas festas aí passaram a ser realizadas. A Irmandade de tal forma se identificou com a nova casa, que a capela do Senhor Bom Jesus de Matozinhos, com o correr do tempo, passou a ser conhecida, popularmente, como Igreja de São Benedito.

Reza uma lenda, no entanto, que os fatos se passaram de forma um pouco diferente:

Desgostosos com o tal desentendimento havido com o padre carmelita, os irmãos organizaram uma procissão, por ocasião da festa daquele ano, com um trajeto que deveria passar defronte da Capela do Senhor Bom Jesus. Um dos irmãos, devidamente instruído para o propósito, no momento azado abriu a porta daquele templo, de sorte que, quando o cortejo passava bem em frente, entraram com o andor Igreja a dentro e trancaram ali a imagem de São Benedito, de onde ele nunca mais saiu.

  Anualmente, em Março ou Abril, continua a realizar-se a festa de São Benedito. Deve pois ter-se perdido a memória da celebração anual ao Bom Jesus de Matozinhos. No entanto é de salientar que a Igreja e a Praça conservam o nome antigo

Lamentavelmente não consegui obter fotografias do interior da Igreja. Contudo a Prefeitura enviou-me um texto com uma descrição tão pormenorizada que permite obter uma imagem aproximada do edifício:         

A própria estrutura da Igreja de São Benedito (Bom Jesus) constitui imensa riqueza histórico-cultural. Suas paredes são todas de taipa da espessura de 70 cm . Somente as construções mais recentes, como a casa do Reitor, que fica na parte de trás da Igreja, é de tijolo (alvenaria).

Todo o piso é de cerâmica portuguesa: na nave da Igreja, no corredor da sacristia, na sacristia, no corredor da capela do Santíssimo e nesta própria. No pequeno corredor que liga a sacristia ao altar-mor, o piso é de placas largas de paralelepípedo, assim como a calçada externa que circunda a Igreja

Todas as portas são altas e de madeira esculpida, curvas em cima. Todos os pilares laterais são curvos e pintados em seu interior

O teto do altar-mor é de madeira curva com um afresco de N. S. da Aparecida. O teto da nave da Igreja é também de madeira curva com um afresco de São Benedito

Alguns afrescos das paredes do altar-mor e da Capela do Santíssimo têm como autor o próprio reitor do santuário, Monge beniditino, italiano de 54 anos, D. Estevan Pier Antoni, também ilustre escultor e músico. Inclusive a peça central que segura as cordas no altar-mor e a mesa do presbicito foram por este Reitor reformadas, esculpidas ou pintadas

Ainda falando sobre o Altar-mor, sua decoração é toda esculpida e banhada a ouro. O Cristo crucificado no alto do altar, que pode ser alcançado por uma escada de pedra por de trás do altar e da Sacristia, é esculpido em madeira ao estilo da escola do Aleijadinho

Em frente ao Altar-Mor, sem suas laterais, estão a Imagem de São Benedito (à direita) e de São José (francesa, à esquerda)

No corredor da capela   do Santíssimo, que é toda de mármore, está o Altar de   N. S. da Aparecida, de gesso com a imagem esculpida em madeira

Na sacristia temos uma imagem antiquíssima, esculpida em madeira (...).  

 

                                               Até Outubro. Um abraço português                                   

                                                                       Isabel Lago

www.atalho.com.br/ponto/mogi.htm.

TÁVORA, Maria José e COBRA, Rubem Queiroz, ob.cit., p. 209

Esta informação foi-me enviada pelo Prefeito de Mogi das Cruzes. Tentei entrar em contacto com o referido   historiador, através do endereço que a Prefeitura me enviou, mas nunca me respondeu

Embora tenha nascido em Palermo, S. Benedito, sendo de da raça abissínia, era negro. Tornou-se assim protector dos negros. No Brasil, desde muito cedo, começaram a surgir as irmandades de São Benedito, congregando escravos negros, pardos e mulatos



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