OS TRÊS CAMINHOS

            A hipótese que defendo é a de que haviam dois caminhos para o sertão de Minas Gerais, partindo de Cruzília. O primeiro dos dois caminhos e mais antigo foi o percorrido por Fernão Dias Paes, a partir de 21 de julho de 1674, o qual partiu de São Paulo até se dar em Cruzília, tomando em seguida a direção de Ibituruna, Itapecerica e Pitangui, estas no centro leste de Minas Gerais, para chegar a Paraopeba no centro norte, ou seja, lados opostos do tripui descoberto posteriormente. Não é atoa que denominaram a BR-381 que parte de São Paulo com destino a Belo Horizonte, capital do estado de Minas, de rodovia Fernão Dias. A rodovia Fernão Dias fica praticamente paralela às várias cidades citadas pelos bandeirantes, tais como Lambari, Cruzília, Ibituruna e Itapecerica. O historiador e cartógrafo Eduardo Canabrava Barreiros (1908) também defende a idéia de que o caminho trilhado por Fernão Dias seguia de Ibituruna para o nordeste e não passava pelo Porto Real. Basta pensar que de Ibituruna ao Porto Real são cerca de 75 km de distância, sem contar a volta que dariam do Porto Real a Paraopeba.

            O renomado historiador Tarquínio J. B. de Oliveira descreve no pé da página 312 da Corografia Histórica de Raimundo José o seguinte:

Matias Cardoso de Almeida, ajudante de Fernão Dias, foi provido capitão mor da primeira leva, que partiu na seca de 1673, indo plantar roças naquele sertão (Sumidouro). Seria a base do Sumidouro do Rio das Velhas, com três escalas anteriores: Ibituruna, Paraopeba e Roça Grande”.

                Nessa citação parece que Fernão Dias mandou seu companheiro, amigo e ajudante Matias Cardoso seguir na frente, desbravando sertões e plantando roças para alimentar um batalhão de desbravadores que viriam depois.

                                Maria Luiza de Castro Siqueira in Levantamento Histórico e Toponímico do Município de Itapecerica descreve que.. “Em 1676 Lourenço Castanho Taques, filho de Pedro Taques e de Dª. Ana de Proença, atendendo a um pedido da Coroa que veladamente era uma ordem, formou uma bandeira às expensas de seus cabedais para conquistar o território dos Catu-auá, tornando assim livre o caminho para a ocupação de Minas. Desempenhou seu trabalho expulsando os índios para além das fronteiras dos países do Tamanduá (Itapecerica) e do Pinhuí”. Com isso prova-se mais uma vez que o caminho Ibituruna, Itapecerica, Pitangui e Paraopeba existiu antes do Porto Real da Passagem.

                                Ora, sabendo-se que o Sumidouro tinha por base        Paraopeba no centro norte de Minas e sumia (sumidouro) para o norte até Montes Claros, é inadimissível que as bandeiras de Fernão Dias tivessem passado antes pelo Tripuí (centro-leste), região riquíssima em ouro e que só foi descoberta a partir de 1691/92, ou seja, muitos anos depois.

                                Sendo assim, o segundo caminho que raciocinamos ter sua existência após 1695, também partia de Cruzília, mas com destino a Minduri, Carrancas, Porto Real da Passagem em São João del Rei (Matosinhos), Itaverava e Tripuí, este último, local de partida dos exploradores da região do Distrito de Ouro Preto.

                Sabendo-se que em Itaverava foi a primeira localidade onde encontraram ouro em quantidade no sertão de Minas Gerais, podemos imaginar que primeiramente os descobridores sairam de Taubaté atravessaram a serra da Mantiqueira, chegaram na atual cidade de Cruzília, e daí para Ibituruna. De Ibituruna atravessavam o Rio das Mortes e embrenharam-se no sertão com destino a Paraopeba.

                Portanto, a fundação do Porto Real somente ocorreu, em linhas gerais, com a volta dos desbravadores de Paraopeba, passando pelas ricas reservas auríferas do Tripui com destino a São Paulo e Taubaté.

                Assim, podemos concluir que, o primeiro caminho (1674) foi o percorrido por Fenão Dias, ou seja: Taubaté – Cruzília – Ibituruna – Itapecerica – Paraopeba. O segundo (1691/92): Paraopeba – Sabará (Sabarabussu) – Bonfim – Itaverava (Tripui) – Carijós (Conselheiro Lafaiete) – Lagoa Dourada – São João del Rei – Carrancas – Cruzília – Taubaté. Finalmente o terceiro: Rio de Janeiro – Matias Barbosa – Juiz de Fora – Barbacena – Conselheiro Lafaiete – Tripui.

                Todos os três caminhos chegavam ao tripui, base para explorar a maior reserva de ouro existente no Brasil setecentista, que era a Comarca de Vila Rica (Ouro Preto).

                E para reforçar a criação do terceiro caminho, aqui vai mais uma citação do maior e mais convincente narrador dos primórdios de Minas Gerais, Bento Fernandes, in “Notícias dos primeiros descobridores das primeiras minas de ouro pertencentes a estas Minas Gerais – Pessoas mais assinaladas nestas empresas e dos mais memoráveis casos acontecidos desde seus princípios”,  impressos em Relatos Setanistas, de Afonso de Taunay:

“E passados mais anos, descobriu a Aiuruoca, pelo sertão, que então era a parte do sul da estrada, que vai para São Paulo, três dias de jornada afastado para aquela parte de São João del Rei, em as cabeceiras do Rio Grande”. (Relatos Sertanistas, pagina 46).

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- BAIRRO DE MATOSINHOS, BERÇO DA CIDADE DE SÃO JOÃO DEL REI

            Com a chegada da tropa de Tomé Portes del Rei em Matosinhos, ou mais especificamente no Porto Real da Passagem, em 1701, foi se desenvolvendo um povoado que sobrevivia em decorrência dos excelentes recursos locais, e alguns de seus habitantes comercializavam criações, gêneros alimentícios e ouro, em troca de sal, azeite, velas, roupas etc. Este tipo de comércio pode ser atestado pelas cópias de cartas que encontramos no Arquivo Público Mineiro, datadas de 27 de junho e 28 de agosto de 1720, encaminhadas a Lisboa aos atacadistas Sr. Francisco Pinheiro e Luís Alves Pretto, pelo comerciante do Rio das Mortes João Deniz de Azevedo.      

            O primeiro comerciante de Matosinhos de que temos notícia foi próprio Tomé Portes del Rei, que ainda tinha o direito de explorar a cobrança da passagem daquele Porto, que no princípio era feita por barco e após 1730 por ponte de madeira. A Tomé Portes também foi conferido o título de Guarda-Mor, título este dado somente a homens de confiança do governo português. Com sua morte, seu genro Antônio Garcia da Cunha, apoderou-se do direito da cobrança da passagem e a ele também foi passado o título de Guarda-Mor. Ao genro de Tomé Portes sucederam-se vários outros contratadores. 

            Sabendo nós que o núcleo da atual cidade de São João del Rei, somente foi iniciado no ano de 1704, com a descoberta de ouro nas imediações do Senhor dos Montes e da igreja das Mercês, somos obrigados a acreditar que o atual Bairro de Matosinhos é o berço da cidade de São João del Rei, porque este local já era povoado antes de 1704 e sem dúvida nenhuma, grande parte desse povoado formou o novo núcleo do Arraial Novo do Rio das Mortes, que depois sucessivamente passou a chamar-se Arraial de Nossa Senhora do Pilar e posteriormente São João del Rei.

            O formador do primeiro núcleo de São João del Rei, foi exatamente o bandeirante Tomé Portes, sendo que temos de concordar que cabe a ele o título de fundador da cidade de São João del Rei e Tiradentes, já que o fundador de um povoado é aquele que chega primeiro e se estabelece, mesmo não tendo a intenção de assim fazê-lo. Diríamos que se chegasse alguém nas imediações de São João e Tiradentes por volta do ano de 1701 e pedisse para falar com o comandante, só poderia falar com o Sargento-Mor Tomé Portes del Rei, líder de uma região, cujos primeiros ocupantes eram seus parentes e amigos. 

            O grande historiador são-joanense Augusto Viegas informa em seu livro “Notícias de São João del Rei”, 3ª edição, à página 15, que Milliet de Saint Adolphe e Monsenhor Pizarro afirmaram que os paulistas começaram a eregir a primeira igreja da região, em 1703, que só poderia ser na Vargem do Porto Real da Passagem, local onde se estabeleceram os paulistas, antes do português Manoel João de Barcelos encontrar ouro em 1704, a qual não foi terminada dada a debandada dos habitantes para a extração de ouro nas imediações da igreja das Mercês e no ribeirão São Francisco Xavier, atrás do bairro Senhor dos Montes. Muito provavelmente essa mesma igreja inacabada foi escolhida para construção dos quartéis dos soldados do Rei, conforme mandado do Governador da Capitania de Minas, Conde de Assumar, em 06/09/1719. 

            Com esta notícia datada de 1703, temos ainda mais indícios de que Matosinhos possuía um número razoável de habitantes naquela época, a ponto de construir uma igreja, cujo tamanho dava até para acomodar, por menor que fossem, tropas do Rei e demais equipamentos necessários a uma tropa de milícias.

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- O PORTO REAL DA PASSAGEM

            O grande historiador são-joanense, Sebastião de Oliveira Cintra, escreveu em suas "Efemérides de São João del Rei" (1982), que a 11/07/1730, o senado da Câmara solicitou a D. João a construção de uma ponte que separa São José de São João del Rei, a qual foi construída por Marçal Cazado Rotier, português que posteriormente seria proprietário de toda Várzea do Marçal. A Várzea do Marçal foi por duas vezes cogitada para ser capital.  Da primeira vez, para ser capital do nosso país, projeto dos Inconfidentes, caso ficássemos independentes de Portugal. Da segunda vez, para ser capital de Minas Gerais, quando resolveram tirar a capital mineira de Ouro Preto. A região aprovada pelos engenheiros da Novacap, inclusive pelo seu coordenador Dr. Aarão Reis, que achou a Várzea do Marçal ideal por ser plana e banhada pelo Rio das Mortes. A idéia não foi à frente, porque na última hora um Deputado de Barbacena (MG) levou a Assembléia decisiva para lá e, por apenas um voto, São João del Rei perdeu para o Arraial de Curral Del Rei, atual cidade de Belo Horizonte.

            Marçal Cazado Rotier cobrava pedágio de pessoas que passavam pela ponte, sendo que a cavalo, por causa da carga, pagava-se o dobro.

            A 15/07/1736 a Câmara convocou seus usuários para resgatarem a ponte a troco de doações em ouro, no intuito de evitar o pagamento do pedágio na ponte, o que parece não ter acontecido, pois aos 17/10/1744, o Senado da Câmara escreveu ao Governador pedindo declarar livre o Porto Real da Passagem, isentando seus usuários do pagamento do pedágio, que também não deve ter sido realizado, pois temos registro que em 1786 Manoel Cardoso Pais exerceu a administração das passagens do Porto Real, da qual era contratador o Dr. Manoel de Sá Fortes de Bustamante e no triênio de 1799 a 1801, o são-joanense Dr. Gomes da Silva Pereira. O historiador Dario Cardoso Vale registrou em seu livro "Memória Histórica de Prados" (1985), que já em 1715, o Senado da Câmara de S. João del Rei pediu liberdade do Porto nos seguintes termos

"Nesta Villa se acha um Rio que vulgarmente chamam das Mortes, e por ser invadiável, há nele barca de passagem, e por ordem dos Governadores destas Minas se pos a tal passagem em praça, e os rendeiros dela obrigam aos moradores desta Villa e seu termo a pagar a passagem que fazem para suas Fazendas e comunicação de uns Arraiais circunvizinhos, Villas e mais partes donde há as tais passagens, os moradores delas suplicam isenções, nos parece dar contas a S.M.(Sua Majestade), e prostrados a seus reais pés, pedir-lhe que ira fazer-nos a graça de que os moradores desta Villa e seu Termo sejam escusos de pagarem as tais passagens, e que só o façam os viandantes. V. Majestade mandará o que for servido. - Deus guarde a real pessoa de S. Majestade. - São João del Rei, maio de 1715, e eu Joseph da Silveira Miranda, Escrivão da Câmara que o escrevi. (Da folha 2, do livro da Câmara de São João del Rei)”.

            A verdade é que os transeuntes não conseguiram isenção do pagamento com exceção dos militares pagos e militares da tropa auxiliar (1), conforme livro códice número 9, Seção Colonial, do Arquivo Público Mineiro.

            Os contratos de passagem do Porto Real realizados pela Câmara Municipal (2), tiveram início a 10 de maio de 1708, em que foi arrematante Pascoal de Macedo. Em 27/03/1711, por 400 oitavas de ouro, Pascoal de Macedo torna a arrematar a passagem do Porto Real, por permissão do Procurador da Fazenda Real Damião de Oliveira e Souza, sendo escrivão Manoel Dias de Britto. 

            A Ponte do Porto tem um passado bastante histórico e alguns pontos curiosos. Neste local, antes de 1730, o único meio de atravessar o rio era a barco e pagava-se por este meio de transporte. Em 1735, o português Marçal Cazado Rotier, que posteriormente foi dono de toda Colônia do Marçal, construiu com seus próprios recursos, uma ponte de madeira, e começou a cobrar pedágio de quem passasse por ela, sendo que a cavalo, por causa da carga, pagava-se o dobro.  Por esta ponte passava-se obrigatoriamente todos os transeuntes que iam ou vinham de São Paulo e Paraty (litoral do Rio de Janeiro, próximo a Cidade de Taubaté em São Paulo) com destino às Minas Gerais, mais especificamente Ouro Preto, na época Vila Rica; Mariana, na época Vila do Ribeirão do Carmo; Sabará; Caeté, antiga Vila Nova da Rainha; Serro, antiga Vila do Príncipe; e muitos outros povoados que já existiam naquela época, inclusive outros sertões de Minas e sul da Bahia. Alguns transeuntes também optavam por passar pela Ponte do Porto, dada a riqueza do comércio local, onde as variedades eram muitas, tais como; sal, carne seca, couro, animais e outros alimentos. Até hoje podemos conhecer uma construção reformada ao lado da ponte, que, segundo seus proprietários, funcionou como depósito de sal, mercadoria na época importada e que chegava via Rio das Mortes.

            Inúmeras personalidades famosas e importantes já se utilizaram da Ponte do Porto. Duque de Caxias quando veio a São João del Rei pela primeira vez, foi festivamente recebido a partir desta ponte.                             Após Marçal Rotier vários outros contratadores administraram a ponte, sempre cobrando pedágio.  É a seguinte a relação de administradores do Porto Real da Passagem :

- 1700 a 1702 - Tomé Portes Del Rei;

- 1702 a 1708 - Antônio Garcia da Cunha (genro de Tomé);

- 1708 a 1730 - Pascoal de Macedo;

- 1730 a 1786 - Marçal Cazado Rotier, Custódio José Ferreira, Manoel Antunes Nogueira, Dr. Manoel de Sá Fortes de  Bustamante;

- 1786 a 1799 - Manoel Cardoso Pais;

- 1799 a 1801 - Dr.Gomes da Silva Pereira.

            A partir de 1801 parece que a administração regional passou a cuidar da ponte, porque não aparecem mais contratadores. Naquela época, o governo não tinha recursos para realizar grandes obras, então, passava-se o direito de exploração para determinadas pessoas, as quais construiam e recuperavam o investimento com aluguéis ou pedágios, como era o caso da Ponte do Porto.

            A respeito dessa famosa ponte, o Jornal "O Correio", de São João del Rei, edição de 19/11/1953, publicou notícia em manchete, com o título "Lamentáveis Desastres", no qual informa que segunda-feira, dia 16 do corrente, registrou-se um lutuoso acontecimento em que perderam a vida duas pessoas. Em direção à cidade de Coroas (hoje Coronel Xavier Chaves), um caminhão dirigido por Geraldo Tito, levando como passageiros um ajudante e mais duas pessoas, ao atravessar a ponte do Rio das Mortes no lugar denominado Porto Real, o veículo perdendo a direção, precipitou-se no rio. O motorista e seu ajudante conseguiram salvar-se milagrosamente, o mesmo não acontecendo aos outros dois passageiros, pai e filha, Sr. João Torres e Izaura de Oliveira, que pereceram afogados. A família do Sr. João Torres morava na antiga Rua Josué de Queiroz, em Matosinhos.

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 (1 ) Pessoas influentes como grandes fazendeiros e comerciantes, que ganhavam  do governo o titulo de Coronel e gozavam de certos poderes, sem serem remunerados.

(2) Naquela época, as Câmaras Municipais obedeciam à estrutura das de Portugal, assim constituídas:

a) 2 Juízes Ordinários, também chamados de Ouvidor ou Juiz de Fora.

b) 1 Presidente do Legislativo ou Prefeito Municipal.

c) 3 ou 4 Vereadores.

d) 1 Escrivão ou Secretário.

e) 2 almotaces ou funcionários oficiais da Câmara.

 Eram eleitos pelo sistema de votação indireta, dentre os chamados homens bons.O ouvidor ou Juiz de Fora mais velho ia pedindo votos, e os seis mais votados, que eram separados em grupo de dois, e cada grupo escolhia dois juízes, três vereadores, um procurador e um escrivão.  Os votos eram recolhidos e contados pelo Juiz mais velho.

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A GUERRA DOS EMBOABAS NO BAIRRO DE MATOSINHOS E A ESPADA CENTENÁRIA ENCONTRADA NO RIO DAS MORTES – UMA HIPÓTESE POSSÍVEL

            Acreditou-se por muito tempo que o famoso “Capão da Traição”, onde se desenrolou o principal episódio desta contenda (1708-1709), situava-se em Matosinhos, chegando a se erigir um marco no bairro, comemorativo e alusivo ao fato (Antônio Gaio Sobrinho, Sanjoanidades, p.13). Sabe-se hoje que situava-se na verdade na outra margem do rio, a légua e meia de distância rumo norte, próximo ao povoado do Pombal. (GUIMARÃES, Geraldo. O Capão da Traição. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, v.4, 1986, p.78-86.).

            O ouro, de fato, também foi explorado em Matosinhos. Houve um dique para trabalhos de sua mineração no Ribeirão da Água Limpa, no local denominado Ouro Preto, neste bairro, na antiga “Fazenda Velha”. O negociante inglês John Luccock, que por aqui passou em 1818 cita esta mineração. (Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1975.). Outro inglês, o pastor anglicano e desenhista  Robert Walsh, em 1828, escreveu: “Passamos pelo arraial de Matosinhos... o lugar tinha tido outrora uma mina de ouro bastante extensa. Para interceptar as partículas de ouro trazidas por um riacho da montanha, havia sido construído um dique através de uma ravina; o seu construtor, porém, não calculara a pressão da água e, após um prolongado período de chuvas, o dispendioso dique se rompeu, fazendo desaparecer com ele, numa única noite, todas as riquezas acumuladas à sua margem.” (Notícias do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1985.). Mais tarde, em 1868, um terceiro inglês, explorador e diplomata, Richard  Francis Burton confirma: “Mais acima está uma ponte quebrada, que data do tempo em que Matozinhos tinha uma mina de ouro florescente. A explosão de um poço (...) acabou com a mineração.” (p.195). Sobre a estória contada pelo povo referente a um caso ocorrido na Fazenda, anteriormente citada, a qual sediava a mina, ver: Passarelli, Ulisses. Dois Causos de Matosinhos, narrados no capítulo?????, In: O Grande Matosinhos. São João del-Rei: ASMAT, nov. / 2000. Ano 2, n.13, p.2), denominados: Lugar Onde o Cachorro Falou e o Cala Boca.

            A exemplo do que ocorreu em "Serra Pelada” (estado do Pará), com a descoberta de ouro, na década de 1980, e que atraiu milhares de garimpeiros para lá, também aqui em Minas Gerais ocorreu idêntico fato no princípio do século XVIII. Os forasteiros denominados "Emboabas", (pessoas que chegaram na região das minas após a ocupação pelos Paulistas), com a notícia que se alastrou por todo o país da grande facilidade de se apanhar ouro por aqui, começaram a chegar a partir do ano de 1705, ocupando vários povoados auríferos, entre eles; Ouro Preto, Caeté, Sabará e São João del Rei. Aconteceu que os paulistas que foram os primeiros a desbravarem os sertões de Minas Gerais tinham como líquido e certo a posse das minas auríferas; só que, naquela época, o uso da força física por parte de alguns aventureiros e a falta de legislação a respeito, não davam nenhum direito aos paulistas. Com a chegada dos Emboabas, vários conflitos começaram a ocorrer. Há registros de que a 27/06/1707, um paulista assassinou um português emboaba, em Caeté (MG), diante de um outro português. Em outras cidades também houve conflitos.

São João del Rei, como possuidora de diversas minas auríferas, não ficou fora desses conflitos, denominados de “Guerra dos Emboabas”.

            Um episódio denominado Capão da Traição ficou marcado na Guerra dos Emboabas, onde estes chacinaram a tropa paulista, depois dos comandantes terem combinado uma trégua. Eduardo Canabrava Barreiros, autor de "Episódios da Guerra dos Emboabas e sua Geografia, Editora Itatiaia, 1982", ilustra em seu livro, que o local do Capão da Traição foi a cinco léguas do Arraial Novo do Rio das Mortes (São João del Rei), conforme sua interpretação dos escritos de Rocha Pita (1730) e do Padre Manoel da Fonseca (1752). Alguns historiadores defendem outros locais, tais como o Bairro de Matosinhos e Várzea do Marçal, esses dois últimos próximos ao Porto Real da Passagem. 

            O Emboaba José Alvares de Oliveira, participante ativo do movimento emboaba na região, inclusive, atuando nas lutas entre Emboabas e Paulistas naquela época, resumidamente escreveu o seguinte, conforme “História do distrito do Rio das Morte, sua descrição, descobrimento de suas minas, casos acontecidos entre Paulistas e Emboabas e criação de suas Vilas”:

... Acordaram logo [os emboabas] por em marcha um destacamento de 200 homens e chegaram a este Arraial [do Rio das Mortes] em dezembro de 1708, sob o comando de Bento do Amaral Coutinho.

Os Paulistas se dividiram em mangas [pelotões] e certo de que uma delas se meteu da outra parte do Rio das Mortes, coisa de légua e meia ao rumo do norte, comandados pelo Cabo Gabriel de Góes, Bento do Amaral Coutinho passou o rio com sua gente e alguma do Arraial.  E chegando a vista por sítio ao dito capão e os paulistas como de nada temiam pegaram nas armas, deram tiros e feriram alguns Emboabas. Assim sendo, os Emboabas ajuntaram o cerco e os Paulistas puseram as armas em terra e pediram quartel, sendo levados a presença do Comandante, onde foram mortos a sangue frio.  Após este episódio, Bento do Amaral se pos em marcha de volta dessas minas para as gerais...(Relatos Setanistas, página 94)

            Quando José Alvares de Oliveira cita o local da batalha como sendo légua e meia em direção norte, tudo aponta para a região da Fazenda do Pombal, já que a distância entre São João del Rei e a Fazenda do Pombal, em linha reta, é aproximadamente esta. E para reforçar ainda mais esta ideia, citaremos o seguinte fato:

                Em 1986, o pescador Jair Lombelo (falecido), residente no Bairro de Matosinhos, ao lançar seus anzóis à caça de peixes no Rio das Mortes, próximo ao quilometro 108 da Estrada de Ferro local, região da Fazenda do Pombal, recolheu uma espada, cujo cabo é ricamente trabalhado em cordões de pura prata, que ainda estão intactos, porém nele existem, colados, grânulos de areia petrificados pelo tempo. A alça junto ao cabo é de ferro fundido que, com o decorrer dos anos, foi afinando, afinando, até se partir ao meio.  A lâmina que se encontra sem a sua extremidade está, a exemplo da alça, totalmente enferrujada. Esta espada foi negociada, logo após ser pescada, por aproximadamente um salário mínimo daquela época, (U$70,00), segundo me disse o próprio pescador. Foi vendida para o Sr. José Trindade Soares, que na época morava no bairro de Matosinhos. Pedi ao José Trindade Soares, meu amigo desde infância, que me emprestasse a espada para encaminhá-la para uma análise mais pormenorizada e o mesmo não teve dúvidas em me cedê-la. Desta forma, eu encaminhei a mencionada espada ao dedicado e competente Professor João Bosco de Castro Teixeira, ex-Diretor Executivo da FUNREI, hoje Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ), que, contando com a colaboração de pessoas do Instituto Histórico e Geográfico de São João del Rei, tais como; Geraldo Guimarães, Sebastião Cintra, Professor Antônio Gaio, Jairo Braga Machado, e outros mais, resolveram consultar o Major Linhares, Sub-Comandante do 11º BIMth, Batalhão Tiradentes, que sugeriu o encaminhamento da espada ao Sr. Otávio Sérgio Pereira Coelho, perito do Museu Histórico do Exército, que assim se manifestou: “Trata-se de um achado arqueológico de grande valor, conhecida como "Rapieira", originada em Portugal, Espanha ou Sul da Itália (nesta ordem de possibilidades), provavelmente de 1650 a 1730, usada tanto por um militar como por um civil”.

            Temos notícias de que outras peças, inclusive espadas inteiras, foram achadas também naquela região, principalmente por garimpeiros, não identificados.

            O que pretendemos frisar é a grande incidência de peças antigas achadas na região da Fazenda do Pombal e a coincidência com os escritos do português-emboaba José Alvares de Oliveira, citando o local do Capão da traição, como sendo a légua e meia do Arraial Novo, rumo norte, o que me leva a concluir que a batalha do Capão da Traição foi realmente na região da Fazenda do Pombal.

            Quanto ao local onde se estabeleceram Paulistas e Emboabas durante a Batalha do Capão da Traição, concordo com o experiente historiador são-joanense Geraldo Guimarães (falecido), que possui excelentes trabalhos sobre a Guerra dos Emboabas, quando afirma que Emboabas e Paulistas viviam em locais separados. Poderíamos raciocinar da seguinte forma: os Emboabas, que conseqüentemente chegaram depois dos Paulistas, mais precisamente depois da descoberta do ouro em 1704, construíram moradas nas proximidades da Igreja das Mercês (centro da cidade de São João del Rei). Os Paulistas, como já tinham formado um núcleo habitacional no Porto Real, desde a chegada de Tomé Portes com seus parentes e amigos, voltaram a Matosinhos e se fortificaram. A respeito, José Alvares de Oliveira escreveu:

“...Cuidaram logo os Emboabas de formarem Arraial e fazerem Ranchos e ao mesmo tempo eregiram sua Capela [primeira Igreja de Nossa Senhora do Pilar]...E os Paulistas se arrancharam por fora, buscando a vizinhança dos matos e levantaram suas moradas com espaçosas varandas.” (Relatos Sertanistas, página 101).

            Só poderia ser fora da região aurífera das Mercês), ou seja, em Matosinhos.

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- O BAIRRO DE MATOSINHOS NA INCONFIDÊNCIA MINEIRA

            Matosinhos também teve participação na Inconfidência Mineira, tanto é que o Desembargador José Pedro Machado Coelho Torres e o Ouvidor Marcelino Pereira Cleto ali estiveram a mando do Vice-Rei Luís de Vasconcelos e Souza (1), inquirindo um dia inteiro pessoas suspeitas com o levante.

            Num dos casos, um pardo de nome Manoel da Costa Capanema, sapateiro, foi preso por insultar o jovem português de 25 anos, de nome Manuel Moreira, que morava com uma parda aforriada de 40 anos de idade e de nome Josefa Teixeira. O sapateiro, na ânsia de tomar cachaça na taverna do jovem Manuel Moreira, instalada por ocasião da festa do Divino Espirito Santo, na Igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, não obteve sucesso, já que a mesma encontrava-se fechada. Aos brados e murros, o sapateiro, que já se encontrava alcoolizado, começou a insultar o dono da taverna dizendo: "estes branquinhos do Reino que nos querem tomar nossas terras, cedo os haveremos de botar fora dela".  O sapateiro foi denunciado pelos que presenciaram o fato, entre eles o escrivão Antônio da Costa Braga e o Capitão Bernardo José Gomes da Silva Flores. Sendo inquirido pelo Desembargador e Ouvidor, foi preso em 22/09/1790.  Em 22/01/1791, foi conduzido para o Rio de Janeiro, juntamente com José Martins Borges e o Alfaiate Vitoriano Veloso, morador no Bichinho, próximo à Cidade de Tiradentes.  Finalmente, foi absolvido, depois de mais de dois anos de prisão.

            Também o promotor e o Desembargador queriam saber do Senhor Joaquim Pedro de Souza Câmara, moço fidalgo da casa de sua majestade e Sargento Mor da Cavalaria de Auxiliares da Comarca do Rio das Mortes, nascido em 1729 na Vila Viçosa, em Portugal e morador em Matosinhos, onde faleceu solteiro em 08/04/1798, deixando uma filha de nome Inácia Xavier Caetana de Aragão, se era verdade que o mesmo disse para o Coronel Francisco Antônio de Oliveira Lopes (2), inconfidente morador na Fazenda da Ponta do Morro, próximo à cidade de Prados e pai adotivo do famosíssimo Barão da Ponta do Morro (3), se era verdade que ele tinha recebido uma carta de sua prima, freira Joana de Menezes e Valadares, moradora em Portugal, alertando-lhe sobre um levante que haveria de acontecer nestas Minas Gerais (4).  Os termos que suscitaram dúvidas na referida carta de 18/06/1787, ou seja: praticamente há dois anos antes da prisão de Tiradentes, que foi em 10/05/1789, data marcante do início da repressão portuguesa aos inconfidentes, são os seguintes:

“...e se Vossa Senhoria continuar no seu silêncio, porei termo à minha escrita, mas não aos desejos de que Vossa Senhoria mude de resolução a respeito da esquecida pátria”.

                “...Vossa Senhoria ainda que aí está bem, aqui está melhor; e suponhamos que se introduz o espírito de vertigem nos ânimos desses naturais, e que tumultuam; neste caso parece mais arriscado é o partido da honra, que Vossa Senhoria infalivelmente havia de seguir, e o melhor é evitar estes apertos e vir sem eles à presença da adorada soberana [Dª Maria I] e livrar-se de um governo subalterno que às vezes degenera em despotismo.”

            O Senhor Joaquim Pedro de Souza desmentiu o Inconfidente, pai adotivo do Barão da Ponta do Morro, dizendo que a carta apenas o chamava de volta a Portugal, já que era muito mais seguro viver em seu país ao lado de sua Majestade a Rainha e toda sua dinastia (5), conforme manifestou sua prima.  A carta foi encaminhada ao Vice-Rei Visconde de Barbacena e nada aconteceu ao Senhor Joaquim Pedro de Souza Câmara.

            Acredito que nós mineiros aprendemos com as diversas prisões dos inconfidentes, e, hoje, somos tidos como homens calados. São aqueles velhos ditados: "mineiro trabalha em silêncio" e "gato escaldado tem medo de Água fria". Nosso próprio grande mártir e conterrâneo Joaquim José da Silva Xavier (6) foi severamente punido por propagar largamente o movimento e ser um dos poucos inconfidentes que não possuía grandes riquesas.

            O terceiro delator dos inconfidentes, Coronel Inácio Correia Pamplona, foi Imperador da Festa do Divino Espírito Santo de Matosinhos no ano de 1810, conforme mostra a cópia do recibo a seguir:

                RECIBO

Recebi do Sr. Reverendo Pe. Inácio Correia Pamplona, a quantia de cem mil reis que me deu por ordem do Sr. seu pai o Senhor Coronel Inácio Correia Pamplona, cuja quantia é a mesma, que o dito Sr. por meteu dar para a festa que fizemos do Espírito Santo em Mattosinhos em ano de 1810, quando o Sr. Coronel foi imperador e eu Juiz,  por verdade e faço o presente.

                São João, 13 de junho de 1810  -  José Francisco Lopes

São 100$000 reis  (museu regional de São João del Rei)

            O coronel Pamplona tinha chácara em Matosinhos e residência fixa em Lagoa Dourada (MG), de onde partiam suas diversas correspondências para a corte portuguesa no Brasil. De lá partiu a celebre carta ao Visconde de Barbacena, datada de 20/04/1789, mas que na realidade somente chegou nas mãos do Governador Visconde de Barbacena em 05/05/1789, passada pelo poderoso Carlos José da Silva, citado neste livro no capítulo “Personalidades Históricas do Bairro de Matosinhos”, do qual Pamplona era cumpadre. Eis a carta na integra:

Mendanha 20 de abril de 1789

Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Visconde

É fatal a minha consternação.  Tomara achar uma justa idéia que bem pudesse mostrar a Vossa Excelência o importante peso desta tão árdua, como interessante ação. Ela me faz conspirar para imediatamente representar a Vossa Excelência o caso tão horroroso para as atendíveis circunstâncias tão delicadas, em ofensa ao  sagrado  respeito, e se o  insulto se comprova, aonde está o juramento destes deliquentes, a fé de leal vassalo e a promessa de darem até a última gota de sangue?

                Esta tão relevante ofensa, Excelentíssimo Senhor, faz ódio até às nações mais bárbaras.

                Todos devemos pensar que Vossa Excelência é o braço em quem a nossa soberana descansa nesta Capitania, a quem compete exatissimamente o rigoroso exame da origem e da fonte donde tudo nasce.

                Eis aqui as provas: Que no dia 29 de março fui convidado pelo Reverendo Vigário Carlos Correia de Toledo, para ir a Semana Santa à dita Vila; e fui à procissão dos Passos, onde o dito Vigário me disse em conversa que se tratava de um levante, havendo leis, o General deposto, estando falado o Regimento, parte dele; no Rio, um Alferes fazendo séqüito; e o Ouvidor que acabou, Gonzaga metido nisto; e que todos os devedores que devessem à Fazenda Real seriam perdoados. E como era dia de sermão e de noite fomos visitar as igrejas, não deu tempo para mais; no outro dia de madrugada vim-me embora com a promessa de tornar, e para isso deixei logo o meu vestido.

                Sucedeu logo vir um homem por nome Manuel Pereira Chaves e comprar-me um pouco de gado e potros, que conduziu para o Rio; e chamando-me de parte, disse-me que sentia não poder vir a Vila Rica para dar parte ao Coronel Afonso Dias (7) do que lhe haviam contado nas Vilas de São João e São José: que havia levante nas Minas, e que se haviam conluiado todos os cabeças poderosos a este fim; que se achava um  a convocar séqüito; e como se dizia que o levante era dos poderosos, ele perguntara se eu estava metido nisso; que lhe responderam que eu não era metido nisso porque era amigo e compadre do Coronel Carlos José e que logo lho havia de passar; que o Senhor Vice-Rei já sabia tudo.

                Eu turbado deste e já do dito acima, não tardaram muitos instantes que logo  não chegasse a este sítio um padre pedindo suas esmolas e lhe perguntei: Irmão, tem tirado muito? Respondeu-me que tudo estava perdido e agora de novo pior, porque V. Excelência queria botar a derrama, sendo cada um negro a 8 oitavas: e que o povo dizia ia haver levante e viverem em suas liberdades. O dito deste logo me fez mossa, porque este gira a Capitania; e para maior desordem este sussurro.

                Proximamente chega a este sito o Capitão João Dias da Mota que passava a falar a André Esteves de seus particulares; e querendo deixar passar a força do sol, se apeou; e neste intervalo  lhe perguntei se havia notícia que tivesse chegado a nau de guerra; respondeu que não, só sim havia passado para o Rio um furriel com uma portaria do Ten.Cel. Francisco Antonio Rabelo para se lhe assistir com o necessário que ele tudo satisfaria; e que, de Vila Rica, passara um padre (8) que ia para a borda do Campo, que largamente falava no levante e que dormira no Rancho das Lavrinhas do Lourenço, que também este do Rancho assim o publicava.

                Vendo eu esta fatal desordem tomei a firme resolução de não ir ter a Semana Santa na Vila como havia prometido. Escrevi ao Vigário, que por conta das minhas enfermidades, me dispensasse; e perguntando eu ao mulato: que lhe disse o vigário? (porque me não respondera a minha carta), disse que a recebera e que se pusera a passear, e a bater com a carta na cabeça, e que dissera ao mulato: Se ti queres ir, em cima daquela mesa está o vestido; leva-o, que a doença de teu  senhor é de mentira.

                É o que posso dar parte a Vossa Excelência para por as providências que a sua sábia compreensão sabe, a benefício da nossa soberana e do bem público: e Deus guarde a Vossa Excelência. Mendanha, aos 20 de Abril de 1789.

Inácio Correia Pamplona

Mestre de Campo Regente

TERMO DE DECLARAÇÃO, RATIFICAÇÃO E JURAMENTO PRESTADO PELO MESTRE DE CAMPO INÁCIO CORREIA PAMPLONA NA INQUISIÇÃO DA INCONFIDÊNCIA MINEIRA

                Aos 30/05/1789, no Palácio desta Capital de Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar do Ouro Preto, residência do Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Visconde de Barbacena, Governador e Capitão General desta Capitania, onde foi vindo por ordem do mesmo Senhor o Doutor Desembargador Pedro José Araújo de Saldanha do Desembargo de sua Majestade Fidelíssima, que Deus guarde, Ouvidor Geral e Corregedor desta Comarca, comigo o Bacharel José Caetano César Manitti, Ouvidor Geral e Corregedor da do Sabará, Escrivão nomeado pelo dito Excelentíssimo Senhor pra esta diligência, ali compareceu o Mestre de Campo Inácio Correia Pamplona, perante quem foi por mim lida uma carta e representação que o mesmo tinha feito ao dito Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor, que também presente se achava, toda ela escrita em uma folha de papel e datada do dia 20 de Abril do corrente ano, em que lhe denunciava o plano de uma sedição levantamento que temerariamente pretendiam concitar nesta Capitania varias pessoas da primeira graduação e hierarquia dela, declarando-lhe seus nomes e individuando todos os fatos respectivos de que tivera notícia, cuja carta me fora entregue neste mesmo ato e para o referido fim, pelo dito Excelentíssimo Senhor; e depois de assim lida na presença do mencionado Mestre de Campo, o sobredito Ministro Doutor Desembargador lhe deferiu o juramento  dos Santos Evangelhos em um livro deles em que pôs sua mão direita sob cargo do qual lhe encarregou que em boa e sã consciência declarasse e jurasse ele, dito Mestre de Campo Inácio Correia Pamplona, se tinha com efeito escrito e assinado de seu próprio punho a mencionada carta e denúncia que por mim, Escrivão, lhe tinha sido lida e mostrada; e se  eram verdadeiros todos e cada um dos fatos nela indicados; e se além destes ainda tinha que delatar alguns outros que lhe houvessem esquecidos, ou de que posteriormente à sobredita delatação tivesse notícia; e finalmente se aprovava e de novo ratificava quanto naquela representação delatória havia expedido e circunstanciado; e aceito pelo mesmo Mestre de Campo Pamplona o dito juramento, debaixo dele declarou novamente, protestou e ratificou que a referida carta e denúncia, que eu Escrivão nomeado lhe acabava de ler e mostrado tinha, datada do dia vinte de abril do corrente ano, era identicamente a própria que ele, dito Pamplona, tinha dirigido ao Excelentíssimo Senhor Visconde de Barbacena, atual Governador e Capitão General desta Capitania, que presente se achava na maneira que dito fica; que a mesma era toda escrita e assinada pelo seu próprio punho; que tudo quanto nela relatava era pura verdade expressada da mesma sorte que o sabia e tinha vindo à sua notícia; cuja denúncia fizera unicamente por zelo do real serviço como bom vassalo de sua Majestade Fidelíssima, e pela fidelidade, que sabia, estava obrigado a guardar por todos os direitos à sua Soberana e Senhora natural; e que, além do que na referida delatação havia fiel e verdadeiramente recenseado, acresciam mais para referir e declarar os fatos seguintes: Que pernoitando o Vigário da Igreja de São José daquela Comarca do Rio das Mortes, Carlos Correia de Toledo, em casa dele dito Mestre de Campo, na noite do dia vinte do mencionado mês de abril (1), sucedendo ir logo pela manhã cedo visitar o dito Vigário ao seu quarto, o achara já fora deste passeando e por extremo aflito, sobressaltado e inquieto, por cujo motivo, perguntando-lhe a origem da conhecida perturbação em que o via, lhe respondeu este;  que pela meia noite  antecedente havia recebido a carta que lhe apresentava, a qual ele declarante Pamplona leu e viu ser de aviso, participando-se nela o dito Vigário que, na Cidade do Rio de Janeiro, se achavam presos o  Alferes de Cavalaria destas Minas Joaquim José da Silva, por alcunha – o Tiradentes – e o Coronel de Auxiliares Joaquim Silvério dos Reis; que em  tais circunstâncias se acautelassem; mas que em todo caso cumpria antes morrer com honra; e quem não era capaz para as empresas, se não devia meter nelas – e não obstante que ele Pamplona nem conheceu a letra da dita carta, nem esta vinha assinada; contudo se persuade que a mesma viera dirigida de casa do Coronel Francisco Antonio de Oliveira Lopes, e que era sem a menor hesitação cópia de outra original, do que tudo ele Mestre de Campo avisara logo no dia vinte e um do mesmo mês a Sua Excelência, como se realizava de outra carta sua também, que o dito Excelentíssimo Senhor neste ato apresentou e que ele Pamplona, reconheceu pela própria de que faz menção;  e que sendo tão grande a perturbação e indecisão em que flutuava o referido Vigário, pondo-se este a escrever para Carijós, para onde viera destinado a fazer jornada, depois de ter já escrito e fechado a carta, se recordou lhe faltava incluir nela uma procuração para um batismo a que ia assistir; e rompendo aquele sobrescrito, com inquietação e confusão em que estava, deixou, quando se retirou, ambos sobre a mesa em que escrevera; isto é, tanto o da carta do aviso já memorada e que também apresentou a Sua Excelência, o qual se achava escrito por letra visivelmente contra-feita, e diz: Ao  Senhor Vigário Reverendo Carlos Correia de Toledo, Guarde Deus, São José; como o outro igualmente exibido e que cobria a carta para Carijós e dizia: Ao Senhor João  da Silveira Fernandes, meu Amigo e Senhor, Guarde Deus muitos anos, na Estalagem dos Carijós, à mercê, que importa a brevidade da entrega.

                Também declara mais ele, dito Mestre de Campo, que vindo logo posteriormente para esta Vila Rica, transitando pelo Arraial do Ouro Branco lhe contara o Capelão do mesmo que, no sábado antecedente pelas quatro horas da tarde pouco mais ou menos, passara por ali um Alferes dos Pardos por nome Vitoriano (9), residente no Bichinho, muito bem montado e com pressa; e perguntando-lhe o dito Capelão para onde se dirigia com tanta celebridade, lhe respondera o dito Alferes que ia a cidade de Mariana com cartas, ou recomendações do Coronel Francisco Antonio de Oliveira Lopes para despachar ou procurar naquela cidade uns papeis para um casamento; e que voltando o mesmo Alferes no domingo logo de manhã cedo, ele dito Capelão se admirara de tanta brevidade, e perguntando-lhe se havia concluído o seu negócio, lhe tornara que o tinham encontrado os soldados no caminho, e lhe abriram e lhe tomaram os papeis; e que por este motivo voltava já a avisar o dito Coronel, a quem reputava àquela hora preso. Mais se lembra finalmente ele declarante, dito Pamplona, que quando aquele Vigário de São José lhe falara sobre o recontado levante e deposição do Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor General, como expressado tinha na sua carta, acrescentara que os outros não estavam por isto, antes haviam concordado e assentado que o mesmo Excelentíssimo Senhor deveria ser, nas críticas e propostas circunstâncias precisamente decapitado; o que tudo referido era fiel e verdadeiramente quanto de mais se lhe oferecia declarar e acrescentar ao já denunciado, debaixo do religioso vínculo do juramento que já tomado tinha; e de como assim o disse, protestou e ratificou, fiz este termo de declaração, ratificação e juramento que o mesmo dito Mestre de Campo Inácio Correia Pamplona assinou na presença do Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Visconde de Barbacena, Governador e Capitão General desta Capitania, que também este rubricou, com o dito Doutor Desembargador Pedro José Araújo de Saldanha, Ouvidor Geral e Corregedor desta Comarca; e eu o Bacharel José Caetano César Manitti, Ouvidor e Corregedor da do Sabará, Escrivão nomeado pelo dito Excelentíssimo Senhor para esta diligência, o escrevi e assinei, José Caetano César Manitti, Pedro José Araújo de Saldanha, Inácio Correia Pamplona, Mestre de Campo Regente.

            Prezados leitores, praticamente todos os portugues suspeitos de participarem do movimento da Inconfidência Mineira, como inconfidente, foram perdoados. Entre eles o Coronel Pamplona.

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(1) D. Maria I, desde a morte do seu pai, o Rei D. José I, em fevereiro de 1777 até o começo do ano de 1792, quando por motivo de moléstia mental, foi substituída nos despachos por seu filho D. João. Era o Vice-Rei Luís de Vasconcelos e Sousa (1779/1790), que tomou as primeiras providencias relativas a prisão e ao julgamento dos conjurados. Substituiu-lhe D. José Luís de Castro, Conde de Resende (1790/1801). Fez executar o Acórdão da Alçada que condenou à morte o Alferes Joaquim José da Silva Xavier e ao degredo vários dos Inconfidentes.

(2) Francisco Antônio de Oliveira Lopes, Coronel da Cavalaria Auxiliar de São João del Rei, nasceu em 1750 na Borda do Campo, região de Barbacena. Morou na monumental Fazenda da Ponta do Morro, de propriedade de sua esposa D. Hypólita Jacinta Teixeira de Mello.  Entrou para a Inconfidência Mineira a convite de Luiz Vaz de Toledo, irmão do Padre Toledo.

(3) Antônio Francisco Teixeira Coelho, Barão da Ponta do Morro, filho legítimo do Tenente português Antônio José Dias Coelho e Maria Inácia Policena da Silveira Buenos, irmã solteira da grande heroína Barbara Heliodora, nascido em 1786, portanto há três anos antes de eclodir a Conjuração Mineira e falecido em 07/03/1851. Foi criado pelo Inconfidente Francisco Antônio de Oliveira Lopes e sua esposa, D. Hypólita Teixeira, que o batizou na Matriz de Prados em 03/01/1787. Mesmo com os sequestros dos bens da Fazenda da Ponta do Morro, o Barão se transformou num dos homens mais ricos da região do Rio das Mortes, graças a cobertura e herança que seu pai lhe deixou, bem como D. Hypólita, que chegou a oferecer à rainha um cacho de banana todo de ouro, para livrar seu marido da prisão, o que não aconteceu.

(4) Realmente o nome "Inconfidência Mineira" foi muito bem escolhido, já que até a população de Portugal, muito antes do início do movimento, ficou sabendo do levante que haveria de acontecer aqui em Minas Gerais. Os participantes não souberam fazer confidências da trama. José de Lacerda e Almeida, paulista matriculado em Coimbra em 1772, denunciou a Melo e Castro, em setembro de 1786, que Antônio Pires da Silva Pontes, mineiro, disse que sua terra logo se tornaria um grande reino. Dessa forma dá para notar que, há dois anos e meio antes do movimento eclodir, os meios mais informados já sabiam das intenções daqueles que não souberam guardar confidências. Por essa razão, foram chamados de Inconfidentes. No meu entender, a diferenciação entre a denominação "Inconfidência Mineira" e "Conjuração Mineira" é que a primeira existiu numa fase anterior a descoberta do movimento e a segunda a partir da descoberta, onde os principais participantes foram denominados de conjurados.

(5) Em Portugal, a linha da Dinastia dos Alcântara Bragança é outra, de forma que D. Pedro I lá era D. Pedro IV. 

O maior ídolo dos portugueses de todos os tempos, sem dúvida, foi o Marquês de Pombal, homem de muita criatividade, que acordou Portugal para a indústria e a manufatura, incluindo suas Colônias. Não é à toa que lhe homenagearam com o maior e mais bonito monumento na principal Avenida de Lisboa.

 (6) Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, nasceu na Fazenda do Pombal (Ritápolis), na época pertencente a S. João del Rei, sem data precisa.  Era o mais velho entre dois irmãos, onde Domingos era padre, e possuía também duas irmãs de nome Maria Victoria e Eufrásia Maria. Depois de andar pelos sertões, como extrator de dentes e tomar conta do caminho da Mantiqueira (de Barroso à Barbacena), onde muitos assaltos com mortes ocorriam, entrou para a tropa de Cavalaria, no cargo de furriel (Subtenente). Muito corajoso, foi o porta-voz dos inconfidentes, já que também estava insatisfeito por não conseguir promoção. Dos onze inconfidentes condenados à forca, somente ele foi executado em 21/04/1792, antes de completar 46 anos.  Morreu solteiro e deixou uma filha de nome Joaquina, do romance que teve com Antônia Maria do Espirito Santo, em Vila Rica.  Possuía cultura razoável para aquela época, já que dispunha da Constituição Francesa e do Dicionário da língua francesa. Os dez perdoados do enforcamento a troco de degredo para as Colônias portuguesas da África foram: Cel. Freire de Andrade, Cel. Dr. Alvarenga Peixoto, Médico Dr. Domingos Vidal Barbosa, Cap. José de Resende Costa (pai), Dr. Resende Costa (filho), S. M. Luís Vaz de Toledo, Cel. Francisco A. de Oliveira Lopes, Dr. José Alvares Maciel, Amaral Gurgel e o Ten. Cel. Domingos de Abreu Vieira.

 Segundo o historiador inglês Maxwell, na época da Inconfidência até a primeira década de 1800, São João del Rei abastecia tanto o interior como os grandes centros com milho, feijão, trigo, queijo, banha, açúcar, algodão e cachaça. Já São José del Rei, hoje cidade de Tiradentes produzia muito algodão. Tudo isso após o ciclo do ouro.  A partir de 1800, São João começou a se desenvolver tanto, por causa do comércio, que foi responsável pelo crescimento da população da Comarca do Rio das Mortes, a qual pulou de 82.781 habitantes em 1776, para 213.617 em 1821, suplantando a população da capital Vila Rica.

(7) Coronel jAfonso Dias Pereira, tesoureiro Geral da Real Fazenda da capitania de Minas Gerais.

(8) Padre Manuel Rodrigues da Costa.

(9) Vitoriano Gonçalves Veloso, alfaiate, alferes de auxiliares, morador no Bichinho (hoje e antes distrito da cidade de Tiradentes), e comprade do inconfidente Francisco Antônio de Oliveira Lopes, proprietário da celebre Fazenda da Ponta do Morro.

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- BAIRRO DE MATOSINHOS: ORIGEM DO NOME, DELIMITAÇÕES E FORMAÇÃO DO POVOADO

            Matosinhos, bairro de São João del Rei, Minas Gerais, nome oriundo da denominação da Igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, cuja construção teve iniciou em 1771 e término em 1774. Foi lamentavelmente demolida em 1970, após deixarem o templo ir se acabando na década de 1960. Antes da construção da igreja, o local era conhecido como Vargem do Porto Real da Passagem ou Vargem da Água Limpa. O primeiro, por ser passagem de pessoas e viaturas controladas pelo reino ou pelos reinois (1) e o segundo por ser banhado pelo Ribeirão da Água Limpa (2).

            De topografia predominante plana, clima ameno, com terras cultiváveis e água em abundância, o local chamou a atenção daqueles que por ali passavam.

Emanuel Pohl, Burton e Rugendas se referem ao bairro de Matosinhos, dizendo o primeiro que:

No agradável Arraial de Matosinhos... os habitantes abastados de São João del Rei tem muitas e belas casas de campo com jardins, e Burton acrescentando ser o Arraial de Matosinhos, um lindo subúrbio.  Já Rugendas que pintou o Arraial de Matosinhos entre 1821 e 1825 (a imagem mais antiga que se conhece de Matosinhos), onde contavam cerca de 35???? chácaras, profetiza dizendo que sua bela situação e a vizinhança do Rio das Mortes, já navegável por algumas canoas, permitem prever para essa aldeia um futuro mais próspero que o das cidades vizinhas”.

            Nelson de Sena no seu Anuário Histórico Cronográfico de 1909 escreveu:

 "Bairro de Mattozinhos, constictuido num planalto entre a confluência do Ribeirão Água Limpa, com o Rio das Mortes, em forma de um triângulo, cuja base se assenta  sobre a fralda do outeiro do Lombão (3).  Sua área deve ser de aproximadamente dois milhões de metros quadrados. Mattozinhos oferece proporções maravilhosas para aumentar no triplo, com vantagens inquestionáveis, o actual núcleo urbano de São João del Rei".

            Roberto Capri, organizador e editor do livro "Minas Gerais e seus Municípios", escrito em 1916, fala o seguinte sobre Matosinhos:

- "Mattozinhos constitue o bairro mais aprazível da cidade, banhado de um lado pelo riacho Água Limpa e do outro pelo caudaloso Rio das Mortes.  Neste poético Arraial, outr'ora theatro de grandes luctas e de sangue entre paulistas e emboabas que a sede do ouro attrahia a estas paragens, perpassa hoje um sopro de vida nova e alegria e de amor.  Que linda garça campeia entre as verduras das chácaras e a romântica cappela do Bom Jesus do Mattozinhos, para onde afluem romeiros de todas as partes por ocasião das  festas do Espírito Santo, que ali se celebram com grande e solenne magnificência”

            O bairro de Matosinhos delimita-se com o bairro das Fábricas, na confluência do Córrego da Água Limpa com o Córrego do Lenheiro até na junção destes com o Rio das Mortes, próximo ao Estádio do América. Daí até nas proximidades da Ponte do Porto, com a Colônia do Marçal e da Ponte do Porto a montante (4) do Rio das Mortes, com a cidade de Santa Cruz de Minas. À esquerda do Córrego da Água Limpa, ao pé do morro, delimita-se com o bairro Jardim Central, também conhecido como Caieira.  Sua base geométrica que se assentava no bairro Pio XII, conforme mencionou Nelson de Sena em 1909, hoje se expandiu e se assenta na BR-265, que liga São João del Rei a Tiradentes.

            Sua população está estimada no ano de 2000 em aproximadamente 30 mil habitantes e é mesclada por todas as raças e várias religiões, com predominância para a Católica Apostólica Romana.

            Seus habitantes são muito trabalhadores. Destacam-se os operários de fábricas de tecidos, marceneiros, carpinteiros, pedreiros, metalúrgicos, comerciantes e também profissionais liberais de diversas especialidades.

            Seus habitantes divertem-se de diversas formas, tais como, em barzinhos, barraquinhas de largo, queima do Judas, pagodes (5), jogo de bocha (6), jogo da malha (7),futebol, bailes, blocos carnavalescos, possuindo inclusive a Escola de Samba Girassol que fundada em l983, já conquistou dois títulos máximos do carnaval de São João del Rei.

            “O Grande Matosinhos” é subdividido em diversas vilas e pequenos núcleos habitacionais, tais como; Vila Santa Terezinha, Santo Antônio, Nossa Senhora de Fátima, Linha Velha, Jardim Paulo Campos, Pio XII, Bom Pastor, Lombão, Nª Sª da Paz e outros ainda em formação.

 (1) Pessoas ligadas ao Rei ou a Coroa Portuguesa.

(2) Córrego que banha o bairro a partir da ponte da BR-265 e desemboca no Rio das Mortes.

(3) Atual bairro Pio XII e bairro do Lombão, assim chamado pelo fato do bairro estar localizado num planalto em forma de um lombo.

(4)  Em direção à nascente do rio.

(5) Batuque ou roda de samba cantarolado em barzinhos ou nas esquinas.

(6) Jogo trazido pelos italianos, no qual dois jogadores ou dois pares jogam com quatro bolas de madeira cada time, no intuito de que essas se aproxime de uma bolinha lançada no fundo de um campo de terra delimitado, medindo aproximadamente 2 x 25 metros.

(7) Jogado num campo semelhante ao jogo da bocha, porém com discos de ferro, no intuito de derrubar três toquinhos que ficam do outro lado do campo.

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- LIGEIRA DESCRICAO DA CIDADE DE MATOSINHOS DE PORTUGAL
            O historiador português Rui Melo, in "Roteiro de Matosinhos" da C.M.Matosinhos, descreve o seguinte sobre nossa co-irmã cidade de Matosinhos de Portugal, baseado na edição de 21/5/1997 do Jornal de Notícias. Não mexemos na morfologia das palavras escritas em linguagem portuguesa de Portugal. Assim respeitamos sua originalidade:

Um breve cartão de identidade

            Matosinhos é um importante concelho da Região Norte, estando inserido na Área Metropolitana do Porto (A.M.P.), cuja população é de 1,15 milhões de pessoas. Matosinhos ocupa uma área de 62,3 km2, confronta a sul com a cidade do Porto, a norte com Vila do Conde, a este com a Maia e a oeste com o Oceano Atlântico.

            Admnistrativamente, o concelho está dividido em dez freguesias, sendo a cidade formada pelas de Matosinhos e Leça da Palmeira, com cerca de 50.000 habitantes. Em termos populacionais é o terceiro concelho da A.M.P., com 160.000 habitantes, tendo crescido 12,2% nos últimos dez anos. A densidade populacional é de 2568 habitantes/km2.

            A indústria transformadora tem um papel preponderante no concelho, absorvendo 76% dos 55% da população activa empregue no secundário. Ela é igualmente importante na A.M.P. (Área Metropolitana do Porto), representando em relação ao conjunto do país 18,7% do emprego, 19,6% do valor bruto da produção, 11,6% da formação bruta do capital fixo e 14,8% do número de estabelecimentos (valores de 1984).

            Matosinhos é um concelho com uma estrutura industrial que assenta fundamentalmente nas pequenas e médias empresas. Das 1065 empresas existentes, apenas 70 têm mais de 100 trabalhadores e somente 7 têm mais de mil.

            O sector terciário é um sector em expansão no concelho,existindo 318 estabelecimentos de comércio por grosso, 1016 de comércio a retalho e 612 estabelecimentos de serviços.

            Foram efectuados recentemente grandes investimentos nesta área: o Hipermercado Continente, que foi a primeira manifestação do país de uma tendência de concentração de distribuição comercial; o Parque de Exposições do Norte - EXPONOR, que é a maior área de exposições em Portugal; o terminal TIR, que registou em 1991 um movimento de 57 mil camiões e 487.000 toneladas de carga importada; as oficinas da C.P. - Caminhos de Ferro Portugueses, as quais prestam assistência ao tráfego Ferroviário do Norte do País.

            A agricultura tem um peso diminuto, a área regada é de 1.343 ha e o número de agricultores cerca de 250.

            Na pesca estão a laborar cerca de 300 embarcações, com um volume de pescado na ordem das 60 mil toneladas.

            Em Matosinhos convergem as grandes infra-estruturas nacionais de transporte, que em parte determinam a sua base económica: tem o segundo maior Porto Comercial do país, com um volume de cargas e descargas na ordem dos 6 milhões de toneladas/ano; o Aeroporto do Porto, com um tráfego de 1.461.040 passageiros e 19 mil toneladas/ano, registados em 1991; a nova rede viária, em construção, o lP4 - itinerário principal de ligação do litoral ao interior e à Galiza e o lCí, itinerário complementar, irão permitir um maior desenvolvimento do concelho e da região.

            No que respeita às infra-estruturas de saneamento básico, cerca de 99% da população é servida por rede pública de abastecimento de água. A percentagem no que respeita à rede pública de esgotos é bastante inferior, constituindo um dos principais objectivos da Autarquia para este mandato.

            As cooperativas de habitação têm tido um papel muito importante na resolução do problema de habitação, contribuindo decisivamente para uma expansão do mercado livre a custos controlados. O Município tem-nas apoiado, cedendo-lhes terrenos e facilitando o processamento burocrático de licenciamento dos projectos. O facto de estarmos inseridos na região mais jovem da Europa Comunitária (26,2% da população tem menos de 14 anos e somente 8,9% tem mais de 65), aliada ao alargamento do grau de escolaridade, obrigou o Município a investir bastante em infra-estruturas de ensino, sendo a situação no ano lectivo de 1990/91 a seguinte: 49 Estabelecimentos de Ensino Oficial Grau Básico, com  9.237 alunos, 6          Preparatórios com 5.260 alunos, 9 estabelecimentos Secundários com 11.187 alunos e 5 Pré-escolares com 172 alunos.

                No que respeita a equipamentos desportivos e de lazer, existem: quatro piscinas municipais (uma de mar, duas aquecidas e uma inserida no Parque Público da Quinta da Conceição), dois circuitos de manutenção, courts de ténis e dois campos de mini-golf; na zona norte do concelho (praia de Angeiras) situa-se um parque de campismo.

            Para além deste equipamento municipal, existem também 16 campos de futebol, 8 pavilhões gimnodesportivos, seis ringues, um campo de tiro, um hipódromo, uma pista de karting e quatro clubes de vela. No concelho, de resto, existem 154 colectividades desportivas.

A animação cultural, para além das múltiplas actividades realizadas pela Câmara, é levada a cabo pelas 73 associações espalhadas pelas dez freguesias do concelho.

Freguesias do Concelho de Matosinhos

História

            Concelho moderno e em franco desenvolvimento, Matosinhos possui, não obstante, um longo e marcante passado. Os mais antigos vestígios da acção humana neste território - vários instrumentos líticos talhados, atribuidos ao Paleolítico - possuirão alguns milhares de anos e foram recolhidos em praias antigas e actuais, nomeadamente na Boa Nova. A fixação das gentes a estas terras ter-se-á iniciado há cerca de cinco mil anos, durante o Neolítico, tendo chegado até aos nossos dias ténues vestígios dos monumentos funerários dessa época: as antas. Em Antela, Perafita e S. Gens localizar-se-iam importantes núcleos megalíticos.

            O desenvolvimento económico, social e demográfico destas primeiras comunidades humanas foi significativo durante a Idade dos Metais, culminando, nos finais da Idade do Bronze, na erupção de um tipo de habitat proto-urbano de altitude associado a uma cultura de características muito próprias que perdurará durante toda a Idade do Ferro: a castreja. Ainda hoje são significativos os vestígios de castros existentes no concelho, destacando-se pela sua área e espólio já recolhido o de Guifões.

            A chegada dos romanos, há cerca de dois mil anos, provocará profundas alterações. A abertura de vias e a construção de pontes (como a de Guifões) fazem parte de uma política generalizada de desenvolvimento das comunicações e do comércio, associada à pax romana. O estuário do Leça e a zona de Lavra terão sido, neste contexto, os locais mais romanizados, bem atestados nesta última por vestígios de uma vila e e produção de garum.

            Paulatinamente as populações começam a abandonar os povoados fortificados de altitude (os castros), fixando-se nos vales e zonas costeiras, permitindo um maior desenvolvimento da agricultura. Assim, com a romanização, estavam lançadas as raízes do que caracterizaria, praticamente até aos nossos dias, este território. Nem as invasões bárbaras, nem os conturbados tempos que se seguiram até à Reconquista Cristã, alteraram esta predominância agrícola num povoamento mais ou menos disperso. De resto, durante a Idade Média, a grande fertilidade destes solos fez com que a- (na qual se integrava o actual Concelho de Matosinhos) tenha sido muito cobiçada e centro de grandes lutas e interesses senhoriais.

            Da Alta Idade Média chegaram até hoje os testemunhos da importância que a morte tinha para um cristianismo em crescente implantação e importância: as sepulturas escavadas na rocha de Montedouro (Perafita). Mas, monumento medieval por excelência é o românico-gótico Mosteiro de Leça do Balio que resultou, aliás, da ampliação de uma anterior edificação. Com referências escritas desde 1003, este poderoso mosteiro viria a ser a primitiva sede, em Portugal, dos Hospitalários. Um outro mosteiro, anterior à nacionalidade foi o de Bouças de que, na actualidade, nada resta. No entanto, foi ele que tez desenvolver todo um aglomerado populacional que encabeçaria a divisão admnistrativa do Julgado de Bouças, que está na base do actual Concelho de Matosinhos. Medievais serão também as pontes do Carro (Sta. Cruz do Bispo e Guifões) e de D. Goimil (Custóias) sobre o rio Leça. Dessa época medieval veio também uma considerável exploração salineira que, no entanto e paulatinamente entrou em decadência, desaparecendo definitivamente há cerca de 150 anos.

            Os séculos seguintes à Idade Média mais não foram do que um reforçar das tendências anteriores. Com Carta de Foral atribuida em 1514 por D. Manuel 1, e assumindo-se como importante centro produtor agro-pecuário e sede de ricas propriedades, Matosinhos torna-se num dos principais pólos abastecedores do Porto, numa altura em que as freguesias como Pamalde, Aldoar ou 5. João da Foz faziam ainda parte integrante do seu território.

            Ao nível das mentalidades, a crescente cristianização das massas, associada à longínqua lenda do aparecimento de uma escultura de Cristo no lugar do Espinheiro (local hoje assinalado com um padrão), cedo transformou Matosinhos em importante centro de religiosidade popular para veneração daquela imagem. Mas, também, em local onde o sagrado se interpenetrou fortemente com o profano, transformando a romaria ao Senhor de Matosinhos, numa das mais concorridas e festivas do Entre-Douro-e-Minho. Inicialmente depositada no Mosteiro de Bouças, a imagem foi transferida no século XVI para a igreja de Matosinhos. Por esta época seria já nítido um certo apagamento do lugar de Bouças em detrimento do núcleo de Matosinhos, apagamento que então, e a partir deste facto, se torna irreversível. A crescente importância do culto levará, dois séculos depois, a profundas transformações naquele templo que, atribuidas a Nicolau Nasoni, resultarão no seu aspecto actual. De resto, àquele famoso arquitecto italiano são atribuidas outras construções no concelho no século XVI II, nomeadamente edifícios e estruturas arquitectónicas nas quintas do Chantre (Leça do Balio) e do Bispo (Sta. Cruz do Bispo).

            Mas, o concelho é também fruto da sua abertura ao mar. Por ele chegam as embarcações que, desde há muito, aqui vêm comerciar. Por ele partiram muitos mareantes, citados na época dos Descobrimentos. Por ele chegavam, também, invasores e piratas que levaram as autoridades à edificação de importantes fortalezas, como o castelo de N.~ S.~ das Neves (Leça da Palmeira). Por ele veio, em 1832, o exército comandado por D. Pedro que, desembarcado em Arnosa- -Pamplido, implantou definitivamente o liberalismo em Portugal, derrubando o absolutismo. Por ele chegou, já muito recentemente, uma forte e característica comunidade piscatória. Ele provocou a fixação de novos habitantes desejosos da sua proximidade (com a oitocentista colónia inglesa de Leça da Palmeira) ou dos , que aqui se praticam desde a segunda metade do século XIX.

            A necessidade de um porto de abrigo, primeiro, e um arrojado projecto de desenvolvimento económico-port uá rio, depois, levou em finais do último século à construção do Porto de Leixões. Era o início de um profundo processo de transformações que não terminou ainda. Transformações particularmente nítidas em todo o desenvolvimento urbanístico e industrial da (agora) cidade de Matosinhos, onde a indústria conserveira desempenhou verdadeiro papel de líder, (algumas fábricas conserveiras aguardam, presentemente, a sua classificação como imóveis de interesse concelhio). Tendo crescido de 25 para 140 mil habitantes entre 1900 e 1981, Matosinhos é hoje um concelho de grandes projectos, apostando no futuro. Mas, não há desenvolvimento sem integração e sem uma efectiva relação da população com o meio que a rode ia. Tal passa, necessariamente, pela preservação de uma memória colectiva que identifique as pessoas com os lugares e com o seu passado.

Locais a Visitar

Exponor

Porto de Leixões

Obelisco da Memória

Casa Museu Abel Salazar

Estátua a Passos Manuel


Castro de Guifões

                Na margem esquerda do Rio Leça, no Monte Castêlo, localiza--se o Castro de Guifões. Este antiquíssimo povoado, seguramente com origem no primeiro milénio anterior à nossa era, objecto de breves intervençoes arqueológicas nos finais do século XIX e em meados deste, possui inúmeras estruturas enterradas entre várias linhas de muralhas. O espólio já recolhido se indicia, por um lado, uma origem remota adentro do "mundo castrejo", revela, por outro lado, uma longa perduração patente numa significativa influência romana que, ainda hoje, é patente em vestígios à superfície de tegulae (telhas) e cerâmicas (incluindo a luxuosa terra sigiliata), troços de calçadas, e até numa ponte sobre o Leça (a de Guifões), no sopé da elevação. Infelizmente esta ruiu à poucos anos durante uma cheia, no que foi uma das maiores perdas patrimoniais do concelho. Castro e ponte foram classificados imóveis de interesse público em 1971.


Mosteiro de Leça do Balio

                Apesar da referência mais antiga deste monumento datar de 1003, a sua fundação é certamente anterior. Rico de história e testemunha de muitos episódios da vida nacional, o mosteiro passou a funcionar como igreja matriz desde 1834, altura em que foram extintas as ordens religiosas. Na década de 40 do nosso século o monumento foi intervencionado pelos serviços dos "Monumentos Nacionais" que, retirando-lhe as excrecências de vários séculos, lhe devolveu a traça resultante das obras que sofreu no século XIV. O decreto que o instituiu como monumento nacional, em 1910, inclui uma lâmina sepulcral de bronze que fazia parte do túmulo do Prior Frei Estêvão Pimentel (séc. XVl), dignatário da Ordem de Malta. Merecem, igualmenter referência uma pia baptismal renascentista, vários mausoléus e túmulos. Próximo, localiza-se um cruzeiro em pedra ançã primorosamente lavrado, mandado fazer em 1514 pelo balio João Coelho ao admirável estatuário coimbrão Diogo Pires, "o moço".Foi classificado monumento nacional, igualmente em 1910.


Tanques Escavados na Rocha

                Ao longo da praia de Angeiras (Lavra) encontram-se quatro grupos de tanques abertos na rocha. No entanto, devido à sua proximidade ao mar, estas 22 cavidades estão quase sempre assoreadas. Atribuidas ao Baixo Império Romano (sécs. 11-1V d.C.), destinar-se-iam à fabricação de garum, produto resultante da maceração de determinadas espécies de peixe - caro aperitivo, muito do gosto romano. Contudo, e pelas suas dimensões, pouca profundidade e verticalidade das paredes internas, há quem defenda que serviria para salmoura. Este agrupamento de tanques insere-se, provavelmente, num conjunto de estruturas e construções mais complexas, nomeadamente uma vilae, de que há vestígios significativos.
Pela sua importância e raridade foram classificados monumento nacional em 1970.


Sepulturas Abertas na Rocha

                Na freguesia de Perafita, no lugar de Pampelido, encontra-se um grupo de sepulturas medievais escavadas na rocha. É possível que muitas outras existissem nas imediações, porém terão sido destruidas em virtude da extracção de pedra que aqui se fez para a construção do porto de Leixões. É de salientar a sepultura localizada no alto de um outeiro no Montedouro, de forma oval e com rebordo.
Estas sepulturas foram classificadas como imóveis de interesse concelho em 1974.


Igreja e Padrão do Bom Jesus

                A história da freguesia de Matosinhos entronca na do desaparecido Mosteiro de Bouças e na imagem do Bom Jesus que ali foi venerada durante séculos. No séc. XVI, contudo, face à rui na do mosteiro, foi a imagem transferida para a igreja de Matosinhos cuja construção, iniciada em 1542, se ficou a dever à Universidade de Coimbra a quem pertencia o padroado de Matosinhos, por concessão do rei D. João III. O aspecto actual deve-se a remodelações e acrescentos, do segundo quartel do séc. XVIII, atribuidos a Nasoni. Data, também, de então a opulenta talha dourada que ainda hoje é possível admirar. Da construção inicial resta metade do corpo do templo, bem assim como a capela-mor. Esta igreja, imóvel de interesse público desde 1982, possui três naves divididas por colunas de capitéis jónicos onde assenta uma cobertura em caixotões de madeira e sete altares. No adro, dois fontenários e seis capelas com diversas cenas dos Passos da Paixão enriquecem o conjunto. Ligado à lenda da aparição da imagem, refira-se o padrão erigido no lugar do Espinheiro, assinalando o local do aparecimento daquela escultura. Embora existam dúvidas quanto à data da sua construção é provável que esteja relacionadas com as obras de ampliação da igreja de Matosinhos no séc. XVIII. É monumento nacional desde 1977.


Forte de Leça

                Após a restauração da independência (1640), e face à necessidade de defesa das nossas costas dos ataques espanhóis e piratas, edificou-se uma série de fortalezas junto ao mar. Aqui, construiu-se o forte de N.S. das Neves (Leça da Palmeira) que, juntamente com o de S. João da Foz e o de S. Francisco Xavier (Castelo do Queijo), constitiuiam úma forte linha de defesa à região. Perdida a função militar, aí se instalou em 1844 a alfândega do Porto e, em 1899, a secretaria do porto de Leixões. Hoje é sede da Capitania daquele porto. Foi classificado imóvel de interesse público em 1961.

Quintas

                No séc. XVI e XVII foi marcante a passagem, por este concelho, do arquitecto Nicolau Nasoni, já então conceituado por obras realizadas na cidade do Porto. Aqui foi responsável por uma vasta obra, sa- lientanto-se a quinta do Chantre (Leça do Balio) e o renovar de alguns traços arquitectónicos na seiscentista quinta do Bispo (St. Cruz do Bispo), nomeadamente o portal principal, trilobado de cantaria, encimado pelas armas do bispo S. José Maria Fonseca e Evora que, em 1750, decidiu empreender reformas nesta imponente e tranquila estância de repouso. A quinta do Chantre foi a primitiva propriedade de António Godinho de Faria, matosinhense que adquiriu fortuna considerável no Brasil. Ainda hoje, além de casa solarenga, compõe-se de campos, bouças, minas de água... Embora não sendo obra de Nasoni, merece também referência a Quinta de Fafiães: um conjunto de edificaçôes composto por casa, capela e tanque, no lugar do Barreiro (Leça do Balio). Imóveis de rara beleza e valor, as quintas do Bispo e Fafiães foram classificadas como de interesse público em 1977, sendo também classificada, um ano depois, a quinta do Chantre.


Pontes Medievais

                São várias, no concelho, as pontes que, se não são medievais, revelam uma técnica construtiva e um gosto arquitectónico que mergulha as suas raízes naquela época. O estudo das pontes em Matosinhos, tão útil para uma melhor compreensão das vias, seu traçado e evolução, está ainda por fazer.
De qualquer forma e desde 1g71, já estão classificadas como imóveis de interesse público as pontes de D. Goimil (Custóias) e a do Carro (St. Cruz do Bispo e Guifões). São estruturas claramente medievais, ou de tradição medieval, sendo portanto erróneas as referências que as datam da época romana.


Igreja de Lavra

                Construída em 1721 para substituir outra mais antiga (citada por D. Rodrigo da Cunha, no Catálogo dos Bispos do Porto, em 1623 - Pág. 398). O risco é do mestre-pedreiro Domingos Pires de Matos (de Vilar do Pinheiro). Foi remodelada em 1926. Boa talha (1738,1750, 1755), azulejos e algumas imagens de interesse.


Igreja Matriz - Peratita

                De duas torres, construída no século XVII. Ostenta o Brasão do Bispo do Porto, D. Jerónimo de Venezes. Tem bastante obra de talha, na capela-mor (contrato de 6 de Novembro de 1759).


Homem da Maça

                Escultura grosseira, em granito, que se supõe ser vestígio romano.


Cruzeiro-Leça do Bailo

Em pedra de Ançã, assinado por Diogo Pires - o Moço - (1514).


Capela de Nossa Senhora da Hora

                Valioso retábulo joanino.


Capela de Santana

                A imagem de pedra policromada que se julga ser também obra de Diogo Pires.


Igreja - Senhora da Hora

                O retábulo-mor é barroco (primeiro período). Foi adaptado à actal igreja, tendo sido acrescentado na base. A parte central é posterior.


Igreja de São Mamede

                ???de níesta Boa talha, que consta ter vindo do desaparecido Convento de Monchique. O retábulo-mor é barroco (primeiro período). Os retábulos laterais são joaninos.


Actualidades regionais - 1995

            Musa inspiradora de poetas populares, Matosinhos é um misto de terra e de mar e de sol, de pesca e pescadores, de peixe de prata a bulir, e de conservas também, de banhos, docas e o porto de Leixões. De tradições e mudanças, de culturas aglutinadas e de gente romântica, fiel e abnegada. O Atlântico, esse Oceano sem fim, é a sua maior referéncia.

            Matosinhos é, porventura o mais constratado e variado concelho da região. Não possui um rosto, uma identidade, mas trés ou quatro: a extensão urbana do Douro ao Leça e além, a explosão industrial e o desenvolvimento das docas, devorando as bordaduras da terra; a cidade em transformação e as praias da gente que faz férias em casa.

            A oito quilómetros do Porto, Matosinhos é uma estação balnear que se apresenta também como cidade industrial (conservas, refinarias) e prolonga-se para Norte pelo porto de Leixões. A construção do porto de Leixões, com as suas infra-estruturas de base (acessos rodoviários e ferroviários e instalação de serviços) provocou profundas alterações na paisagem e nos costumes das populações habituadas a conviver com o seu rio, onde magotes de mulheres se concentravam lavando e conversando, ao mesmo tempo que os seus filhos brincavam no areal. Também os pescadores disfrutavam o peixe e os banhistas as águas límpidas deste local.

            Matosinhos viria a conhecer um grande desenvolvimento, comprovado não só pelo incremento populacional devido á mão-de-obra que o porto atraía, mas também à elevada concentração industrial que este favoreceu. Por outro lado, instalar-se-iam fábricas de conservas sendo alimentadas pelo porto de pesca paralelamente, refira-se, outras indústrias como a moagem, a tecelagem, a metalurgia e a refinaria foram surgindo.

            Este desenvolvimento industrial não se pode dissociar da existência do porto de Leixões, uma vez que este constituía um meio de importação de matérias-pnmas e de escoamento de produtos transformados.

            Desempenhou ainda um papel preponderante na mobilidade das populações que, a partir desta porta aberta sobre o Atlântico, demandavam o Brasil e as Colónias Ultramarinas.

            O foral de Matosinhos, testemunha a elevação do lugar a vila - só em 1984 a vila seria elevada à categoria de cidade - integrando as duas freguesias: As duas freguesias de Matosinhos e Leça da Palmeira, no concelho de Bouças, Distrito do Porto, são erectas em vila com a denominação de Vila de Matosinhos (...) A capital do concelho de Bouças, ora existente na vila do mesmo nome, é transferida para a freguesia de Matosinhos, elevada à categoria de vila.

            A chave do crescimento matosinhense é a relação directa com o Oceano, proximidade esta que sempre induziu a actividades piscatórias por exigencias alimentares regionais e agromarítimas por imposição das necessidades produtivas dos campos limítrofes. Depois, provocou a revolução social dos banhos e praias, que transformaria as póvoas marinheiras e pescadeiras e as aldeias de lavradores-sargaceiros em centros de veraneio.

            Matosinhos transformou-se então em estância balnear para o chique da burguesia portuense, fluxo este que, juntamente com o de emigrantes e com incremento de mercadorias forçaria a inovação essenciais às ligações entre o Porto e Matosinhos. Atracção balnear dos meados do século XIX, este paraíso de veraneio tinha, porém, destino marcado já que o crescimento da região (que desde o século XVII exigia um porto de abrigo alternativo do rio Douro) impôs, no final do século XIX, a construção do porto de Leixões.

            De resto, a personalidade do concelho é, em muito, subsidiária de um fenómeno progressivo e superdominador: o porto de Leixões. E a expansão das pescas e das docas operou a primeira industrialização (embora tardiamente) para transformar o pescado em conservas. E, penetrando profundamente nos terrenos da embocadura do Leça, alterou por completo a paisagem local urbana e os modos de nela viver.

            Com o porto surgiram actividades dele dependentes, incrementou-se o comércio e os transportes terrestres e ferroviários, desenvolveu-se a pesca para níveis que catapultaram a vila para lugar cimeiro na produção nacional e instalaram-se indústrias transformadoras do pescados. O porto de Leixões motivou, de resto, a primeira revolução urbana e económica de Matosinhos num processo que decorreu até aos nossos dias, em que tende a diluir-se na diversificação industrial e na expansão do concelho para o interior.

            Atravês das praias, dos banhos e das pescas, do porto e do comércio, o mar foi, não apenas cenário mas, sobretudo, matriz do progresso material e da identidade de Matosinhos.


Baseado in "Actualidades Regionais" (1995) da C.M.Matosinhos

ROMARIA DO SENHOR BOM JESUS DE MATOSINHOS DE PORTUGAL    

            Festa religiosa oficialmente criada em 3 de Maio de 1733, pelos fiéis católicos. Esta romaria tem como objectivo o culto e devoção à Imagem do Bom Jesus - Senhor de Matosinhos.

            A imagem foi esculpida pelo escultor Nicodemos, o bom fariseu convertido a discípulo de Jesus. Nicodemos esculpiu várias imagens de Cristo em 5 madeiros da Judeia. Quando perseguido por judeus e romanos, Nicodemos lançou ao mar as 5 imagens. Hoje essas imagens são adoradas em Matosinhos (Portugal), Berio (Síria), Luca (Itália), Burgos (Espanha) e Orense (Galiza/Espanha). Velhas histórias relatam que a imagem do Senhor de Matosinhos apareceu na Praia do Espinheiro (Matosinhos) em 3 de Maio de 1242 - o local ficou assinalado com o Senhor do Padrão. A imagem no entanto apareceu na praia sem um braço e apesar de várias tentativas para a corrigir nada foi conseguido. Anos mais tarde uma pobre mulher de pescador encontrou o braço em falta. Após isto, contam-se várias lendas e histórias de curas milagrosas que com o tempo deram à imagem fama primeiro em Matosinhos, depois Porto e progressivamente o norte de Portugal, Portugal continental e províncias ultramarinas. A cidade do Porto em especial pediu por várias vezes a imagem por causa de cheias e doenças.

A Imagem estava numa primeira fase instalada no mosteiro de Bouças (Matosinhos estava integrado em Bouças antigamente), mas com o declínio deste local, foi transferida para Matosinhos.

            Com o passar dos tempos, este evento passou a ser principalmente uma festa popular em vez de uma romaria religiosa fazendo cair um pouco no esquecimento as raízes. No entanto foi recentemente criada uma comissão de festas com o intuito de recuperar algumas dessas raízes sem no entanto acabar com a animação associada a esta festa matosinhense. A romaria passa no fundo a ter duas vertentes distintas: a religiosa e a popular.

            A vertente popular da festa realiza-se como habitualmente junto ao porto de mar ao fundo da Avenida D. Afonso Henriques, Luna Parque e pelo Parque da Cidade.

            A vertente religiosa inclui procissões e missas. A Igreja de Matosinhos, recentemente recuperada terá aspecto primodial nestas celebrações. A Igreja erigida no século XVI e remodelada no século XVIII (por Nicolau Casoni) constitui uma obra notável de estilo barroco joanino. A imagem do Senhor de Matosinhos encontra-se aqui em exposição.

            De notar que existem muitos eventos paralelos associados à romaria do Senhor de Matosinhos que passam não só pela animação popular e actividades religiosas mas também pela cultura e desporto por exemplo.

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- AS ANTIGAS CHÁCARAS DE MATOSINHOS

            O bairro de Matosinhos, até por volta do fim do século XIX, era conhecido por ser um local de lazer, onde grandes personalidades políticas, eclesiásticas e estrangeiras tinham moradias e possuíam grandes plantios. Lazer pelo fato de o bairro ser banhado pelo caudaloso Rio das Mortes e Córrego da Água Limpa, os quais ofereciam água límpida para os deliciosos banhos no verão e manutenção dos diversificados pomares onde predominavam as jaboticabeiras, mangueiras, pessegueiros, laranjeiras e outras frutas que hoje se tornaram raridades, tais como romã, carambola, jambo, pitanga, amora, ameixas e outras mais. 

            No bairro existiam inúmeras chácaras, entre elas a Chácara Lyndoia, pertencente ao republicano Sebastião Sette (nome de uma travessa perpendicular à Av. Tancredo Neves e Marechal Deodoro no centro de São João del Rei), situada no local onde hoje se encontra a Fábrica de Tecidos São João, cuja construção iniciou-se a 15 de fevereiro de 1946, conforme contrato assinado entre os Diretores Tancredo de Almeida Neves, João Hallak, Eduardo Ávila e o construtor Onofre Arcanjo das Neves, este último patriarca de uma numerosa família de Matosinhos. São seus filhos; Jeter, Roque, Leonidas, Teresa, Hélia, Romeu, Maria, José (Parode) e Alice. 

            Chácara dos Campos, de propriedade da família de Gustavo Campos, neto do Barão de Conceição da Barra e bisneto do Marquês de Valença. O velho Gustavo Campos é avô do ex-Vice-Prefeito de São João del Rei, de mesmo nome, e pai do Dr. Paulo de Resende Campos, já falecido, casado com D. Eneida Sette, filha do Professor Sebastião Sette, proprietário da citada Chácara Lindoya. Além de D. Eneida nasceram também na Chácara Lindoia, filhos do segundo casamento, Lyndoia, que morreu ainda menina, Eubea, Lindeia, Elisa, Sebastião, que morreu menino e Altivo. Em Matosinhos, nasceram os seguintes filhos do Dr. Paulo de Resende Campos: Gustavo, Paulo, Vicente, Demétrio, Lourdes, Celeste e Tereza. A Chácara dos Campos ficava exatamente onde hoje se encontra o Bairro Jardim Paulo Campos, no qual localiza o Estádio do Social Futebol Clube.

            Chácara do Sr. Carlos Henriques (avô paterno do autor deste, nascido em 15/03/1886 e falecido em 29/11/1976), onde nasceram pela ordem cronológica seus filhos: Maria Helena Henriques, casada com José Augusto Guimarães, falecido em 1998, José Pedro Henriques, pai do autor deste trabalho, nascido em 29/06/1912 e falecido a 21/11/1990, casado com Maria de Lourdes Henriques; Geraldo Henriques (nascido em 08/12/1913 e falecido em 25/10/1990), casado com Zilda Vargas; Carlos Henriques Filho, casado com Walmyria Martins, falecida; Silvia Henriques, casada com Afonso José de Matos, falecido; Elza Henriques, falecida, casada com Francisco Almeida Magalhães, também já falecido. O Sr. Carlos Henriques era filho de José Cezário Henriques, agricultor vindo da região de Mar de Espanha, cidade próxima a Juiz de Fora. A Chácara do Sr. Carlos Henriques era delimitada pelo prédio do antigo Cine Matosinhos, na atual Avenida Josué de Queiroz até a Rua Dentista Batista Filho, com fundos para a Av. Sete de Setembro, sendo que à sua esquerda ficava a Chácara do Coronel Pompeu.

            Chácara do Coronel Pompeu, anteriormente pertencente à D. Malvina Tristão ficava defronte à fábrica de tecidos São João, na avenida Josué de Queiroz. O Coronel Pompeu criou seus quatorze filhos em Matosinhos. Era neto do Barão da Ponta do Morro e bisneto do Tenente General Antônio José Dias Coelho (1) e Maria Inácia Silveira Bueno, irmã de Bárbara Heliodora (2).

            Chácara da família Simas, localizada ao lado da linha férrea onde foi construída a Fábrica de Tecidos Matosinhos de propriedade do Sr. João Lombardi, tendo a parte dos fundos hoje a denominação de Vila Lombardi e o Cortume de Couros do Sr. Fidelis Guimarães, ou seja; do lado oposto do Jardim Paulo Campos.  O Testamento de Antônio de Medeiros Simas foi aberto no dia 22/03/1894, dia seguinte da sua morte que ocorreu em 21/03/1894. Filho de João de Medeiros Simas e Dona Antônia Jacintta Simas. Nascido e batizado na Freguezia do Senhor Bom Jesus Menino, na Ribeira das Tainha, paróquia da Vila Franca do Campo da Ilha de São Miguel (uma das nove ilhas dos Açores), pertencente à Portugal. Morreu solteiro.  Foram seus testamenteiros conjuntos seu sobrinho Francisco de Medeiros Simas e o senhor Augusto Theodoro de Faria e em segundo lugar o senhor Luiz Gozaga Dias e João Evangelista Pequeno e em terceiro lugar o senhor Theodoro de Faria. Teve oito irmãos: - Manoel de Medeiros Simas e João de Medeiros Simas residentes em São João del Rei. Jacintta e Francisca (residentes na Ilha de São Miguel - Açores). Ana, Jacinto e Francisco residentes no Brasil, porém este último será procurado em Edital por não saber o seu destino. Maria - Casada e falecida no Brasil, ignorando o lugar e nem se sabe se deixou descendentes.Deixou a seu afilhado Antônio, filho de Edwirge 2.000$000 (dois contos de réis),  para a compra de uma casa. Ao seu tutelado faustino 500$000 (quinhentos mil réis). Ao afilhado Luiz Gonzaga Dias 600$000 (seiscentos mil réis). Ao afilhado Cícero filho do comprade Horácio, 600$000 (seiscentos mil réis). À Sebastiana filha do compradre Amaro, 500$000 (quinhentos  mil réis). Ao afilhado que mora em casa de Cassimiro de Assis, 200$000 (duzentos mil réis). À suas duas irmãs que moram em Portugal 1.000$000 (um conto de réis) para cada uma. Mesma quantia para os irmãos Jacinto, Ana, Francisco e João, e para Vicente, filho da sobrinha Maria Vieira. Mesma quantia aos filhos do sobrinho Manoel  de Medeiros Simas Junior. Para este dois contos de réis. Ao irmão Manoel de Medeiros Simas três contos de réis. Aos sobrinhos Mariano dois contos de réis e Antônio, três contos de réis. Ao sobrinho Francisco Medeiros Simas três contos de réis, já que este é sócio na fábrica de refinação de açucar. Para sobrinha Maria Vieira Torquato e América, filha de Pelegrino Américo de Souza, um conto de réis. Para cozinheira Mariana cem mil réis. Para as duas casas de músicas da cidade duzentos meil réis com a condição de não tocar música em meu enterro. À Santa Casa de Misericórdia duzentos mil réis. Ao Asilo São Francisco duzentos mil réis. À igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos cem mil réis. À Igreja do Bom Jesus Menino da Ilha de São Miguel (atual Ilha dos Açores), duzentos mil réis. Dez missas para as almas de seus pais, dez para as almas de seus benfeitores, dez para as almas de seus tios mortos, dez para as almas de seus irmãos e dez missas para as almas do purgatório.

            Chácara do Sr. Juca dos Pilões, cuja frente era onde hoje se encontra parte da Rua Sete de Setembro, com fundos para a linha férrea.

            Até mesmo pequenas fazendas existiam no bairro, como por exemplo a do Sr. Jesus Silva, que fornecia leite para todo bairro até por volta de 1960.  O Sr. Jesus Silva era pai de Dolores Silva, Gualter, Walter, Walder, Mário, Eber, Maria e Marieta Silva.

            Outras personalidades de renome possuíam chácaras em Matosinhos, tais como o Padre Fernandes Alvares (1869-1950), espanhol de nascimento, assim como seu sobrinho o também famoso e consagrado Monsenhor Fernandes (1887-1975). A Chácara do Padre Fernandes Alvares (Vejam moradores Históricos de Matosinhos) ficava entre a Chácara do Sr. Juca dos Pilões (Rua Sete de Setembro) e a Chácara da família Simas, limitando-se ao fundo com a linha férrea.

            Chácara do médico inglês Dr. Guilherme Cavendish Lee, falecido a 27/05/1873.

            Chácara do Senador Gabriel Mendes dos Santos, falecido a 01/06/1873.

            Chácara de Dona Rita Leocádia da Silva, filha do famoso Coronel Carlos José da Silva, (1).

            Chácara do Coronel Inácio Correia Pamplona , um dos delatores dos inconfidentes, grande amigo do Coronel Carlos José da Silva e do Padre Carlos Toledo (2). Vejam biografias destas ilustres personalidades no capítulo "Moradores Históricos de Matosinhos".

            Chácara de Maria Angélica de Sá Menezes, segunda esposa do Coronel Carlos José da Silva, escrivão da Junta Real da Fazenda, homem de confiança do Governador Visconde de Barbacena e do Vice-Rei do Estado do Brasil, Luís de Vasconcelos e Sousa. Esta chácara, pelo que se pode concluir era a maior delas, pois constituía a junção de três chácaras anteriormente pertencentes ao Padre Inácio Correia Pamplona, sendo duas delas adquiridas em 03/02/1807, antes pertencentes ao Cap. João Batista Machado e dos herdeiros de Dona Joaquina Leocádia, e a terceira adquirida em 01/05/1811, também do Padre Inácio Correia Pamplona, filho do Coronel Pamplona. Esta grande chácara em 24/10/1862 foi adquirida por Francisco Teodoro da Silva (Barão de Pouso Alto) de sua irmã Carlota Camila da Silva, ambos filhos de Maria Angélica e do Coronel Carlos José, segundo informa o grande historiador Sebastião de Oliveira Cintra.

            Chácara de Joaquim Pedro de Souza Câmara, moço fidalgo de Sua Majestade, Sargento Mor de Cavalaria de Auxiliares do Rio das Mortes, que faleceu solteiro em 08/04/1798, deixando uma filha de nome Inácia Xavier Caetana de Aragão. Ele nasceu em Portugal, na Vila Viçosa, no ano de 1729. Foi inquirido na Inconfidência Mineira em sua própria casa em Matosinhos (veja Matosinhos na Inconfidência Mineira). Suas terras de Matosinhos partiam com a Chácara do Sr. Antônio Tavares da Rocha e com a do Cap. Jerônimo da Silva Pereira

            A 06/04/1826, o Sargento Mor João Rodrigues da Silva e outros venderam ao Capitão José Moreira da Rocha uma Chácara em Matosinhos denominada Santa Cruz com casas, 4 escravos e 2 palmatórias de latão. 

            A 13/11/1821, o Dr. Gomes da Silva Pereira hipotecou ao Capitão João Batista Machado a Chácara que possuía em Matosinhos. O advogado Dr. Gomes da Silva Pereira, que foi arrematante da passagem do Porto Real, era filho do Capitão Mor João da Silva Pereira e tinha como irmãos Mariana Bernarda de Oliveira e o Tenente Coronel Simão da Silva Pereira.

            Francisco Ribeiro Mendes (2), na época da construção da igreja do Senhor Bom Jesus, reinvidicou a Câmara de São João mais terras de sua propriedade por perto da igreja, possivelmente dada a valorização que o local passaria a ter.

            O Jornal "A Pátria Mineira", do nosso biografado Sebatião Sette, no. 188, de 09/02/1893, deu a seguinte notícia: "O Sr. Visconde de Entre Rios, que veio passar o verão em Matosinhos, adquiriu por quinze contos o chalé do Sr. José Lopes Bahia, em Matosinhos. Agradecemos a sua Exa. a visita que nos fez em companhia do Sr. Antônio M. Braga e família. O Sr. Visconde de Entre Rios era filho do Barão de Entre Rios e ambos tinham o mesmo nome, Antônio Barroso Pereira.

            O pequeno bairro de Matosinhos naquela época desenvolveu-se muito timidamente para o lado da hoje, Vila Santa Terezinha, que na época chamava-se “Vila Nova”. O nome Vila Nova durou até a inauguração da igreja de Santa Terezinha.

            O senhor José de Paula Rodrigues, que morava na Rua Amaral Gurgel com Modesto de Paiva, hoje, proprietário de um bar na esquina da Av. Josué de Queiroz com Amaral Gurgel, nascido em 19/03/1925, lembra muito bem da Vila Santa Terezinha das décadas de 1940 e 1950. Segundo ele existia uma rivalidade terrível entre os moradores da Vila Santa Terezinha e de Matosinhos propriamente dito. Ninguém de Matosinhos pisava no território da Vila e vice-versa. A Vila Santa Terezinha começava na  altura da Chácara do Senhor Silvio Pinto, família também tradicional do Grande Matosinhos. A Chácara do Senhor Silvio Pinto ficava de frente para a Avenida Josué de Queiroz, entre as ruas Luiz Alves e Amaral Gurgel, com fundos para a Av. Sete de Setembro.

            Segundo o senhor José Rodrigues, confirmado pela Dona Tutuca, filha do Silvio Pinto, para o lado de cima da Chácara do seu pai, tinha a Chácara dos pais do conhecido Sargento Dalbigui, atrás desta, tinha a propriedade do Senhor Augusto Zanetti, legítimo imigrante italiano, pai dos conhecidos Vitório Zanetti, Silvio, José e Alberico Zanetti, que deixaram inúmeros descendentes.

            Tinha também, como moradores, o senhor Estevão Charbel, proprietário de um armazém na antiga Rua Josué de Queiroz, nº 482, o senhor Manoel Ribeiro, pai de numerosa família, da qual podemos citar o senhor Geraldo Ribeiro, corretor de imóveis e proprietário por último da Fábrica de Biscoitos Mazzoni e muitas outras distintas famílias.

            Muitos outros imigrantes italianos fixaram-se na região da Vila Santa Terezinha, entre eles o senhor Severino Posidônio Giarola, que deixou 10 filhos, descritos a seguir na forma cronológica de nascimento, de nomes: Guilherme, Antônia, Júlia, Maria Conceição, Margarida, Paulina, Aquiles, Atíglio, Romildo e Francisco, o qual me passou alguns dados da figura marcante que foi seu pai, para a Vila Santa Terezinha.

            Severino Giarola, como era mais conhecido, filho de Luiz Giarola, imigrante italiano (nome de rua na Colônia do Marçal) veio a morar na Vila Santa Terezinha, porque, quando casou seu primeiro filho Guilherme, o deixou morando em sua casa, exatamente na rua Luiz Giarola, citada anteriormente. Mudou-se para a casa que hoje faz esquina entre Manoel Fortes e Expedicionário Antônio Coelho da Silveira. Muito religioso, passou em comum acordo com os padres salesianos, representados pelo Cônego Tortoriello, e o Pe. Fernandes Álvares, este último, vigário da igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, a administrar a construção da igreja de Santa Terezinha, em 1946, a qual veio a inaugurar-se no ano de 1949. Neste ínterim, as missas eram celebradas numa cazinha localizada na rua Manoel Fortes, nº 237. Severino Giarola também ajudou a administrar a conferência Vicentina, criada em 12/07/1946, pela igreja de Matosinhos. Esta conferência que possuía 10 casas, existentes até nos dias de hoje, estão localizadas na rua Manoel Fortes com Santa Madalena e hoje são administradas pela igreja de Santa Terezinha e Moradores do Bairro Bom Pastor. Quem doou o terreno foi o Senhor Jesus Silva, que era proprietário de vastas terras que começavam na linha férrea (atrás do INOCOP) e abrangia todo bairro Bom Pastor.

            Acima do bairro Bom Pastor eram terras do Sr. Severino Giarola, que se transformaram no bairro PIO XII. Severino Giarola tinha também terras ao lado esquerdo do Córrego da Água Limpa, aonde cultivava hortaliças e localizavam-se suas olarias.  Foram das suas olarias, que saíram os tijolos para a construção da igreja de Santa Terezinha.

            Em 1947, os padres salesianos idealizaram a criação de um Oratório Festivo ao mesmo tempo em que a igrejinha era construída. Lá estava também o Senhor Severino Giarola para ajudar.

            Ele, juntamente com o Sr. João Lombardi adquiriram um terreno localizado no quarteirão delimitado pelas ruas: Pe. Custódio Dias, Joaquim Quintino dos Reis, Antônio Coelho da Silveira e Santa Madalena, a fim de construírem uma casa de educação infantil, cujo projeto teria área de esporte, lazer e serviços, tais como: gráfica e trabalhos manuais. Os campos de futebol, em número de dois foram construídos  e infelizmente o projeto não foi à frente, por vários motivos, entre eles a criação da Paróquia de Matosinhos em 1960, fato que inibiu os salesianos de ajudarem no projeto e de continuarem administrando o Oratório Festivo Santa Terezinha, de saudosa memória. Com isso, finda-se também a existência do Oratório.

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(1)     Antônio José Dias Coelho, tenente da Cavalaria Paga, era português e foi quem prendeu Padre Toledo, Padre Rolim e Alvarenga Peixoto, seu suposto cunhado. Foi muito bem recompensado com remuneração e títulos pelos trabalhos prestados à Coroa portuguesa. Do seu romance com a irmã de Bárbara Heliodora, de nome Maria Inácia Policena, em 1787, nasceu Antônio Francisco Teixeira Coelho, Barão da Ponta do Morro, criado pelo Inconfidente Francisco A. de Oliveira Lopes e sua mulher D. Hypólita

(2)     A família de Bárbara Heliodora é descendente de Amador Bueno, participante da famosa Guerra dos Emboabas, conforme genealogia de Dario Cardoso Vale (2).  Eram os seguintes os filhos do Coronel Pompeu: - Maria Querubina, Gabriel, Alzira, Gabriela, Blandina, Corinto, Francisco, Georgina, João, Hidelbrando, Etelvina, Aurora, Romilda e Helena.

(3)     Vale, Dario Cardoso. Memória Histórica de Prados. Belo Horizonte: 1985

(1) Coronel Carlos José da Silva, escrivão da junta real da Fazenda na época da Inconfidência, homem de muita confiança do Governador de Minas, Visconde de Barbacena.  Nasceu em Portugal em 1741 e faleceu em Vila Rica em 1808.  De seu segundo casamento com Maria Angélica em 1798 nasceram dois filhos; Francisco Teodoro da Silva (Barão de Pouso Alto) e Carlota Camila da Silva, moradores em Matosinhos. Tinha também outros 09 (nove) filhos com Dona Inácia no primeiro casamento (ADIM, VOL I - PAG. 108), sendo que alguns deles vieram morar também em Matosinhos.

(2) Padre Carlos Correia de Toledo e Melo, nasceu em 1731 em Taubaté, estado de S. Paulo.  Era vigário da Paroquia de Santo Antônio em Tiradentes (S. José del Rei), a qual passou para seu irmão Padre Bento Toledo. Sua primeira inquirição foi em 14/11/1789 e apesar de tentar fugir de sua capitura, foi corajoso em afirmar que participava da Conjuração Mineira.  Inicialmente delatou apenas o Coronel Silvério dos Reis, dizendo que este entraria com dinheiro para ajudar no movimento.  Possuía fazenda com muitas plantações, criações e dezesseis escravos em Resende Costa, onde era vizinho do Coronel Inconfidente Francisco A. Oliveira Lopes, local onde possuía também muitos teares, cultura tradicional que até hoje perdura em Resende Costa.  Possuía também lavra de ouro em São Tiago.  Sua pretensão era a de ser Bispo.

 (1) Francisco Ribeiro Mendes, nasceu na cidade do Porto, em Portugal.  Tinha terras em Matosinhos e São Sebastião do Rio Abaixo.  Possuía também casa na Rua Direita em S. João e 9 escravos.  Seu testamento foi feito por Jerônimo Silva Guimarães em 16/11/1765, conforme livro nº 08, folha 274, Muséu Regional de São João del Rei.  Era irmão da ordem terceira de S. Francisco de S. João del Rei, Rio de Janeiro e Lisboa.  No seu testamento mandou celebrar 500 missas, sendo 400 por sua alma e 100 pelas almas do Purgatório.  Mandou repartir 40 oitavas (143,432 grs) de ouro para os pobres, 200$000 (duzentos mil reis) para Ordem Terceira de S. Francisco, 50$000 (cinquenta mil reis) para Ordem Terceira do Senhor dos Montes do Carmo e 40$000 (quarenta mil reis) para a Irmandade do Santíssimo Sacramento.

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- ALGUNS DADOS DA FAMILIA HENRIQUES

                      Meu bisavô chamava-se José Cesário Henriques, casado com Dona Rosalina Josefina Henriques, que geraram dez filhos: Amélia Henriques Godinho, Armando Henriques, Carolina Henriques, Adélia Henriques, José Cesário Henriques Filho, Ademar Henriques, Carlos Henriques, Maria Amélia Henriques, Rosalina Henriques Filha e Júlia Henriques.

                      No Museu Regional de São João del Rei, encontramos o Inventário do Capitão José Cesário Henriques, falecido em 06/08/1898, morador no Arraial de Matosinhos. Tinha como patrimônio e deixou como herança: a hipoteca de uma fazenda de 50 alqueires, denominada Sarandy, com aproximadamente 60.000 pés de café, com cinco casas para colonos, localizada em Santa Helena, Município de Juiz de Fora, a qual foi vendida em 16/05/1896 ao Sr. Reodarte Bernardelli.  Deixou também uma casa na Rua da Prata nº 05, em São João del Rei, com 06 janelas de frente e uma porta lateral, confrontando de um lado com casas de Dona Rita Maciel, por outro lado com Dona Gertrudes de Tal, sogra do Doutor José Alves Vilela, e pelos fundos com o Beco da Rua Hemílio Alves (hoje Beco do H), que comprou do Dr. Cassiano de Noronha Gonzaga, morador em São Paulo, e uma Chácara em Matosinhos, bairro de São João del Rei.

                      A própria viúva Dona Rosalina foi a testamenteira de seu marido e nomeou o Dr. José de Resende Ferreira Guimarães como procurador da família, que efetuou o pagamento de algumas contas do falecido e entregou a relação do restante ao Meritíssimo Juiz. Pagou ao farmacêutico Dr. Antônio Cândido Martins de Alvarenga o referente à compra de remédios, ao Sr. Marçal de Sousa Oliveira o referente à compra de dois leques, um par de sapatos pretos para senhora, três capuzes de feltro bordados, quatro metros de chariot de lã (tecido para cobrir carrinho de criança) e diversos outros utensílios. A Domingos Bello, pagou a compra de ferramentas.

                      O Meritíssimo Juiz de Direito determinou que metade da herança do Capitão José Cesário fosse para Dona Rosalina e a outra metade dividida pelos dez filhos. Assim sendo, Dona Rosalina ficou com a metade da casa da Rua da Prata, parte da venda da Fazenda Sarandy e algumas peças de casa, como mesa de mármore e outros utensílios. Dona Amélia Henriques Godinho e Armando Henriques também ficaram com parte da venda da fazenda e os demais oito herdeiros com a oitava parte da Chácara de Matosinhos, oitava parte da metade da casa da Rua da Prata nº 05, oitava parte de uma coberta e parte da Fazenda hipotecada. A seqüência da distribuição da herança foi a seguinte:

1.     Amélia Henriques Godinho: valor da parte devida por hipoteca de Reodartes Bernadelli;

2.     Armando Henriques: o mesmo;

3.     Carolina Henriques (menor): oitava parte da chácara de Matosinhos, oitava parte da metade da casa da Rua da Prata, oitava parte de uma coberta e parte da hipoteca de Reodartes Bernardelli.

                      Mesma divisão para os demais herdeiros: Adélia (menor), José Cesário Filho (menor), Ademar (menor), Carlos Henriques (menor - avô do autor), Maria Amélia (menor), Rosalina Filha e Dona Júlia.

                      O Capitão José Cesário era devedor do Dr. Cassiano de Noronha, morador no Estado de São Paulo do restante e juros referentes a compra de uma casa situada à Rua da Prata nº 05, hipotecada no 2º ofício desta cidade em 17/07/1897. O valor restante era de 3.272$926 (três contos, duzentos e setenta e dois mil, novecentos e vinte seis reis), a juros de 10% anuais mais 16$600 (dezesseis mil e seiscentos réis) de despesas para liquidacão, dando o montante de 3.289$526 (três contos, duzentos e oitenta e nove mil e quinhentos e vinte seis reis). O valor total de compra da casa da Rua da Prata foi de 8.000$000 (oito contos de réis).

                      Em outra petição datada de 14/09/1898 a dívida cobrada da casa comercial A. F. de Araujo Costa é de 965$840, e o procurador Sr. José Resende Ferreira Guimarães aceitou pagar.

                      Também a 14/09/1898, o farmacéutico Dr. Antônio Cândido P. de Alvarenga cobra ao juiz a dívida de 398$500 (trezentos e noventa e oito mil e quinhentos réis) referente à compra de  remédios.

                      Finalmente, ficaram para herança a metade da casa da Rua da Prata, avaliada em 14.000$000 (quatorze contos de réis) já que a outra metade no valor de 7.780$000 (sete contos e setecentos e oitenta mil réis), ficou para pagar as dívidas remanescentes, e também toda a chácara de Matosinhos, avaliada em 7.000$000 (sete contos de réis).

                      A dívida que foi paga pelos herdeiros refere-se aos 3.289$526 para liquidar a compra da casa da Rua da Prata, aos 965$840 pagos à casa A. F. de Araújo Costa, aos 398$500 pagos ao farmacéutico Dr. Antônio Cândido Martins de Alvarenga, aos 871$880 pagos ao Sr. Francisco Cardoso pelo fornecimento de gêneros alimentícios, 124$070 a Domingos Bello, referente à compra de ferramentas e finalmente 153$200 pagos ao Sr. Marçal de Souza, referente à compra de leques de papel (2$000), um par de sapatos pretos para senhora (114$000), três capuzes de feltro bordados, quatro metros de chariot de lã (22$000) e diversos outros calçados.

                      Dona Rosalina Henriques e Amélia Henriques Godinho deram procuração ao irmão Armando Henriques para receber e assinar a venda dos imóveis de Sarandy, assinadas em Santa Helena a 15/05/1900.

                      Após a morte do marido, Dona Rosalina mudou-se para a cidade de Mar de Espanha, próxima a Juiz de Fora e é procurada em 05/07/1909 e 15/07/1909, para prestar contas da tutela dos menores.

RESUMO DO INVENTÁRIO

Pagamento das Contas a:

Dr. Cassiano de Noronha Gonzaga .......................................... 3:289$526

Contas Contadas ........................................................................350$980

Antônio Furtado de Araújo Costa ............................................... 965$840

Dr. Antônio Martins de Alvarenga ..............................................398$500

Domingos Bello .........................................................................124$070

Francisco Cardoso & Cia ...........................................................871$880

Marçal de Souza & Oliveira .......................................................159$200

TOTAL ..................................................................................6:159$996

VALORES DOS BENS E DIVISÃO DA HERANÇA

A receber por hipoteca ........................................................35:000$000

Bens de raiz ........................................................................21:000$000

Bens móveis ............................................................................807$000

TOTAL .......................................................................... 56:807$000

Pagamento de dívidas ........................................................  (6:159$996)

SALDO A SER MEIADO ................................................. 50:647$004

Meiação da Viúva .............................................................. 25:323$502

Meiação para os Herdeiros ..................................................25:323$502

Dedução de impostos referentes à parte dos herdeiros ............ (506$470)

SALDO A SER DIVIDIDO PARA DEZ HERDEIROS .......24:817$032

LÍQUIDO PARA CADA HERDEIRO ................................  2:481$703

                      Também no Museu Regional do IPHAN de São João del Rei encontra-se o inventário dos ascendentes do Capitão José Cesário Henriques de nome Mathias Henriques, morador no caminho do Rio de Janeiro, casado com Maria Arcangella Josefa, falecido na Freguesia de Nossa Senhora da Assumpção do Engenho do Mato, natural da Freguesia de São Silvestre do Gradil, Termo de Torres Vedras, Patriarcado de Lisboa, filho de Mathias Henriques e Mariana Henriques e que não tendo descendentes passava seus bens para seu irmão Manoel Henriques e para a própria Maria Arcangella Josefa e, na falta destes, para os filhos de Manoel Henriques, moradores na Vila de Barbacena. Foi testamenteiro de Mathias Henriques o Coronel Manoel do Valle Amado e em segundo lugar João dos Santos, morador no Barroso. Em São João del Rei, o Coronel Manoel do Valle Amado passou procuração ao Dr. Manoel José Dias e ao Alferes Manoel Ribeiro Quintas.

                      Também foi encontrado o inventário de João Carvalho Henriques, morador na Aplicação da Capela de Nossa Senhora da Lapa dos Olhos D’agua (1), termo da Vila de São José do Rio das Mortes, quando capelão Padre José Gomes Rodrigues, de São João del Rei. Nascido e batizado na Freguezia de São Thiago, Termo de Barcellos, Arcebispado de Braga, Portugal, filho de Manoel Carvalho Henriques e Dona Batista Carvalha. Morreu solteiro sem dependentes. Declarou ser irmão do Senhor de Matosinhos. Seu testamenteiro foi Bartolomeu de Villas Boas, em segundo lugar João de Tal, em terceiro Manoel Dias da Costa, em quarto Manoel Marques de Oliveira e em quinto lugar Manoel Pereira de Azevedo, sendo o primeiro testamenteiro morador na Aplicação da Lage e os demais na Aplicação de Santo Amaro, Termo da Vila de Queluz.

(1) Capela dos Olhos Dagua, filial da Igreja de Prados por provisão de 1733, subordinada a Vila de São José (Dicionário Histórico de Minas Gerais, de Waldemar de Almeida Barbosa).

                      João Carvalho Henriques deixou dez oitavas de ouro para os mais necessitados de Olhos D`agua. Pediu cem missas para sua alma, vinte para seus pais e parentes, vinte pelas almas do purgatório, vinte para as almas de quem com ele fez negócios, vinte para os compadres e comadres. Pediu para ser enterrado envolto no hábito de São Francisco. Pediu para ser posto em liberdade seu escravo mais velho de nome Francisco Benguella. No mesmo Museu também foi encontrado o inventário de José da Cruz Henriques, nascido e batizado na Freguesia de Santa Bárbara do Ribeirão de Santo Antônio, Bispado de Mariana, filho de Bartolomeu da Cruz Henriques e de Catarina Oliveira Salazar. Casado com Maria do Carmo, de cujo matrimônio adveio uma filha de nome Joaquina. Posteriormente, separaram-se, tendo ela ficado com todos os bens. Fez testamento na Vila de Barbacena em 1820, nomeou seu primeiro testamenteiro Joaquim Manoel de Oliveira Bastos, em segundo o Sr. Costa Filgueira e em terceiro lugar Antônio Lopes de Oliveira.

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- MORADORES HISTÓRICOS DE MATOSINHOS

INÁCIO CORREIA PAMPLONA

            Coronel Inácio Correia Pamplona, um dos delatores dos Inconfidentes e amigo do Padre Carlos Toledo. Era português nascido em 1731, na Ilha Terceira, cidade de Angra, e falecido em 1810, provavelmente em Matosinhos, pois ali se encontrava mais perto dos recursos médicos. Foi casado com Eugênia Maria da Silva e tiveram seis filhos, a saber: Padre Inácio, Theodora, Rosa, Inácia, Simplícia e Bernardina. Esta última casada com João José Correia Pamplona e as demais mandou recolher na Clausura de Macaúbas (1) juntamente com sua sobrinha Bernarda. Foi sepultado no Cemitério do Carmo, de onde era irmão. Possuía três fazendas nas imediações de Resende Costa, Prados e Lagoa Dourada de nome Mendanha, Capote e Glória. A primeira foi vendida ao Conselheiro João Viana em 18/09/1834. Ganhou do Governo Português oito Sesmarias pelas conquistas de Bambuí e Campo Grande (nascente do Rio S. Francisco), onde havia muitos negros quilombados, sendo que em 1775, não conseguindo expulsá-los, voltou de bandeira em 1779 com 100 homens, capelão, cirurgião e botica. Encontra-se abaixo a relação de suas Sesmarias retirada do livro de Testamentos número 14, do Museu do SPHAN de São João del Rei: Em Bambuí, todas possuindo três léguas de terras: Sesmaria de São Simão, Santo Estevão e Desempenhado. A primeira vendida a 10/09/1801 ao Alferes Antônio Luiz de Noronha por 800$000 (oitocentos mil reis), a terceira vendida a 31/10/1803 ao Alferes João Crisóstomo de Magalhães e seus sócios por 1:600$000 (um conto e seiscentos mil reis).

            A quarta Sesmaria, na beira do Rio São Francisco, chamada Perdizes, também com três léguas de terras, vendida a 16/07/1808 a Maria Alves de Souza, viúva de Alexandre Ferreira, por 1:200$000 (um conto e duzentos mil réis). A quinta e a sexta, do lado de ca (sic) do Rio São Francisco, no Tamanduá (atual cidade de Itapecerica) chamada São Julião e Tapada, com três léguas de terras. A sétima e oitava Sesmarias, localizadas também no Tamanduá, mas com apenas meia légua de terras, chamadas do Turco e Lagoa dos Servos.

            Seu testamenteiro foi seu próprio filho Padre Inácio (2), que arrematou suas terras de Matosinhos, identificadas como chácara Palestina, comprada do Capitão João Batista Machado por 700$000 (setecentos mil réis), em 1808 e outra unida a esta, que arrematou dos orfãos de D. Joaquina Leocádia, onde o Coronel Pamplona investiu em muitas obras, usando seus escravos. No seu Testamento, alforriou cerca de trinta escravos e deixou outros trabalhando para seu filho Padre Inácio. Também, deixou 200$000 (duzentos mil reis), para Maria Izabel, sua afilhada, filha do Doutor Gomes da Silva Pereira (arrematante da Passagem do Porto Real), 100$000 (cem mil réis), para mais vinte e cinco missas à Nª. Senhora da Conceição e Nª. Sª. da Lapa, presentes no altar do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, para onde também deixou esmolas para a lampeda (sic) da Igreja (acredito que seja luminárias), com o que restou de suas terras e das de seu filho Padre Inácio. Seu Testamento foi feito, cozido, lacrado e assinado em Matosinhos, a 13/08/1810.

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(1) Convento de Macaúbas, fundado pelo Ermitão Felix da Costa em 1712. Pertence à Ordem da Imaculada Conceição que foi fundada por Santa Beatriz da Silva e Menezes, nascida em Campo Maior (Portugal, no ano de 1424 e falecida em 1491. Foi canonizada pelo Papa Paulo VI em 03/10/1976, conforme escritos na entrada principal do convento.

(2) Padre Inácio Correia Pamplona Corte Real, que herdou grande fortuna de seu pai, já que suas irmãs foram enclausuradas no Convento de Macaúbas (próximo da cidade de Santa Luzia - MG), teve dois filhos com Ana Constância de Paula, solteira, natural de Prados, onde o Pe. Inácio era Coadjutor.  Eram eles; Padre José Maria Correia Pamplona e José Joaquim Correia, conforme informa Dario Cardoso Vale em seu livro Memória Histórica de Prados, Belo Horizonte, 1985.


            No livro número 03 do Segundo Ofício de Notas, folha 54, aparece uma escritura de doação que faz Padre Inácio Pamplona ao padre José Maria Correia, seu filho:

“Saibam quantos este público instrumento de escritura de doação patrimonial, em 10/02/1820, compareceu em meu escritório Padre Inácio, morador na Fazenda do Capote, município de São José, doa o Sítio chamado Capão das Porcas com casas e pertences, iniciando este com divisa do Padre Severino e com o corrego da Fazenda do Capote, que em parte divide com a Fazenda do Alferes Manoel José, até a barra do corguinho, indo até sua cabeceira, até dar numa baixada a qual dá num outro corguinho, até frontear com a vala que divide com José Vieira da Silva, seguindo daí por diante com divisas antigas de Manoel Vaz da Silva, Cap. João Rodrigues de Souza e terras que Pe. Inácio comprou do falecido seu pai Cel. Inácio Correia Pamplona e outras partes do alferes Bento Gonçalves Ramos e mais três escravos de nome Barnabé Crioulo (13 anos), José Moreira Angola (18 anos) e Luiz Crioullo (24 anos), doações estas para que José Maria Correia pudesse seguir o sacrifício do sacerdócio secular”.

                        Dario Cardoso Vale, em seu excelente livro “Memória Histórica de Prados”, Belo Horizonte 1985, descreve em sua página 152, que:

“Padre Inácio Correia Pamplona, faleceu em 17/10/1818, só absolvido e ungido, por perder a fala e por causa de apoplexia (derrame celebral). Foi enterrado na matriz de Prados (MG). Seus testamenteiros foram em 1º lugar: José Maria Correia (exposto e criado na casa do Padre) e Ana Constância de Paula, fazendo ambos um mesmo corpo. Em 2º lugar José Joaquim Correia e o Revº Pe. João Rodrigues de Melo, fazendo ambos um mesmo corpo”.

Na página seguinte, consta:

“Padre José Maria Corrêa Pamplona, faleceu com 59 anos, em 06/01/1854. Foi sepultado dentro da matriz. Deixou testamento. Declarou que foi exposto em casa do Cel. Inácio Corrêa Pamplona e depois soube que era filho de Ana Constância de Paula, já falecida. Sua 1ª testamenteira foi Senhorinha Cândida Rodrigues e Herculano Corrêa Pamplona, fazendo ambos um só corpo. Instituiu por herdeiros a Maria Constância Pamplona, Herculano Correa Pamplona, Pe. Inácio Corrêa Pamplona, Aureliano e Auxiliano (gêmeos), Guilhermina, Malvina e Maria Ludomila Pamplona, ficando esta última dispensada de declarar a sua mãe, e sendo os primeiros sete, filhos da 1ª testamenteira, Senhorinha Cândida Rodrigues, e todos reconhecidos por seus filhos e legítimos herdeiros”.

Na página 151, consta:

“Ana Constância de Paula que, solteira, teve com o Pe. Ignácio Correia Pamplona Corte Real, os filhos José Joaquim Correia e o Pe. José Maria Correia Pamplona”.

Portanto, conclui-se que o Pe. José Maria Correia Pamplona era filho legítimo do Pe. Inácio Correia Pamplona e neto do severo e machista português, Cel. Inácio Correia Pamplona, morador em Matosinhos.

JOAQUIM PEDRO DE SOUZA CÂMARA

            Moço fidalgo de Sua Majestade, Sargento-Mor de Cavalaria de Auxiliares do Rio das Mortes, que faleceu solteiro em 08/04/1798, deixando uma filha de nome Inácia Xavier Caetana de Aragão, provavelmente em homenagem à sua tia Francisca Xavier Caetana de Aragão.  Ele nasceu em Portugal, na Vila Viçosa no ano de 1729. Foi inquirido na Inconfidência Mineira em sua própria casa em Matosinhos.(veja Matosinhos na Inconfidência Mineira). 

            Seu testamento (1) foi feito a 17/07/1791 em Matosinhos, pelo Cap. Francisco Xavier Pereira da Silva, aprovado, lacrado, cozido (costurado) e fechado com cinco pontos de linha azul. Seu testamenteiro (2) foi o Capitão Luiz Cardoso Fontes, que manifestou por escrito serem poucos os seus bens para pagar suas contas, principalmente com o médico cirurgião Doutor Antônio Felisberto da Costa, que fez inúmeras visitas para ele falecido, e para seus escravos e os de uma tal Dona Joaquina. Também tinha dívidas com o Sargento-mor Gabriel Antônio de Mesquita, de quem o falecido comprava armas e outros utensílios como relógios e utilidades para sua casa.

            Deixou para sua filha Inácia, criada nesta Vila, na casa de Joaquim de Faria Cazado, muitas jóias, a Fazenda Morgado, no Algarve em Portugal, uma escrava de nome Maria Felizarda Crioulla e o escravo Crioullo Patrício. Deixou forro o mulato Feliciano pelos bons serviços prestados, sendo que ao todo tinha oito escravos. Tinha também Fazenda em Taveira e Quintas em Porto Alegre de Portugal.  No seu testamento não mencionou estas duas terras nem as de Matosinhos. As terras de Matosinhos partiam com a Chácara do Sr. Antônio Tavares da Rocha e com o Cap. Jerônimo da Silva Pereira. A 04/04/1798, por achar-se muito doente fez declaração por escrito de todos os seus bens, sem mencionar outra vez as terras de Matosinhos.

            Foi sepultado na Capela da Venerável Ordem Terceira do Carmo, envolto no Hábito de São Francisco. Deixou esmola tirada de sua herança para celebrar para sua alma 200 missas em São João e 1.500 (um mil e quinhentas) em Vila Viçosa, sua terra natal, e mais 200 missas na mesma cidade, para seus parentes.  Seu enterro foi acompanhado por oito sacerdotes e irmãos do Carmo e Passos, tendo missa cantada e rezada por 28 sacerdotes.

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 (1) Original que se encontra no Museu de S. João del Rei (Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) - Livro de Testamentos número 13, folha 288.

(2)  O Testamento era normalmente feito e lavrado por um advogado ou qualquer Doutor de lei e nele era indicado o Testamenteiro, ou seja; um homem de confiança, designado pelo interessado ou proprietário, que iria administrar a repartição dos bens e fazer cumprir o constante do Testamento.

SEBASTIÃO RODRIGUES SETTE CÂMARA

Sebastião Sette morou na famosa Chácara Lyndoia, em Matosinhos, demolida para a construção da Fábrica de Tecidos São João. Nasceu na Fazenda do Gandarela, comarca de Caeté (MG), em 1844 e lá voltou para morrer a 11/01/1921. Republicano dos mais ferrenhos, jornalista e professor, era proprietário do jornal "Pátria Mineira”, fundado em 1889 e fechado em 1894, tido como o mais importante jornal republicano do interior do Brasil, nas palavras do ilustre Basílio de Magalhães. Falava correntemente inglês, francês, italiano e espanhol. Casou-se pela primeira vez com Tereza Marcelina da Fonseca Marinho, com a qual teve dois filhos: Maria Leonor e Altivo Rodrigues Sette Câmara, sendo este último o principal colaborador direto do jornal republicano “Pátria Mineira”, falecido em 1906.  Altivo Rodrigues Sette Câmara, é bom distingui-lo de seu também ilustre irmão de igual nome, Altivo Lemos Sette Câmara.

Altivo, o primeiro, fundou juntamente com Basílio de Magalhães a revistinha denominada "A LOCOMOTIVA" e foi nela que registrou em 1890 a destruição da serra onde se encontra a Casa da Pedra. 

Para conhecer de perto a democracia americana, Sebastião Sette para lá viajou em 1881, sendo que mais tarde também visitou outros países, tais como; Inglaterra, França, Alemanha, Itália, Grécia, Egito e o território de Jerusalém.

Por causa da luta aberta a favor da república contra a monarquia, Sebastião Sette perdeu seu emprego de professor no Liceu de São João, onde dava aulas de francês e inglês. Foi reconduzido com o advento da república. Corajosamente, acompanhou a comitiva do republicano Silva Jardim em São João del Rei, a qual foi insultada e apedrejada quando hospedada no Hotel Colonial, próximo à Ponte da Cadeia.

Casou-se pela segunda vez, em 14/06/1893, com Elisa Lemos, ele com 49 anos e ela com 21.  Foram morar na Chácara Lyndoia em Matosinhos, onde nasceram Lyndoia, morta infante, Eneida, já falecida, casada com o Sr. Paulo Campos, falecido em 1990, Eubea, Lindeia, Elisa, Sebastião, morto menino, mordido por um cão raivoso, e, finalmente, Altivo Lemos Sette Câmara.

SENADOR GABRIEL MENDES DOS SANTOS

                 Batizado a 01/08/1795 na Capela de Santa Rita do Rio Abaixo, pertencente à Matriz de Nª. Sa. do Pilar de São João del Rei, servindo de padrinhos o Sargento Mor Gabriel Antônio de Mesquita e Genoveva de Almeida e Silva. Era filho do português Tomás Mendes e de Juliana Maria de Almeida, que se casaram a 08/02/1779 na Capela de Santa Rita, servindo como testemunhas Manoel Coelho dos Santos e André Esteves. Dr. Gabriel casou-se com Ana Izabel dos Santos Fonseca, natural de Diamantina, filha do Sargento Mor João Batista da Fonseca e Ana Luiza de Paula Pimenta, e não deixaram filhos. A viúva do Senador Gabriel casou-se pela segunda vez com o Dr. Francisco Nunes de Seabra Perestrelo. Ela faleceu com testamento a 08/03/1892, quando residia na Rua da Prata número 14. Eram os seguintes os irmãos do Senador:

1) Laureana Maria de Jesus, batizada a 09/10/1791 na Capela de Santa Rita. Faleceu com testamento a 14/12/1870. Casou-se com o português Tenente Coronel Luiz Manoel da Silva Caldas, que faleceu com testamento, conforme consta do livro n. 58 - museu do SPHAN, em 21/06/1840, deixando os filhos Aureliano Mendes da Silva Caldas, nascido em 30/07/1830 e falecido em 08/08/1901. A 26/06/1897, Aureliano recebeu a patente de Tenente Coronel, Chefe do Comando Superior da Guarda Nacional, comarca de São João del Rei e presidiu a Câmara Municipal da mesma cidade. Era irmã de Aureliano, Maria Cândida de Andrade, casada com o Sargento-Mor Manoel Rodrigues de Andrade. O Coronel Luiz Manoel da Silva Caldas também foi casado em primeiras núpcias com Joaquina da Conceição, na cidade de Goiás, onde nasceram quatro filhos: Luiz, Joaquim, Constância e Guilhermina.

2) Genoveva Maria de Almeida, falecida a 04/10/1788.

3) Antônia, batizada a 03/05/1798.

4) Francisco Mendes de Almeida e Silva, batizado em 19/08/1793, foi o segundo testamenteiro do Coronel Luiz Manoel.

5) Padre José Mendes dos Santos, que em 1821 adquiriu a Chácara do Segredo em São João del Rei.

6) Alferes Tomás Mendes dos Santos. Foi casado com Francisca Cândida de Castro, que lhe deu quatro filhos: Antônio, Francisco, Ananias e Mizael. Faleceu com testamento em 30/05/1823.

            O Senador Gabriel Mendes dos Santos foi Intendente dos Diamantes, Juiz de Fora da cidade de Santos, Ouvidor e Juiz de Direito da Comarca de São João del Rei. Faleceu em 01/06/1873.

DR. GUILHERME CAVENDISH LEE

                 Médico e engenheiro inglês Dr. Guilherme Cavendish Lee, que clinicou em São João del Rei desde 1834 até 1873, data de seu falecimento, possuidor de elevados conhecimentos em química, geologia, mineralogia, zoologia e botânica. Filho de George Lee e Sarah Lee, todos nascidos na cidade de Rochester, condado de Kent na Inglaterra. Dr. Guilherme era protestante, mas depois de chegar ao Brasil se converteu à Religião Católica. Foi casado com Ana Gertrudes de Faria Braga e não teve filhos. Em seu testamento declarou que possuía 92 apólices da dívida pública no valor de um conto de réis cada uma, deixando 20 apólices para seus sobrinhos filhos do Dr. George Lee, 20 apólices para sua irmã Diana Sidden, viúva de Samuel Sidden Rochester, 20 apólices para sua outra irmã Elisa Willians, residente em Londres e por morte dela, para seus filhos, 04 para o Dr. Guilherme Milward, são-joanense, nascido a 26/09/1877 e falecido no Rio de Janeiro a 14/11/1932, neto de ingleses e destacado professor da Faculdade de Medicina de São Paulo. Dr. Guilherme Milward curiosamente sofreu acidente ferroviário quando viajava de trem para o Bairro de Matosinhos, que colidiu com o trem que vinha da cidade de Antônio Carlos. Dr. Guilherme Cavendesh Lee também deixou 02 apólices para Cornélio Milward, irmão do Dr. Milward, 02 para seu amigo de coração Alexandre Whethereth, residente em Hearn Bay, condado de Kent, na Inglaterra, 01 para a afilhada Policena Mafra, 01 para a menor Maria Luiza Ratton, filha de Carlos Próspero Ratton, 02 para o Dr. Galdino Emiliano das Neves, 01 para o Sr. Valentim e 01 para o Sr. Magalhães. Também deixou 01 conto de reis para a viúva de Carlos Joaquim Máximo Pereira, 01 conto para Francelina Barreto, 01 conto para  o afilhado João Guilherme Gaede, 500 mil reis para a afilhada, filha de Izabel e José Ricardo, 500 mil reis para o Dr. João Crisóstomo Pinto da Fonseca e finalmente 04 contos em moeda papel a ser repartida entre seus sobrinhos e sobrinhas. Nomeou como primeiro testamenteiro o Dr. Guilherme Milward casado com sua sobrinha Georgina Lee, filha do irmão George Lee, como segundo testamenteiro o Padre José Maria Xavier e em terceiro o Major Cristiano José Ferreira.

                 Deixou livre um escravo de nome José e determinou que ele continuasse a morar em suas terras de Matosinhos em companhia de outras pessoas.  Deixou sua Chácara de Matosinhos para uma tal Edwirges, seu marido e filhos.  Seu testamento foi assinado em Matosinhos em 27/05/1873.

PADRE FERNANDES ALVARES

                 Padre Fernandes Alvares (1869-1950), de nacionalidade espanhola e tio do também famoso e consagrado Monsenhor Fernandes (1887-1975), o qual também nasceu na Espanha e chegou ao Brasil em 05/08/1895 e foi ordenado em Mariana a 10/07/1910, onde foi professor, como também colaborou com inúmeras outras Entidades, tais como Escola Apostólica do Caraça, Instituto Propedêutico de Ponte Nova, Colégio N. Senhora das Dores em São João del Rei, Vigário de Resende Costa, Ritápolis, Jeceaba, Coronel Xavier Chaves e São João del Rei, todas essas cidades em Minas Gerais. Já o Pe. Fernandes Alvares (Tio) que também foi ordenado em Mariana a 24/04/1894, faleceu em São João del Rei a 29/12/1950, sendo sepultado em jazigo perpétuo, no cemitério de N. Sra. do Rosário.  Nasceu em Telledo, (deve ser Toledo), Astúrias, na Espanha, a 13/06/1869. Pe. Fernandes Alvares, quando chegou ao Brasil, empregou-se como trabalhador braçal na Estrada de Ferro Central do Brasil, ramal de Ouro Preto, de onde se despertou para os estudos de Teologia no Seminário de Mariana no ano de 1891. Foi Capelão do Hospital de Paraíba do Sul (RJ), Vigário de São Manoel do Mutum (MG), Pároco em Ressaquinha (MG), Cel Xavier Chaves (MG) e Barroso (MG). Já idoso, Pe. José Fernandes Alvares adquiriu chácara em Matosinhos, onde prestou serviços religiosos na Igreja do Senhor Bom Jesus. A chácara do Pe. Fernandes Alvares era  localizada entre as Chácaras do Sr. Simas e Juca dos Pilões, na Rua Sete de Setembro com Praça Senhor Bom Jesus.

MARIA ANGÉLICA DE SÁ MENEZES

                 Maria Angélica de Sá Menezes, sobrinha do Dr. Manoel da Sá Fortes de Bustamante, administrador do Porto Real da Passagem, segunda esposa do Coronel Carlos José da Silva, escrivão da Junta Real da Fazenda, homem de muita confiança do Governador de Minas, Visconde de Barbacena (Luís Antônio Furtado de Mendonça). Do seu matrimônio com o Coronel Carlos José em 1798 nasceram dois filhos; Francisco Teodoro da Silva (Barão de Pouso Alto) e Carlota Camila da Silva.  Maria Angélica adquiriu do Padre Inácio Correia Pamplona Corte Real (1), filho do Coronel Pamplona, a famosa Chácara de Matosinhos em 03/02/1807, antes adquirida do Capitão João Batista da Silveira e de sua mulher Joana Angélica de Jesus Freire e outras terras adjuntas em 01/05/1811.  Após partilha dos bens o Barão de Pouso Alto, filho de Maria Angélica, comprou a parte da Chácara de Matosinhos de sua irmã, Carlota Camila da Silva.

                 Em 24/01/1817 em Matosinhos da Agua Limpa, em casas de Maria Angélica de Sá Menezes o tabelião Joaquim Bibiano Soares Baptista, nomeia os procuradores em Lisboa, Sr. Joaquim Cardoso Carvalho, Anastácio José Pedroso e Lourenço Antônio de Araújo para cuidarem dos bens que seu pai em defesa da corte portuguesa  ganhou pelos serviços prestados.

RITA LEOCÁDIA DA SILVA

                 Rita Leocádia da Silva, morreu solteira, filha do Coronel Carlos José da Silva, Escrivão da Junta Real da Fazenda e de Dona Inácia em primeiro matrimônio, natural de Ouro Preto.  Seu testamento foi feito em Matosinhos a 09/09/1861 e aberto em 11/09/1871, ano de sua morte.  Seu testamento foi escrito por seu irmão Teodoro Carlos da Silva e assinado por ela mesma em casa de sua irmã Carlota Camila da Silva, filha do Coronel Carlos José da Silva em segundo matrimônio com Maria Angélica da Sá Menezes, biografada no item anterior.  Nomeou como sua primeira testamenteira, a própria irmã Carlota Camila da Silva e em segundo seu irmão Teodoro Carlos da Silva e em terceiro seu outro irmão Carlos José da Silva.  No seu testamento deixou 100 mil reis para a Irmandade do Santíssimo Sacramento.  Tinha 1:000$000 (um conto de reis) a render juros com seu irmão o Barão de Pouso Alto, valor este que pediu que fosse destinado ao seu funeral juntamente com 50 missas para ela, 50 para seus pais e mais 50 para as almas de seus parentes.  Do que sobrou deixou para seu sobrinho Francisco, filho de Carlos José da Silva e para os pobres em notas de cinco e dez mil reis.  Tinha como escravos Gabriel, Rafael, Helena Crioula, Miguel Crioulo, Maria Crioula e sua filha, deixados pela sua falecida irmã Maria José Bernardina da Silva. O documento foi lavrado pelo Tabelião Gustavo Pereira da Silva, servindo como testemunhas Heitor José Alves da Trindade e Francisco Olegário dos Santos.

                 Em comentários de pé de pagina, de autoria de Herculano Gomes Mathias no volume 4, página 39 dos Autos da Devassa da Inconfidência Mineira, há um registro do recenseamento de 1804, em Vila Rica, em que aponta Carlos José da Silva como morador do trecho da Rua da Praça até a Antônio Dias, e que ainda estava no exercício do cargo de escrivão e deputado da Junta da Real Fazenda, contava com 63 anos de idade e era casado com Dona Maria Angélica, de 43 anos. Declarou  ter 4 filhas e um filho. Com ele residiam ainda, 3 agregados e 17 escravos. No mesmo volume, porém pagina 38, o próprio Herculano Gomes Mathias, inclui um despacho do Ministro Martinho de Melo e Castro, de 11/02/1790, em que autoriza uma pensão de trezentos mil reis para repartir entre sua mulher e seus nove filhos, sendo seis do sexo feminino e três do sexo masculino, contradizendo o número de filhos do recenseamento de 1804.Como pode-se observar, Dona Rita Leocádia que declarou no seu testamento ser filha do primeiro casamento do Coronel Carlos José, deve ter morrido com mais de 70 anos de idade, já que tendo falecido em 1872, seu pai que faleceu em 1808, conforme comentários nos Autos da Devassa, casou-se com Dona  Maria Angélica antes de 1804 e naquele tempo recomendava-se um luto de alguns anos em respeito à companheira falecida. Como Dona Maria Angélica adquiriu terras em Matosinhos em 1807, portanto antes da morte do Coronel em 1808, pode-se prever que o Coronel Carlos José pode ter passado seu final de vida também em Matosinhos.  O que não foi possível até então foi descobrir os outros filhos do Coronel, já que falaram em 9 filhos, mas até então foram identificados apenas seis; Rita, Teodoro, Carlos José, Maria José, Francisco Teodoro e Carlota.

Fica a pergunta - teria o Coronel Carlos José morado em Matosinhos? Seu falecimento se deu em 1808? Quantos filhos ele realmente teve?

 

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- FESTAS DE MATOSINHOS

            A famosa festa de Matosinhos como era conhecida, dedicada ao Divino Espirito Santo e ao Senhor Bom Jesus de Matosinhos, iniciou-se provavelmente com a inauguração da igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos em 1774, pois, em 1783, ou seja, nove anos após, o Papa Pio VI já autorizava o Breve Pontifício em que dava indulgência plenária aos fiéis que, em um dos três dias de Pentecostes, tendo confessado e comungado, visitasse a igreja de Nosso Senhor Bom Jesus de Matosinhos da cidade de São João del Rei, diocese de Mariana, Minas Gerais.

TRADUÇÃO DO BREVE PONTIFÍCIO

            O Papa Pio VI, certamente sabedor do sucesso do Jubiléu do Divino de Matosinhos, de São João del Rei, não exitou em autorizar o breve Pontifício, em latim, assim traduzido para o português:

                               Da audiência do Santíssimo (o Santo Padre), havia por mim, infra assinado como Secretário da Sagrada Congregação da Propagação da Fé.

                                Dia 6 de abril de 1783, o Santíssimo Senhor Nosso pela Divina Providência Papa Pio VI a todos e a cada um dos Cristãos Fiéis de ambos os sexos que em um dos três dias da Festa de Pentecostes, verdadeiramente contritos, tendo confessado e comungado, devotadamente visitarem a Igreja ou capela pública de Nosso Senhor Jesus Cristo de Matosinhos da cidade de São João del Rei, da Diocese de Mariana, no Brasil, e aí, por algum espaço de tempo, fizeram Pias Preces a Deus em favor da Santa Propagação da Fé, perpetuamente, poderão lucrar, em cada ano, a Indulgência Plenária aplicável também à maneira de sufrágio às almas detidas no Purgatório, assim misericordiosamente concede e aplica.

                               Dado em Roma, da sede da mesma Congregação no dia 7 de abril de 1783.

Stephanus Borgia

Secretário

                        Ora, se o Papa Pio VI concedeu o breve em 1783, é indutivel que a festa e as celebrações já se realizavam há anos atrás. Por isso, é que podemos concluir, que as comemorações ao Bom Jesus de Matosinhos no Brasil, juntamente com o Divino Espírito Santo, era, naquela época, no dia de Pentecostes, como acontece até hoje, em Portugal.

Até o ano de 1924, era das mais animadas das Minas Gerais. Além da programação religiosa, contava com barraquinhas de jogos, quentão (bebida feita com aguardente e ervas), víspora, bingo, argola, com a qual o jogador tentava acertar um determinado objeto, e muitos outros festejos populares, tais como: Dança das Fitas, as Cavalhadas, corridas de touros, músicas e muita diversão no largo de Matosinhos, que era todo iluminado com lampiões e lanternas. Ainda não havia luz elétrica, a festa era durante o dia e à noite. Um coreto era montado no largo, para as corporações musicais, que se revezavam durante os festejos. As festas normalmente eram encerradas com bandas de música e fogos de artifícios.

Temos registros de que as festas de 1882 a 1885 foram as mais animadas, conforme informa o historiador Sebastião Cintra, nas Efemérides de São João Del Rei (1982).

Fazia parte da festa, naquela época, a procissão de Santo Antônio, que partia da igreja de São Francisco para Matosinhos, sendo puxada pelo porta-bandeira Luciano Bonaparte, que se fardava ricamente e enfeitava seu cavalo a caráter. Quando a procissão chegava em Matosinhos, o povo delirava de entusiasmo.

Eram três dias de festas ininterruptos. Tinham cavalhadas (1), bailados, jogo das fitas etc. Os participantes vinham normalmente do Rio Novo e do Pomba. Vestiam deslumbrantes roupas e montavam lindos cavalos, arreados com muito luxo e bom gosto.  No palanque montado especialmente para esta festa, ficavam as autoridades ao lado de um Rei Mouro e de uma linda princesa. Os cavaleiros que conseguiam maior número de pontos, recebiam importantes prendas e eram delirantemente cortejados pelas moças presentes.

                Praticamente toda a população da cidade, participava, mesmo que os mais velhos acompanhassem parcialmente a procissão.

            O jornal “Astro de Minas”, de São João del Rei, nº 1019, relatava o seguinte em 20 de maio de 1834:

                “Os Mesários do Divino Espírito Santo, anunciam que a posse é no dia 1º de junho do corrente ano às três horas da tarde, e que pretendem levar Santo Antônio da Igreja da Venerável Ordem Terceira de São Francisco, para Matosinhos, com a decência possível como é de costume; para isso rogam a todas aquelas pessoas, que se quiserem aprontar de cavalo para acompanhar, o façam àquela hora impreterivelmente”.

                O Confrade do Instituto Histórico e membro da Comissão de Festas do Divino Espírito Santo de Matosinhos, professor kleber Adão, estudando a festa, refere-se a Luciano Bonaparte como um tipo folclórico:

“caboclo reforçado, de proporções hercúleas, mal encarado, sempre vestido de modo extravagante. vinha todos os dias à cidade, montado num ginete bem ensaiado e trazendo aos pés um par de chilenas de prata. dizia-se que era filho único de pai abastado e, que, com a morte deste, tornou-se herdeiro a ½ légua de s. joão del-rei, de vinte e tantos escravos,  mas era mal homem, cita o cronista que escreve no “Arauto de Minas”, em 1878, sob o pseudônimo de “macedônio” . Pior ainda, como senhor de escravos. Acabou por matá-los um a um pela má e porca alimentação, muito serviço e bárbaros castigos. Contudo, o maior prazer de Luciano era ir como alferes porta-bandeiras na procissão de São Jorge, para o que reservava sempre o seu melhor cavalo. A molecada sempre o acompanhava aos aplausos e Luciano voltava para casa cheio de si, depois de ter percorrido as principais ruas da povoação”.

                O jornalista de codinome Macedônio assim escreveu:

“Luciano Bonaparte fardava-se ricamente, calçava botas de Napoleão e cingia reluzente espada de alto preço. montava, então, corpulento e fogoso animal, ajaezado de prata e ornado de fitas de várias cores. carregava com garbo, da igreja de São Francisco até Matosinhos, uma vistosa bandeira, abrindo caminho para a triunfal procissão de Santo Antônio. Grande multidão acompanhava o andor do santo. Todo mundo elogiava o esplendor da montaria e das vestes de Luciano, que se transformava numa das importantes figuras da solenidade”.

                Contra esta procissão se insurgiu um padre são-joanense, insatisfeito com um santo numa liteira em tão longa procissão, “composto de variadas gentes, onde se misturava o povo e os homens bons” (kleber). escreveu ao bispo de mariana, Dom Frei José da Santíssima Trindade, (período março/1820 - setembro/1835),  no sentido de proibí-la. O bispo não aceitou o pedido e justificou ao dito vigário, aprovando a cerimônia, que a devoção do são-joanense era louvável, a exemplo das procissões portuguesas de Nossa Senhora de Nazaré e Nossa Senhora de Arrabádia, e a carioca de Nossa Senhora da Penha, igualmente ou ainda mais extensas. São informações do professor Cintra.

A festa de Matosinhos era tão atrativa e fazia tanto sucesso, que os jornais daquela época, meses antes, começavam a propagá-la. Eis algumas notas:

            “Estas paragens, onde há vastas e bellas chácaras, perpétuo pomar de variados frutos. Que linda garça campeia entre as verduras e a risonha capella do Senhor Bom Jesus de Mattosinhos, para onde afluem romeiros e grande multidão de povos por ocasião das festas do Divino Espirito Santo que celebravam-se com toda a magnificência, renovando-se algumas vezes os costumes antigos de cavalhadas, bailados e corrida de touros” (Arauto de Minas - 1877).

                                O Exmo. Sr. Barão do Carandahy mandou entregar ao Sr. Francisco Tiburcio Dias Carneiro, Procurador da festividade do Espirito Santo, em Mathosinhos, a quantia de 400$000 com que entra para o respectivo festejo, na qualidade de Imperador. (O Arauto de Minas, 04/05/1879, n.9, ano 3).

“Mas que multidão alegre e folgosa é esta que se cruza pressurosa na pitoresca estrada que segue da cidade para Mattosinhos, durante os três dias consagrados as festas do Espírito Santo” (Arauto de Minas de 19/05/1877).

                “Como é belo e festivo o Arraial de Mattosinhos” (Arauto de Minas).

 “Jerônimo Pereira Leite de Carvalho Bastos previne os seus amigos que durante os dias de festa em Matosinhos tem botequim e Hotel, para o que espera a concorrência dos seus amigos.” (Arauto de Minas, 21/05/1881)

“além dos atos religiosos, as festas profanas tende a atrair um sem número de romeiros e devotos que da redondeza e de longe correrão ao vizinho arraial, onde as casas tem subido a 100$000 de aluguel somente por três dias.” [1] (Arauto de Minas, 17/05/1884)

“Em Matosinhos no Botequim “Recreio das Famílias” encontrarão as Exmas Famílias cômodos próprios e decentes onde se servirá com prontidão, aceio e preços razoáveis – jantares, almoços, ceias, cafés, sequilhos, comidas frias, vinhos, finos licores, doces de todas as qualidades.” (Arauto de Minas, 17/05/1884)

                                “O serviço de trens da oeste foi feito com a máxima regularidade, a despeito do grande número de passageiros que atingiram só no primeiro dia a elevada quantia de quatro mil, e o dobro seguramente para lá se dirigiram à pé” (Jornal “O Dia” de 28/05/1912).

                                “Para abrigar os romeiros que superpovoavam o bairro, erguiam-se barracas, casinholas, ranchos de capim e coberturas toscas, pois muitos mudavam provisoriamente para Matosinhos, para melhor participarem dos dias de festas, com isso os alugueis de casas e hospedagens subiam de preço. O Arraial de Mattosinhos no subúrbio da cidade é dotado de óptima capella, na qual se festeja o Espírito Santo, havendo nos dias de festa, romaria de dia e de noite” (Autor desconhecido).

                                “Da boa ordem na festa, devemos algo à administração da estrada de ferro, pelo modo correcto e prático com que resolve normalmente o embarque e desembarque dos romeiros. Neste anno, de preferência, notamos que além da boa ordem no serviço e fineza dos empregados. Os 42 (quarenta e dois) trens, que correram em cada dia, correspondiam optimamente a frequência e exigência dos passageiros, sem atropêlo e sem prejuizo de material. E não é pouco em se tratando de consultar interesses e opiniões de cerca de 11.000 passageiros”.(Jornal “Ação Social”, de 03/06/1917).

Kleber Adão do Sacramento também pesquisou muito os jornais da época para publicar ???? Nele podemos perceber que a vila de São João del Rei, esvaziava-se nestes dias e parte da população (aqueles que possuíam chácaras e casas) para lá se mudava. O que preocupava nesse período de festas era a gatunagem que se instalava na cidade. O jornal Ação Social, no ano de 1916, publica uma coluna intitulada “Olhos Abertos!” Chama a atenção para aqueles que vão ao arraial de Matosinhos, não deixarem as suas casas desguarnecidas, pois corre o boato de que formou-se na cidade uma quadrilha de gatunos. Sobretudo, cita a nota,

(...) nestes dias de festa de Matosinhos em que as ruas ficam desertas e as casas no desamparo. Nada de jóias, nem de valores em dinheiro expostos aos dedos rápidos e amestrados dos batedores de carteira profissionais (...) o direito não favorece aos que cochilam. (Jornal Ação Social, 11/06/1916)

O acesso ao Bairro de Mattosinhos se fazia primitivamente pela tricentenária rua do Matola e, com a implantação da ferrovia Oeste de Minas, a condução das pessoas foi facilitada.

            As festas iniciavam-se no domingo do Espírito Santo e terminavam na terça-feira, tradição que perdura até hoje na cidade de Matosinhos de Portugal, as quais são denominadas de “Romaria ao Senhor de Matosinhos”. Aqui, no Brasil, não se sabe porque, o Senhor Bom Jesus de Matosinhos é comemorado no mês de setembro e não no dia de Pentecostes, conforme em Portugal.

          Segundo o odontólogo, pesquisador e participante ativo da festa, na atualidade, Ulisses Passarelli, afirma, que até meados de 1930, ambos os festejos corriam juntos nos meses de maio/junho. Posteriormente, a época dedicada à devoção ao Bom Jesus de Matosinhos, passa a ser comemorada em setembro.

A alteração da data e a supressão da Festa do Divino, com seus componentes profanos, acontece após 1924. Os registros indicam que a origem da devoção na região de São João del Rei, deve-se à figura do Bom Jesus, do qual também origina-se a capela. A esta devoção portuguesa, pode ser também atribuído o espírito de romaria que a festa carrearia. Ulisses Passarelli prossegue, dizendo que a origem da festa do Divino Espírito Santo, propriamente dita, é atribuída à Rainha Isabel (1271-1336). Ao convidar os pobres da Casa Real, ela iniciava em seu palácio de Cintra, votos de Pentecostes, em proveito dos pobres. Essa afirmativa é acrescida de uma lenda, segundo a qual, as folias tiveram origem na Vila de Alenquer, sendo seus fundadores Isabel e seu marido. Regulamentado pelo código Afonsino, que a excluía das defesas, a festa do Divino foi regulada por D. João III e reflete, no meio popular, o esplendor e o sentido das sagradas investiduras reais, através da coroa, do cetro e da bandeira do Império.

            Outro fato que prova que as comemorações em honra ao Senhor de Matosinhos se dava em Pentecostes (maio/junho) está nas observações de pé da página 110, do volume I, dos Autos da Devassa da Inconfidência Mineira, onde temos que, o Coronel Inácio Correia Pamplona encontrava-se em Congonhas do Campo, para a festa do Jubiléu do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, no dia 03 de maio de 1789.

            Além dos diversos eventos festivos que compunham a festa, a parte religiosa, que era o objetivo primordial, tinham outros tantos, tais como: novenas, missa solene, sermões e procissões.

            O anúncio solene acontecia no sábado que antecedia a festa. A banda de música percorria as principais ruas de São João del Rei, anunciando com sua fanfarra o início dos festejos do Divino Espírito Santo, terminando no largo de Matosinhos.

            Para promoverem a festa, escolhia-se a cada ano o “Imperador do Divino”. Era ele quem assumia o papel de festeiro. Muitos deles se tornaram famosos, como o Sr. Tomaz Antônio Gonçalves, que foi Imperador do Divino Espírito Santo no ano de 1868. O jornal Arauto de Minas, de 08/06/1878, nº 13, ano 2, registra e confirma que a festa do Divino Espírito Santo e do Senhor Bom Jesus conviviam na mesma época:

                “No Arraial de Mathosinhos se celebrão nos dias 9, 10 e 11 de junho, as festividades do Divino Espirito Santo, do Senhor Bom Jesus de Mathosinhos e Nossa Senhora da Conceição da Lapa. O grifo é nosso, para confirmar, que antigamente se celebrava conjuntamente o Divino Espírito Santo e o Senhor Bom Jesus.

                Sabbado, (8 de junho), serão repartidas no Largo do Carmo [centro de São João del Rei], ao meio dia, esmolas aos pobres, promovidas pelo Procurador Manoel Rodrigues Moreira. À noite, a banda de muzica do intelligente maestro Martiniano Ribeiro Bastos, percorrendo as principaes ruas da cidade, irá terminar a grande serenata no Arraial de Mathosinhos.

                Domingo, (9 de junho), às 10 horas e meia, se celebrará na Capella de Mathosinhos missa cantada, repartindo-se os pães bentos e verônicas do Espirito Santo. Se effectuará à tarde, a eleição dos novos mesários por meio de sorteio, seguindo-se sermão pelo distincto orador Dr. Luiz Pereira Gonçalvez de Araújo, depois do qual será cantado Te-Deum.

                À noite será queimado um bem ordenado fogo de vistas pelo habil fogueteiro snr. Martinho de Barros, executando a banda de muzica as mais escolhidas peças”.

São João d’El-Rei, 1 de Junho de 1878

O Procurador da Festa: Domingos Augusto da Assumpção

                Nota-se que a programação deu ênfase somente para os dias 8 e 9 de junho, sábado e domingo. Normalmente, na segunda feira, homenageava-se o Senhor Bom Jesus de Matosinhos, e, na terça-feira, Nossa Senhora da Conceição da Lapa, aparentando serem figuras secundárias, nas famosas festas de Matosinhos.

                Havia também nas festas de Matosinhos o imperador perpétuo, que era “Santo Antônio”, eleito pelo povo e comerciantes da cidade, Imperador perpétuo da festa do Divino Espírito Santo. A imagem de Santo Antônio saia da igreja de São Francisco para Matosinhos, numa liteira ricamente adornada, amparada por um sacerdote revestido de estola e pluvial, seguida de pomposo acompanhamento.

            Outra observação importantíssima que podemos fazer da festa, contida nos jornais daquela época, sob o aspécto de devoção é a ênfase que se dava ao Divino Espírito Santo. O Arauto de Minas, nº 18, ano 4, 15/07/1880, dava esta ênfase já no título da programação e outro detalhe interessante é que neste ano a festa foi adiada para 18, 19 e 20 do mês de Julho:

PROGRAMMA DA FESTA DO ESPÍRITO SANTO DE 1880

                “Dia 17 de julho, ao meio dia, serão repartidas esmolas aos pobres, e À noite haverá passeata de musica que percorrerá as ruas desta cidade e o Arraial de Mathosinhos.

                Dia 18, haverá missa ás 6 horas na Capella de Mathosinhos por intenção das pessoas que concorrerão com esmolas para os pobres; às 11 horas depois da homilia do Rvd. Parocho entrará a Missa Solemne e distribuir-se-ha pelo povo veronicas e pães bentos. Às 4 horas terá lugar o sorteio do novo Imperador e mais mezarios, seguindo-se sermão que será pregado pelo Revdm. Vigario Antonio José da Costa Machado e Te-Deum.

                Ao anoitecer haverá visitação na Egreja e no largo fogo de artificio preparado pelo habil artista Martinho Jose de Barros Lima, executando nessa occasião a banda de musica, regida pelo distincto professor Martiniano Ribeiro Bastos, lindas e variadas peças em corêto brilhantemente illuminado e armado na porta da Egreja.

                Ao Bom Jesus de Mathosinhos e Nossa Senhora da Conceiçã da Lapa - Dia 19 e 20.

                Haverá missa resada, sermão à tarde pelo Revdm. Vigário Costa Machado e Te-Deum, à noute algum fogo, bem como no mesmo coreto ainda ornado e illuminado nos fará ouvir fortes e bellos sons harmoniosa banda dirigida pelo distinto e intelligente professor Carlos José Alves”.

O Procurador da Festa: Paulo Augusto de Magalhães.

                O explorador e diplomata inglês Richard Francis Burton (1821 – 1890), em sua obra: Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho (1867), engana-se duas vezes com relação a Matosinhos, primeiro ao determinar que a igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos ficava localizada na cidade de Barroso (MG) e também se enganou ao denominar a igreja de Matosinhos como igreja do Espírito Santo. Assim se manisfetou em 1868:

Aos nossos pés, sobre um pequeno vale jaz o arraial de matozinhos, encantador subúrbio, distante da cidade uma milha e três quartos ou mais exatamente oitocentas braças brasileiras. Passamos pela clara rua principal e entramos na praça mais importante formada pelas melhores casas, cada qual com o seu jardim florido, adornado de alguns pés de café de um tamanho prodigioso e de exuberante verdura. Não há padre, mas a igreja do espírito santo (sic) parecia, pelo menos por fora, em boa ordem. Aqui de toda a região convergem os romeiros durante sua festa pelo prazer espiritual de rezar durante noite e dia.

            Detalhe interessante era a preocupação que se dava para a divulgação da festa. Os organizadores tiravam o dia anterior para fazer importante promoção da mesma e não consideravam este dia como inserido na festa. O Arauto de Minas, nº 13, ano 5, 04/06/1881, comprova isso, como comprova também que a homenagem ao Senhor Bom Jesus era sempre na 2ª feira:

“Amanhã no poetico arraial de Mattosinhos começam os festejos do Divino Espirito Santo, havendo como de costume trez dias de festas.

                Sabbado (4 de maio), à noute, percorrerá as ruas desta cidade a banda de musica do professor Martiniano Ribeiro Bastos, terminando a passeiata no Arraial de Mathosinhos.

                Domingo - Missa cantada com destribuição de pães bentos, sorteio dos novos mesarios à tarde, em seguida Te-Deum. À noute se queimarão fogos artificiaes, tocando a musica variadas peças em coreto, havendo caprichosa illuminação.

                Segunda Feira - Festa do Senhor Bom Jesus - Missa com musica, destribuindo-se veronicas bentas (1) à tarde, Te Deum e sermão pelo Juiz da Festa Revdm. dr. Joaquim M. da Rocha Pinto. À noute a banda de musica regida pelo professor Carlos José Alves executará no coreto escolhidas peças, queimando-se fogos de cores.

                Terça Feira - Festa de Nossa Senhora da Conceição da Lapa - Missa com musica, destribuição de veronicas bentas. Te Deum á tarde. Á noute fogos, esplendida illuminação e musica no coreto, regendo a orchestra o professor Carlos J. Alves”.

                Os Procuradores: Francisco de Souza Pereira, Bernardo José Carneiro, Manoel Ancelmo e A. de Oliveira.

(1) Gênero de plantas herbáceas e arbustivas da família das escrofulariáceas, dotadas de pequeninas flores alvas, róseas, azuis, ou purpúreas (Aurélio Buarque de Holanda). 

            Na festa de 1915, o Jornal A Tribuna de  São João del-Rei, de 30/05/1915, registra  a utilização do famoso Pavilhão de Exposições de Matosinhos, novinho em folha, como restaurante e como teatro de fantoches. Registra também a utilização do cinema, pela primeira vez, na festa, e mais uma vez observa-se o grande moral, que gozava um diretor da Ferrovia Oeste de Minas:

“Correram animadíssimas as festas de Mattosinhos, este anno.

                A concorrencia foi enorme e grande o numero de barracas, tendo sido também aproveitado o Pavilhão do Bicentenário, onde funcionaram a Confeitaria Faleiro e os Fantoches do mestre Isaias.

                As solemnidades na egreja tiveram grande realce e aflluencia de fieis, tocando a excellente orchestra Ribeiro Bastos.

                No domingo, durante o dia, houve no Athletic Club, uma animada festa sportiva, dedicada ao dr. Agostinho Porto, director da Oeste, a qual teve numerosa concorrência

                À noite, no seu coreto próprio, tocou a popular banda Ribeiro Bastos, sob a regência do seu regente sr. José Borges.

                A praça estava illuminada e enfeitada.

                No ultimo dia houve no Pavilhão, promovido pelo sr. Durval Lacerda, um baile, que, infelizmente, não sabemos porque, correu desanimado, com pouca concorrência, devido, talvez, ao cansaço das moças com as festas.

                A festa de Mattosinhos, infelizmente, vai perdendo aquella encantadora feição burgueza de que out’rora se revestia e que tanto poesia lhe dava. Este anno notamos-lhe, com pezar, certo ar aristocratico. [o jornalista parece querer dizer que a classe mais favorecida de São João, deixava de participar em massa da festa, para dar lugar a pequenos grupos, isolados, talvez, de moradores de fora].

                Achamos também que o cinema, escurecendo grande extensão do largo, entristeceu muito os festejos, causando má impressão a todos. É digna de elogios a administração da Oeste, pelo modo correcto com que correram os trens sem o menor facto desagradável a se registrar”.

            A participação da burquezia de São João del Rei, na festa de Matosinhos, era notória, a ponto dos jornais divulgarem propagandas de lojas localizadas no centro da cidade, com relação à venda de produtos para a festa, principalmente de roupas, já que os meses de maio e junho são frios. Num deles, o jornal “A Pátria Mineira, nº 201, ano 4, de 11/05/1893, cujas oficinas ficavam na atual rua Sebastião Sette, nome dado em homenagem ao fundador, diretor e redator do jornal, biografado na parte “Moradores Históricos de Matosinhos”, mostrava a seguinte propaganda:

Annuncios p/ as Festas de Mattosinhos

Ricos palitots bordados para senhoras, de 20$ a 40$, Capas de lã para criança, de 7$ a 12$, Chales de lã, algodão e casemira, Ricos tapetes para sala, Ricos bordados, Grande quantidade de meias para senhoras e crianças

Preço sem competencia!

Isto só se encontra em casa de CARDOSO & COMP. - PRAÇA DO ROSÁRIO

            Até mesmo circos eram instalados na festa, como o circo do Sr. Perry. O jornal São João D’el-Rey, N.18, de 20/05/1899 noticiava o seguinte: 

                “A companhia dirigida pelos snrs. Dario & Pinho, tem dado funcções repitidas e muito animadas. Já foram exhibidos a onça e o leão. Consta-nos que serão expostos em mattosinhos, durante as festas do Espirito Santo esses animaes. É occasião do público apreciar uma cousa aqui nunca vista”.

                O Botânico Francês, Augusto de Saint-Hilaire (1779 – 1853), em 1819, assim se expressou:

“A cerca de meia légua [três quilômetros] de marçal [Colônia do Marçal] chega-se ao arraial chamado Porto Real, onde se encontra o Rio das Mortes, que empresta seu nome à comarca (...) em Porto Real atravessa-se esse rio por uma ponte de madeira, de aspecto assaz pitoresco, com largura bastante apenas para um carro-de-bois, e que é abrigada como as da suiça, por um pequeno telhado de telhas ocas sustentada por postes. (...) tendo atravessado o Porto Real, cheguei logo à aldeia de Bom Jesus de Matosinhos, onde se celebram de modo especial as Festas de Pentecostes”.

                O desenhista alemão, João Maurício Rugendas (1802 – 1858), presente nesta cidade em 1824 relatou:

“Nas imediações de São João existe uma aldeia muito agradável: o arraial de matosinhos. sua bela situação e a vizinhança do rio das mortes, já navegável por grandes canoas, permitem prever um futuro mais próspero que o das cidades vizinhas...

ACONTECEU NA FESTA

            Certo Vigário de São João del Rei quis acabar com o piedoso costume e fez reclamações ao Bispo de Mariana, Dom Frei José da S. Trindade (Bispo de 1820 a 1835) que foi contra a festa, conforme informou o Cônego Raimundo Trindade:

            Carlos de Laet, quando esteve em São João del Rei em 1896 disse que: “O isolamento de Mattosinhos se compensa nas festas do Espirito Santo, quando para lá se dirigem alegres romarias”.

            Mas ao lado dos devotos e dos que procuravam apenas diversões, surgiam os que exerciam as mais variada comercializações. Parece que a jogatina no Pavilhão de Mattosinhos (Jaburu e Roleta) determinou em 1924 a supressão da festa. A imprensa local, tendo à frente o poeta Bento Ernesto Junior, protestou contra a drástica resolução do Exmo. Sr. Bispo de Mariana Dom Helvécio. E durante oito anos não se realizaram as animadas festas e somente a 15 de maio de 1932 recomeçaram as festas do Divino Espirito Santo, mas com simples programação, sem jogatinas, as quais seguiram neste ritmo  até 1998.

OUTROS DETALHES DE PESQUISA

            Na atual imagem do Divino Espirito Santo, assim está escrito:

“Feita nesta cidade de São João del Rei em maio de 1868, por Manoel Pereira Maya, natural de Piracatu, por mandado do Imperador do Espirito Santo, Tomaz. 

 Ass. Maya.

            O nome todo do Imperador Tomaz era, Tomaz Antônio Gonçalves. Curiosamente, Tomaz, naquele ano, mandou encarnar (concertar) a Imagem do Senhor Bom Jesus de Matosinhos. Pretendia levá-la em procissão, depois de benta, da Igreja de São Francisco, para a capela de sua casa, no dia 30/05/1868. Para tanto, oficiou à Venerável Ordem Terceira de São Francisco pedindo “a coadjuvação (auxílio) de vossa corporação, a fim de que este ato se torne mais respeitável”. Deliberou a mesa responder que conquanto desejasse concorrer com o seu contingente para o Esplendor do Culto Católico -“Todavia muito lhe pesa não poder comprazer com os desejos de devoto Festeiro do Divino Espirito Santo”. Argumentava a Ordem na resposta que sendo a bênção da imagem uma atribuição paroquial, deveria ser feita na Igreja Matriz ou na Capela de Matosinhos. Arremata com franqueza: “A mesa não julga decente sair esta Corporação por tão maus caminhos”.  (Efemérides de São João del Rei - Sebastião de Oliveira Cintra).

            Assim Escreveu um dos participantes da Festa do Divino Espirito Santo de Matosinhos (Jornal “O Dia”, de maio de 1912)

                                “Quando eu era bem criança, antes da locomotiva [1881] atroando os ecos do Lenheiro vi despertar nosso torrão apontando-lhe a senda do progresso. Costumava passar um ou dois meses por anno em Mattosinhos, por occasião das festas do nosso Senhor Bom Jesus de Mattosinhos. Nesse tempo ia-se pelo Matola [nesta época não havia Rua Antônio Rocha], passava-se perto do Matadouro Velho, em plena capoeira, fazia-se escalla na Dona Rita da praia, uma boa velhinha que morava num sobrado a meio do caminho e assentava-se um bocado num paredão da ponte da Água Limpa [Ponte do Beltrão], antes de penetrar no arraial. Chegando, a maior preocupação era ir à procura das laranjas e dos limões que se obtinham, por dez reis de mel coado, em muitas das bellas chácaras d`aquela abençoada terra.

                                O melhor do nosso dia era porém ir à chácara da Dona Carlota, comprar favos de mel. [O Autor refere-se à Dona Carlota Camila da Silva, filha do segundo matrimônio do Coronel Carlos José da Silva com Maria Angélica de Sá Menezes e irmã  do Barão do Pouso Alto]. Em compesação obtinhamos licença para uma devassa em regra nos magníficos morangos que bordavam os canteiros bem cuidados.

                                Depois, vinham os dias de festas, o preparo previdente das barraquinhas de bambu e pita, a animação do largo da igreja, se povoando do dia para noite. As casas subiam de preço, e não havia burguês que se prezasse que não tivesse tomado em tempo a rua, pois se era a nossa Petrópolis.

                                Aberta a igreja para o recebimento das offerendas e para a contemplação dos milagres, nós pressurosos, iamos nos quedar (ficar) boquiabertos ante às coisas espantosas realizadas em nome do Senhor Bom Jesus de Mattosinhos. Aqui era um cavalleiro, cuja montaria, tomada do diabo, saltara por cima de um abysmo e o homem se salvara de uma morte certa, invocando, no momento supremo, o nome milagroso; mais adiante era uma senhora muito temente a Deus e que esgotados os recursos da ciência e desanimada pela paralysia completa que a prostrava no leito - resolvera-se vir de longe implorar o milagre - e o milagre se dera. Lá estavam e certo estão ainda na Sachristia, os senquascerrados de quadros, com suas pinturas ingenuamente rudes e os membros em cêra, contando todas as boas acções do milagroso padroeiro.

                                Com que gosto eu subia à torre para assistir aos repiques do Heitor.

                                Era infalível também a passeata do pessoal festeiro, de charanga à frente, até a casa do Imperador do Divino. Já se sabe, o grupo era numeroso....

                                De uma feita foi meu avô o dito Imperador e eu bem me lembro que fiquei atordoado com a algazarra d`aquella gente toda entrando pela nossa casa aos gritos de “Viva o Coronel Imperador”!!! E toque música!!! E o Imperador Coronel mandou logo uma creoula correr às pressas, à dispensa e trazer de lá algumas dúzias de garrafas de bebidas....

                Bons tempos! sobretudo porque representavam para nós o que nunca mais há de voltar... a quadra da descuidosa e feliz da meninice. Agora é recordá-la saudosa, revivê-la nos filhos e mais tarde nos netos, se a vida chegar até a estes....”.

“Assinado: Salusto - Jornal O DIA, maio/1912.

A FOLIA DO DIVINO

            É comum o Alferes da bandeira com estandarte do Divino, formando o coro da festança, ir de porta em porta, pedindo dinheiro e cantando, assim:

Dai esmola ao Divino
Com prazer e alegria
Pensando que esta bandeira
É da vossa freguesia
O Divino é muito rico
Tem brasões e tem riquezas
Mas quer fazer a sua festa
Com esmola da pobreza
Divino Espírito Santo
Divino e celestial
Na terra mansa pombinha
No céu pessoa real
Oh! Senhor dono da casa
Tome lá esta bandeira
Faça o favor de entregá-la
A quem tem por companheira
Obrigado, minha gente
Com toda sua folia
Viva a dona desta casa
Viva toda companhia
Rua abaixo, rua acima
É rua de canto a canto
Rua que por ela passa
O Divino Espírito Santo
 (Luiz Edmundo)

O RESGATE DA FAMOSA FESTA

            Nos primórdios do ano de 1998, um grupo de pessoas liderado pelo artista sacro Osni Geraldo de Paiva e Padre José Raimundo da Costa, pároco da Matriz do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, em São João del Rei (MG), idealizaram o resgate da Festa do Divino Espírito Santo de Matosinhos, Jubiléu este autorizado pelo Papa Pio VI, no ano de 1783.

                Assim sendo, a Festa do Divino de Matosinhos teve seu resgate no pentecostes de 1998, tendo como dia maior, o dia 31 de maio.

                As reuniões para o resgate da festa se revesavam, ora na casa do Osni, ora na minha casa (do José Cláudio). Estabelecemos a programação e elegemos como primeiro Imperador da festa o folclorista e odontólogo, Dr. Ulisses Passarelli, que foi um baluarte na programação cultural, folclórica e até pitoresca, além da sua ligação com os grupos folclóricos da nossa região.

                Altivo Berg e Nelson Abreu construíram  um coreto de madeira e uma liteira para o transporte do Santo Antônio, tudo nos moldes antigos. Outras pessoas se juntaram ao grupo dando valiosa contribuição, como é o caso do também folclórico Luthéro Castorino, conhecedor de várias linhas de congado, seus rituais, suas músicas, as quais o mesmo acompanhava com sua velha sanfona. Cida Salles, Antônio Carlos Garcia e José Antônio de Ávila Sacramento, este último, presidente do Instituto Histórico e Geográfico de São João del Rei, na época, deram importante apoio na parte burocrática, acompanhamento e  execução de peças indispensáveis, como figurino, bandeiras, coroa, mastro, insígnias de prata etc. Aliás, na verdade, o grupo trabalhou unido, sempre uns ajudando aos outros.

                A programação básica para o resgate da festa foi a seguinte:

-          Seis dias antes do tríduo preparatório realizam-se reflexões nas comunidades do bairro, sempre levando em consideração os temas evangélicos ditados pela Igreja Católica Apostólica Romana e no domingo que antecedeu o tríduo aconteceu a cavalgada do Divino, anunciando a festa em toda a cidade.

-          Nos três dias principais de celebração (tríduo), a programação em ordem sequencial constou de:

a)       Primeiro dia, sexta-feira, 29/05: - Missa as 19:00 horas e logo após novena e retreta com banda de música e shows;

b)       Segundo dia, sábado, 30/05: cavalgada a partir de 10 horas e à noite retreta com a Banda de música do 11RIMth de São João del Rei, levantamento do Mastro do Divino e encontro de Folias do Divino e Leilão de Prendas;

c)       Terceiro dia e dia maior, domingo, 31/05: - Alvorada festiva as 6:00 horas, missa festiva as 7:00, chegada dos Congados e levantamento de seus mastros as 8:00, missa das crianças às 9:30, dança das fitas às 10:30, apresentação das pastorinhas às 10:45, chegada dos reis e rainhas às 11:15, saída do cortejo imperial para buscar os imperadores às 13:00, retreta no coreto às 14:00, missa solene e coroação do novo imperador às 16:00, procissão do Divino Espírito Santo às 18:00, despedida dos Congados e descida dos mastros às 19:30, retreta de encerramento às 20:30 e foguetório de encerramento às 21:00

                Ocorreram com absoluto brilhantismo as Festas do Divino de 1998 e 1999, período crítico para o sucesso do resgate.

                O tríduo preparatório da festa de 1999 aconteceu nos dias 21 a 23 de maio.

                A procissão do Imperador Perpétuo, realizada na véspera de Pentecostes, que não aconteceu em 1998, em 1999 aconteceu da forma esperada, ou seja; como foi o primeiro ano do retorno, o número de participantes que saíram da Igreja de São Francisco de Assis foi razoável, em torno de 200 pessoas, tendo a frente o Alferes da Bandeira, Josino Inácio do Nascimento (Jota açougueiro), empunhando a Bandeira do Divino, guarnecida pelo Cavaleiro do Divino, Damião Guimarães. A procissão foi composta de duas filas de fiéis, no meio do cortejo uma liteira ricamente adornada transportava o Imperador Perpétuo da festa, Santo Antônio, outrora nomeado pelos comerciantes da nossa cidade. Aliás, este é um aspecto interessante, pois é a única Festa do Divino de que temos notícias que possui um imperador perpétuo.

                Prosseguindo, a procissão passou defronte a igreja de São Gonçalo Garcia, onde o Alferes da Bandeira inclinou-se, cumprimentando e submetendo-se em deferência ao Santo e ao seu magnífico templo. O mesmo aconteceu defronte ao 11ºRIMth. Subindo a Rua do Matola a procissão foi dar-se na Gruta do Divino (final da Rua Antônio Rocha), onde fincou-se um mastro e encontrou-se com o Imperador móvel, Ulisses Passarelli, acompanhado por personagens vestidas com roupas típicas da época. Neste momento a Banda Santa Cecília de São João del Rei, que acompanhou a procissão desde sua saída da Igreja de São Francisco entregou o acompanhamento musical para a Folia do Divino, do bairro Guarda-Mor e Congado do Bairro São Dimas, que acompanharam a procissão até sua chegada na Igreja Matriz do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, parando antes na capela de  Santa Clara, onde foi fincado um mastro e depositada a liteira com o Santo Antônio, a qual seria apanhada no dia seguinte, quando do Cortejo Imperial.

                Após a chegada da procissão do Imperador Perpétuo, houve missa com o encerramento da novena, e logo após, ocorreu o  levantamento do mastro do Divino, o principal e o maior deles, no adro da igreja. Este, ficou aguardando para o dia seguinte, o fincamento dos mastros dos demais ternos de Congada. A noite houve encontro de várias Folias do Divino.

                No dia 23 de maio, tido como o dia maior, as comemorações iniciaram-se com alvorada festiva as seis horas da manhã, missa festiva as sete horas, sendo que em seguida foram chegando de ônibus particulares os vários grupos de Congada, que tocaram, cantaram e dançaram o dia todo. Foram os seguintes: - Nª Sª do Rosário de São João del Rei, do tipo Catupé, Nª Sª do Rosário de Cel. Xavier Chaves, do tipo Catupé, Nª Sª do Rosário de Ribeirão de Santo Antônio, em Resende Costa, do tipo Catupé, Nª Sª do Rosário de Barroso, do tipo Catupé e Moçambique Bate Paus, Nª Sª do Rosário do Caburú, do tipo Congo, Nª Sª do Rosário do Rio das Mortes, do tipo Congo, Santa Efigênia de Conselheiro Lafaiete, do tipo Marujo, Santa Efigênia de Barbacena, do tipo Marujo, Nª Sª Aparecida de Passa Tempo, do tipo Moçambique.

                Após a Missa das Crianças às 09:30 horas, aconteceu a Dança das Fitas, do SESI e apresentação das Pastorinhas, de Tiradentes.

                Às 14:00 horas teve início o Cortejo Imperial, que partiu da Gruta do Divino, onde o Imperador foi acompanhado por todos os grupos de Congado, Banda Musical de Barroso, imagem de Nª Sª do Rosário num andor, personagens típicas, pequenos dragões e pequena multidão, que pararam na capela de Santa Clara para apanhar a liteira e o Santo Antônio, oportunidade que o imperador Ulisses Passarelli juntou-se ao Imperador Eleito para o ano 2000, Luthéro Castorino, e, os dois, escoltados e debaixo de uma umbela vermelha e branca, seguiram pela antiga rua Bernardo Guimarães.

                Nesta rua, que era a principal de Matosinhos naquele tempo, seus moradores a enfeitaram de forma brilhante, com bandeirolas e desenhos do Divino no chão. Quando o cortejo passou, o povo aplaudiu delirantemente todo o conjunto, jogou-se pétalas de rosas que brilhavam sob a luz solar, as quais se depositavam na rica liteira, no Imperador eleito e no Imperador anterior, os quais estavam trajados de terno e gravata.

                Após a passagem pela rua Bernardo Guimarães, o cortejo foi se dar na Praça do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, onde outra multidão o aguardava. O cortejo adentrou-se pela matriz de Matosinhos, onde realizou-se, missa solene cantada, ministrada pelos padres: Pároco José Raimundo, Monsenhor Juvenal e Pe. Nélio, acompanhados pela bicentenária Orquestra Lira Sãojoanense. Ao terminar a missa, houve transferência da coroa para o Imperador Eleito, então coroado pelo pároco. Seguiu-se esplendorosa procissão luminosa pelas ruas de Matosinhos, levando Santo Antônio, Nª Sª do Rosário e um grande aparato transportando o Divino Espírito Santo, tendo na retaguarda a brilhante Banda do 11ºRIMth.

A festa encerrou-se com grande espetáculo pirotécnico e retreta com a banda Lira Imaculada Conceição, de São Tiago.

                Conforme pesquisa de Ulisses Passarelli, a Festa do Divino teve origem em Portugal. Conta-se que a Rainha Santa Isabel, casada com Dom Diniz, teria sonhado com um pedido de Deus para que ela construísse uma igreja em honra ao Espírito Santo em Alenquer, Portugal. Corria o século XIV. Milagrosamente, no local, o alicerce apareceu pronto. Os operários ganharam rosas, que se transformaram em moedas, por pagamento.

                A devoção se propagou e popularizou rapidamente. Os portugueses a trouxeram para o Brasil, ainda na primeira centúria da colonização. De seu prestígio em nosso país, lembra Câmara Cascudo em seu Dicionário do Folclore Brasileiro, que Dom Pedro I recebeu o título de Imperador do Brasil por sugestão do Ministro José Bonifácio, porque o povo estava mais habituado a aclamar o Imperador do Divino que o nome do rei (ver também in “As Barbas do Imperador, de Lilia Moritz).

                A geografia da festa do Divino tornou-se ampla no Brasil. Em Minas, é festa animada no Norte do Estado, Montes Claros, Diamantina, Serro, Viçosa, Dionísio, Brejo do Amparo, Santa Luzia, Sabará e em vários outros locais. Na região das vertentes, somente em São João del Rei, acontece esta festa.

                É importante salientar que a presença da Folia do Divino nem sempre indica a existência de Festa do Divino, já que em muitos lugares há esta folia sem festas.

                A seguir, a programação da festa do ano de 1999:

DATA

HORA

EVENTO

LOCAL

14 a 19

19:00

Novena - Reflexões nas Comunidades

Comunidades da Paróquia

20

20:00

Retreta com a Banda de Música Lira do Oriente do Rio das Mortes

Praça de Matosinhos

21

20:00

Apresentação do Grupo Raízes do Bairro São Geraldo

Praça de Matosinhos

22

17:00

Procissão do Imperador Perpétuo com a Banda Santa Cecília de São João del Rei

Igreja São Francisco de Assis

22

20:00

Levantamento do Mastro do Divino

Praça de Matosinhos

22

20:30

Encontro de Folias do Divino e Leilão de Prendas

Praça de Matosinhos

23

06:00

Alvorada Festiva - Fogos e repique de sinos

Bairro de Matosinhos

23

07:00

Missa Festiva

Igreja B. Jesus de Matosinhos

23

08:00

Chegada dos Congados e levantamento de seus mastros

Praça de Matosinhos

23

09:30

Missa das Crianças

Igreja B. Jesus de Matosinhos

23

10:30

Dança das Fitas do SESI

Praça de Matosinhos

23

10:45

Apresentação das Pastorinhas do Rio das Mortes

Praça de Matosinhos

23

11:15

Chegada dos Reis e Rainhas

Praça de Matosinhos

23

13:00

Saída do Cortejo Imperial para buscar os Imperadores com Banda de Música de Barroso

Praça de Matosinhos

23

16:00

Missa solene e coroação do novo Imperador com a Orquestra Lira Sãojoanense

Igreja B. Jesus de Matosinhos

23

18:00

Procissão do Divino Espírito Santo com a Banda de Música do 11º BIMTh

Praça de Matosinhos

23

19:30

Despedida dos Congados e descida dos mastros

Praça de Matosinhos

23

20:30

Retreta de encerramento com a Banda de Música Lira Imaculada, de São Tiago

Praça de Matosinhos

23

21:00

Foguetório de encerramento

Praça de Matosinhos

                A programação da festa do ano de 2002 foi praticamente baseada na de 1999, com alguns acréscimos, tais como: - inclusão do mastro de Santo Antônio (Imperador Perpétuo) ao lado do mastro do Divino, rasoura após a missa de 5ª feira e logo após show musical. Missa inculturada afro na sexta-feira, encontro de bandeiras do Divino e logo após serenata, no sábado, e, mega show musical no encerramento da festa.

                Ulisses passarelli, Imperador do Divino de 1998 e 1999, descreveu assim, os elementos e símbolos da Festa do Divino:

ª     IMPERADOR - título dado ao festeiro principal do Divino Espírito Santo, que recebe as Insígnias do Divino. Este cargo é herança portuguesa em nossa festa. O Imperador o assume por um ano, iniciando o mandato no Domingo de Pentecostes, quando é coroado pelo Padre, recebendo a função do Imperador anterior;

ª     INSÍGNAS DO DIVINO - são três objetos que simbolizam a autorização dada a um festeiro para realizar a festa. Seu uso é exclusivo do Imperador. Nas insígnias sempre há uma pombinha artificial simbolizando o Divino, cetro, salva e coroa;

ª     SALVA - espécie de bandeja com vários detalhes decorativos e uma base de sustentação. Sobre ela deposita-se a coroa e o cetro quando estão fora de uso;

ª     IMPÉRIO DO DIVINO - espécie de casa, barraca ou capelinha armada por ocasião da festa, em cujo interior há um altar onde se expõe ao público a imagem do Divino Espírito Santo e suas insígnias. A sua montagem e guarda é função do Imperador, ou de um Zelador, por ele designado;

ª     IMPERADOR PERPÉTUO - ao que saibamos, São João del-Rei é a única cidade do Brasil a ter um Imperador Perpétuo, ou seja, que não perde o seu posto com a chegada do novo Domingo de Pentecostes. Os comerciantes sãojoanenses escolheram Santo Antônio. Assim, coadjuvando o Divino Espírito Santo, a imagem participa das procissões em uma liteira ricamente adornada. A notícia mais antiga conhecida sobre o Imperador Perpétuo é de 1837.

ª     CORTEJO IMPERIAL - espécie de cortejo processional, o qual, partindo da igreja que sedia a festa, vai buscar o Imperador para, no templo, assistir à missa solene e ao término desta, passar o cargo para o novo Imperador que foi eleito para substituí-lo. É acompanhado por congados, folias e banda de música com grande aparato.

ª     ESTANDARTE DO DIVINO - espécie de bandeira simbolizando uma corporação. Distingue-se da bandeira propriamente dita por ter a haste de sustentação central e na vertical, cruzando-se com outra horizantal. O estandarte do Divino é vermelho, com a pomba branca no centro. Ele abre os cortejos da festa, seguindo sempre na frente;

ª     ALFERES DA BANDEIRA - pessoa responsável pelo estandarte, carregando-o a cavalo nas procissões e Cortejo Imperial. Alferes era outrora um posto hierárquico do Exército, correspondente a atual Subtenente. Também tinha o significado antigo de Porta-Bandeira.

ª     BANDEIRAS DO DIVINO - pano preso no alto ou de um lado por uma haste que lhe sustenta e serve para a preensão. Serve de distintivo, no caso, religioso. Sempre vermelha, com a pombinha branca, para lembrar o Divino;

ª     PORTA-BANDEIRA E MORDOMO - vinte Porta-bandeiras levam nas procissões da festa as bandeiras do Divino. São orientados por um Mordomo que leva um estandarte de menor porte, encarregado de dirigi-los;

ª     MASTRO - (do provençal “mast”) : madeiro alto, esguio, reto, enfeitado, que se finca geralmente junto a uma igreja ou local em que se festeja, em cujo topo ergue-se uma bandeira com a estampa do santo festejado. Tem um profundo e complexo simbolismo religioso para o folclore. Na Festa do Divino são levantados pelos congados: - um central do Espírito Santo, e outros satélites de N. S. do Rosário, N. S. Aparecida, São Benedito e Santa Efigênia, conforme devoção de cada Congado. Vale a pena acompanhar os rituais do seu levantamento, que marcam o início da festa. A bandeira do mastro é geralmente emoldurada. Há também dois mastros secundários do Divino: - um na Gruta do Divino e outro na capela de Santa Clara, todos em São João del Rei.

ª     ORATÓRIO DE PESCOÇO - (do latim “oratoriu”): espécie de nicho ou caixa especialmente destinada a guardar a imagem de um santo. O tipo “de pescoço” possui uma alça para se pendurar ao pescoço, com o qual, outrora, ermitões esmolavam pelas ruas, oferecendo o santinho do oratório a beijar. Para a Festa do Divino foi preparado um modelo do século XVIII.

ª     CAVALGADA - (de cavalgar, do latim, “caballicare”): o mesmo que cavalgata. Reunião de cavaleiros que desfilam pela ruas da cidade, precedidos pelo Alferes da Bandeira com o estandarte, e acompanhados por uma Folia do Divino ou Tirador desta, visitando também algumas casas e colhendo donativos. Sua função primordial é anunciar a festa quando está próxima. Em Folclorística (ciência que estuda o folclore), dentre os cinco tipos de cavalhadas conhecidas, esta classifica-se como uma Cavalhada-Anunciatória (do castelhano, “caballada”). Seus coordenadores designam alguns cavaleiros para ajudarem a controlar o desfile. São os Mantenas ou Mantenedores. Os primeiros de cada ala são os Ponteiros.

ª     JUÍZES DE PRENDAS (do latim, “judice”): pessoas responsáveis por solicitar nas casas donativos para a festa. São identificados por uma carta de nomeação e por um crachá expedidos pela Comissão Organizadora, que usa o dinheiro na organização da festa, os alimentos para o almoço festivo e demais prendas para o leilão;

ª     FOLIA DO DIVINO - (do francês, “folie”): grupo folclórico, tipo “folguedo”, de carácter precatório e andarilho, que, levando uma Bandeira do Divino e instrumentos musicais, cantam, dentro do espírito religioso, versos de louvação ao Espírito Santo. Visitam as casa cantando os louvores, saudando o dono do lar, pedindo donativos para a festa e anunciando-a, entre o Domingo da Páscoa e de Pentecostes (Ciclo do Divino). É de origem portuguesa, constituída no mesmo padrão de outras folias (de Reis, São Sebastião, N. S. Aparecida, etc.). Compõe-se de um Folião (responsável pelo grupo), vários Folieiros (músicos-cantores, executando sanfona, violão, cavaquinho, pandeiro, triângulo, xique-xique, caixa, etc.), Tirador ou Embaixador (Folieiro ou Folião que canta os versos em solo, que são repetidos pelos demais em coro - resposta) e Bandeireiro (quem carrega a Bandeira e recebe os donativos). Uma destas folias em São João del-Rei (Bairro do Tejuco) é feminina, fato raríssimo e digno de nota, já que, ao que conste, somente no Maranhão há Folia do Divino formada por mulheres, com o nome de Caixeiras do Divino;

ª     CONGADO - (o mesmo que congada, reunião de “congos”, termo gentílico africano): grupo folclórico, tipo “folguedo”, com origens em elementos culturais africanos e europeus. Consta de vários dançantes, ditos Soldados (geralmente homens), que tocam instrumentos (sanfonas, violões, violas, cavaquinhos, caixas, pandeiros, ganzás, tamborins), cantam e dançam  sob a direção de um Capitão, que canta solista e organiza o grupo, às vezes auxiliado pelos Caciques, ou por um Segundo Capitão. Levam uma bandeira com a estampa de um santo (na maioria das vezes N. S.  do Rosário). Cada grupo de congado é um Terno ou Guarda (com menor frequência dizem também Banda, Turma, Companhia, Corte ou Batalhão de Congado). Há vários modelos de Ternos de Congados, que se distinguem com mais nitidez pelo uniforme e modo de cantar, dançar e tocar. Na festa pode-se ver Guardas de Congos, Catupés, Marujos, Moçambique e Moçambiques bate-paus. Os congados escoltam casais trajados de Rei e Rainha, que em conjunto formam o Reinado;

ª     REINADO - (de reinar, do latim, “regnare”): conjunto de figuras reais, cujos cargos são fictícios, na festa do Rosário, nomeados como Reis e Rainhas, Príncipes e Princesas (quando crianças). Comparecem vestidos em trajes de imitação da realeza, cingidos de coroa ou diadema.  Sua introdução na Festa do Divino possibilitou uma melhor integração dos Ternos de Congados a este festejo, pois são eles que escoltam o Reinado pelas ruas, promovendo o Cortejo Real, que este ano sairá da Rua Barão de São João del-Rei, na Vila Santo Antônio, rumo ao Sr. Bom Jesus de Matosinhos;

ª     CAPITÃO-MOR - (do latim, “maiore”): título honorário dado a um dos Capitães de Congado convidados para a Festa. É uma forma de homenagear um Capitão de destaque por seu longo trabalho pelo folclore. Em 1998 o Capitão-Mor foi o Sr. Luís Santana, do Bairro São Dimas e em 1999 o Sr. José Francisco Sales, do Distrito de São Gonçalo do Amarante (Caburu), pertencente a São João del-Rei;

ª     CAPITÃES DE MASTRO - outra forma de homenagear Capitães de destaque. A função dos Capitães de Mastro é dirigir os rituais de levantamento e descida dos Mastros do Divino, podendo ser ajudados pelo Imperador. São os senhores Raimundo Camilo e Luís Santana.;

ª     MEIRINHOS E MESTRE-DE-CAMPO - responsáveis em auxiliar a Comissão Organizadora no controle dos eventos  da festa durante sua realização, atuando quer como mediadores, quer como orientadores. Os Meirinhos cuidam mais especificamente das ações dos congados  e os Mestres-de-Campo com espadas, abrem o Cortejo Real. Um Meirinho é nomeado Capitão Meirinho, sendo o título de Capitão puramente honorário. São postos antigos e tradicionais. Meirinho (do latim, “majorinu”, um tanto maior), era um antigo funcionário judicial correspondente ao Oficial de Diligências ou um antigo magistrado, de nomeação régia, que  governava amplamente um território ou comarca. Mestre-de-Campo era um oficial do Exército do Brasil Colonial e Imperial, que na hierarquia militar correspondia ao Coronel;

ª     DANÇA-DAS-FITAS - grupo folclórico de origem européia que executa números de dança em torno de um pau na vertical, de cujo topo pendem longas fitas. Cada dançante pega a ponta de uma fita e dança ao redor deste pau, trançando as fitas  no mesmo de modos diferentes, conforme a coreografia adotada, causando significativo efeito estético. Ensaia-se um grupo no SESI e outro no Conservatório de Música.

            O Pároco Pe. José Raimundo da Costa, que chegou na Paróquia de Matosinhos em ????, assim se manifestou com relação ao resgate da famosa festa do Divino Espírito Santo:

                        “A solenidade de Pentecostes, também na Paróquia do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, Diocese de São João del Rei, sempre foi um dos grandes momentos de fé, de crescimento espiritual e comunitário na caminhada da Comunidade. Em algumas épocas, enriquecida com elementos culturais, folclóricos, próprios; em outras menos, mas sempre celebrada com muito fervor, e entusiasmo.

                               A partir do ano passado, 1998, juntamente com uma equipe de auxiliares, temos procurado resgatar expressões populares, culturais, folclóricas e até pitorescas, ligadas à Festa do Divino Espírito Santo as quais contribuíram no passado, e, com certeza, podem, ainda hoje colaborar para manter viva a fé, o amor e a união de nosso povo e também despertar, especialmente em nossas crianças e jovens, consciência da importância da preservação de verdadeiros valores culturais de nossa gente.

                               A Festa em honra ao Divino Espírito Santo, em nossa Paróquia, enriquecida com a tentativa de resgate de expressões culturais e folclóricas próprias, quer ser uma oportunidade, um momento forte, para que todos, não só católicos, cristãos, mas também amantes da cultura e pessoas de boa vontade, possamos crescer na unidade, em meio à diversidade, trabalhando na defesa e na promoção da vida com dignidade para todos.

                               Inspirados pelo Divino Espírito Santo, a terceira pessoa da Santíssima Trindade, assumindo o Projeto Rumo ao Novo Milênio, neste ano dedicado ao Pai, vivendo a caridade que promove e liberta, refletindo sobre a importância da Reconciliação, somos convidados a trabalhar, especialmente, em prol dos Direitos Econômicos: Terra, Alimento, Trabalho, Moradia...

                               A campanha da Fraternidade promovida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB, deste ano de 1999, com o tema “A Fraternidade e os desempregados” e o tema “Sem trabalho...  Por quê?”, propõe um debate nacional não só sobre as conseqüências, mas sobre as muitas causas desse grande problema social que atinge milhões de pessoas, inclusive em nosso país. É o trabalho, um dos direitos econômicos sendo desrespeitado... Juntos, movidos pelo Divino Espírito Santo, somos chamados a viver a fé sempre ligada à vida.

                               A Festa do Divino Espírito Santo, em Matosinhos, enriquecida pelos seus elementos culturais próprios, quer ser um momento forte de Evangelização, nesse final de milênio sobretudo.

                               “Uma característica particular da América consiste na existência de uma intensa piedade popular radicada nas diversas nações...  A piedade popular, se for convenientemente orientada, contribui também para aumentar nos fiéis a consciência da própria pesença à Igreja, nutrindo o seu fervor e oferecendo assim uma válida resposta para os desafios atuais da secularização” (Exortação Apostólica Pós-Sinodal ECCLESIA IN AMÉRICA - A  Igreja na América, do Papa João Paulo II, de 22 de janeiro de 1999, sobre o encontro com Jesus Cristo vivo, caminho para a conversão, a comunhão e a solidariedade na América, n.º 16).

                               Oremos para que a “Festa do Divino”, também em nossa Paróquia, seja de fato um momento forte de experiência de Deus para todos, de reavivamento na fé, busca de unidade, compromisso de todos na construção de uma Sociedade mais justa, mais fraterna, com mais amor, defendendo e promovendo a vida com dignidade para todos.

                               Inspirados pelo Divino Espírito Santo, trabalhemos para que os direitos fundamentais da pessoa humana sejam respeitados: direito à vida, à educação, ao lazer, à saúde, à moradia, ao trabalho e a tantos outros.

                               Será muito bom se cada pessoa que participar da ‘Festa do Divino”, também em Matosinhos, crescer no amor a Deus, no amor ao próximo, no interesse pela cultura.

                               Que Maria, mãe de Deus e nossa, seja nossa companheira de caminhada, nos mostrando Jesus, o único caminho que nos leva ao Pai  “RECEBEI O ESPÍRITO SANTO” (Jo. 20,22).

INFORMATIVO DA FESTA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO

COMISSÃO DE FESTAS - mesários

Pe. José Raimundo da Costa

Pároco/Pres. da Comissão

Osni Geraldo de Paiva

Coordenador Geral

Ulisses Passarelli 

Folclore e História

José Cláudio Henriques

Divulgação e História

José Antônio de Ávila

História

José Gonçalvez  e Paulo Zini

Imperadores Anteriores

Antônio Carlos Garcia

Finanças

Antônio da Silva Serpa

Coordenador Comunitário

Nelson Domingos de Abreu

Infra-Estrutura

Damião Guimarães

Cavaleiro do Divino

Geraldo Elói de Lacerda

Imperador Eleito

Otávio Félix Pereira da Silveira 

Liturgia

Adriana Márcia Zim

Figurino

Maria Aparecida de Salles

Folclore

Maria Sílvia Teixeira Henriques

Conjunto e harmonia

Responsável  e revisão

José Cláudio Henriques – Telefones: (32) 3371-5342 ou (032)9981-4203

Ilustrações

Osni Paiva

Textos

Ulisses Passarelli, Kleber Adão Sacramento e José Cláudio Henriques

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CRONICA SOBRE A FESTA, NO ANO DE 1916

                “Há epochas que jamais se esquecem, por ficarem impressas em nossa memoria com caracteres indeléveis; taes são aquellas em que gozamos alguma felicidade e que deixa-nos uma saudosa recordação, que tantas vezes vem distrahir-nos no meio das attribulações da existência, como um pensamento consolador, no auge do tormento, ou como uma gotta de orvalho na aridez do deserto.

                Emoções há tão duradouras que se renovam a cada instante como as que sentimos quando passamos apreciaveis momentos.

                Revelar o que experimentamos quando somos felizes, talvez pareça uma profanação da ventura que gozamos; muitos pensam que o prazer deve ser ignorado para conservar toda a sua poesia.

                Enganam-se quando o coração nos transborda de alegria devemos a todos comunical-a; é justamente o que acontece a todo o são-joanense quando se approxima a epocha em que se realizam os tradiccionaes festejos de Mattosinhos.

                Durante três dias, a cidade se despeja toda para o pittoresco arrabalde, e é de ver-se como se engalana o largo para receber os romeiros que alli aportam às centenas e aos milhares. É um reboliço alegre, uma confusão agradável, quase um ondeamento; são moçoilas de toilletes leves, sobraçando “manteaux”, num frufru de saias roçagantes, são rapazes alegres e joviaes, soltando gargalhadas numa claridade indiscriptível; são matronas respeitáveis levando os cirios de exvotos; são homens de toda a edade, sisudos e encapotados, que tomam parte nesta romagem piedosa e que se dirigem para a bella capellinha onde se acha o meigo nazareno de braços abertos, na atitude de quem a todos acolhe com um amplexo paternal; feita a visita e deixada a esmola no gasophylacio, voltam todos aos folguedos de rua, que de ordinário constam de mil jogos differentes.

                Alli, todos são tentados pelo demônio do jogo; joga o velho e o moço; o rico e o pobre; a dama e o cavalheiro, todos na mais intima cordialidade; disfarçadamente o chefe de família vai se abeirando no panno verde, compra fixas e faz a sua fésinha num número ou no esguincho; a madame arrisca uns tostões no jaburú; a rapasiada se distrae na campista e na vermelhinha, enquanto as senhoritas chupam balas e confeitos e os pintalegretes e fuinhas vão arrastando-lhes a aza; os molecotes de pernas escanchadas attentam ao buzio e os glutões se empanturram de empadinhas e pasteis pelos botequins que coalham o largo com suas bandeiras coloridas e enfeites berrantes; mil girandolas caracolam e estrugem nos ares, as peças de artificio circunvolam nos postes e os foguetões lacrimejam nas alturas; em artístico coreto, excellente banda executa lindas peças de harmonia e festivas marchas, cujos sons se confundem com o silvar da locomotiva chamando o povo a regressar à cidade que a esta hora se acha sepultada em profundo silêncio.

                Agora é que sentimos o frio a engelar-nos os membros e tiritando nos valemos de bons capotes; a onda tumultuosa que coleou o largo, rindo, folgando e rufando pandeiretas, regressa aos lares com saudades dos felizes momentos em que esqueceu os dissabores e as desillusões da vida, que só nos deixa um frêmito de pesar e mágua.

                Cumpre por isso que ao menos nesses três dias desappareça a tristeza, sendo substituída pelo clarão vivo e luminoso da alegria, do prazer, do jubilo. (Jornal A Tribuna, 14/05/1916, nº97, São João del-Rei)”.

                Neste último relato, como o do codinome “Salusto”, descrito anteriormente, esclarece claramente, o quanto a festa era famosa, alegre, participativa, tanto no aspecto religioso, como no profano. O povo, realmente sonhava o ano todo com a chegada da festa, e, entristecia-se, a ponto de chorar, com o seu findar.

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OUTROS FATOS HISTÓRICOS DA FESTA

No sábado, acontecia a distruibuição de carnes aos pobres e necessitados. Este costume, de acordo com os estudiosos do Divino, acontecia tendo em vista ser esta festa considerada como uma festa de congraçamento, de cooperação e solidariedade. A esta característica se junta o agradecimento, o pagamento de promessas, a prática da caridade por meio da distribuição de alimentos aos desvalidos.             Prosseguindo o calendário festivo, entrava-se no domingo, dedicado ao Divino Espírito Santo. A segunda-feira, era consagrada ao Senhor Bom Jesus de Matosinhos, terça-feira, Nossa Senhora da Conceição da Lapa, e por algumas vezes, quarta-feira era dedicada a Santana.

As festas de Matosinhos, ao serem realizadas no período que, na liturgia católica, romana corresponde a Pentecostes, ou seja, na comemoração da descida do Espirito Santo sobre os apóstolos, dotava o dia dedicado ao Divino Espírito Santo de um significado especial. Em vista disso é que se denominava a festa de Matosinhos como festa do Divino Espírito Santo.

Segundo Kleber Adão, no Brasil, a festa do Divino ancorou no século XVI. O seu caráter festivo e folclórico, advindo do catolicismo folclórico português, aqui aportou e ganhou outras colorações culturais, o que veio dar ao Divino Espírito Santo de Matosinhos o caráter de ator principal.

Fato curioso, prossegue Kleber Adão e que parece ser característico das festas do Divino Espírito Santo em Matosinhos é essa procissão de Santo Antônio, imperador perpétuo. Carregado numa liteira, o santo é conduzido até a matriz do Senhor Bom Jesus. Segundo o folclorista Ulisses Passarelli, in “Informativo da Festa do Divino Espírito Santo de Matosinhos”, ano II, nº 2, maio de 1999, São João del Rei era a única cidade do Brasil a ter um imperador perpétuo eleito, que não perdia o seu posto com a chegada de Pentecostes.

Nos festejos de 1884, as Cavalhadas estiveram presentes, que segundo comenta Sebastião de Oliveira Cintra, era comum em tempos remotos. [2] Neste mesmo ano, talvez por  se realizarem os torneios esquestres, o aluguel de casas no arraial de Matosinhos elevou-se para 100$000 somente para os três dias de festa. Com vistas a proporcionar um meio “fácil e cômodo de locomoção” para Matosinhos, fora contratado pelos senhores José Antônio de Almeida e Manoel Anselmo Alves de Oliveira, os serviços da Estrada de Ferro do Oeste. Circulará um trem, durante os dias de festa “ao preço módico” de 300 réis, na primeira classe e 200 réis na Segunda, ida e volta.

Os cavaleiros que irão simular os combates travados entre mouros e cristãos, são fazendeiros vindos do Rio Novo, (...) caprichosamente vestidos e montando lindos cavalos ricamente ajaezados. Para isso, a praça, em frente a capela do Senhor Bom Jesus, foi nivelada e construída, em forma de círculo, palanques altos. (...) Os palanques formando anfiteatro, ornados de galhardetes e bandeiras, estofos de variadas cores, ficavam cheios de gente. [3] Ao povo era reservado o espaço debaixo dos palanques. Nos quatro dias de festa, oito cavaleiros mouros e sete cristãos realizavam o combate, proporcionando divertimento à multidão,

(...) um rei Mouro ocupava, soberbo, bonito palanque, que lhe servia de trono, tendo ao lado uma interessante princezinha vestida com todo o gosto e esplendor e os garbosos cavaleiros executaram variados combates e torneios que, começando à três horas da tarde, prolongaram até às seis.

A última hora era destinada ao tiramento de argolinhas, que oferecidas a alguns dos assistentes, provocavam da parte destes a retribuição por meio de prendas... [4]

O comentário foi que a festa profana sufocou a festa religiosa, propriamente dita, que, mais do que nos anos passados passou quase desapercebida. Embora marcada pelo brilhantismo das cavalhadas e pelos espetáculos circenses da Companhia do afamado artista Manoel Pery, os festejos populares de 1884, em Matosinhos, foram alvo de atos de violência que aconteceram na véspera da festa do Espírito Santo. Três indivíduos travaram luta, terminando em facadas e tiros. Já ao chão, e “nadando em sangue,”  foram interpelados pela polícia, conduzidos ao hospital e processada a abertura de inquérito. O redator da nota jornalística, esboça em seu comentário a insatisfação com a ação da polícia local. (...) É uma polícia esta da nossa terra que não previne os delitos e quando estes se dão não tem também a energia da repressão. [5]

Em 1877, o cronista do Arauto de Minas, contrapões em seu texto dois cenários, sobre os quais desenrola-se as festas de Matosinhos. Idilicamente, realça num primeiro instante de seu olhar, a beleza do arraial de Matosinhos que (...) situado à margem esquerda do Rio das Mortes com seus verdes pomares coroados de copados arvoredos de dourados frutos, parece a rizonha donzela sentada à beira do Riacho, madeixas solta ao vento e lábios entreabertos, donde se exala perfumado hálito. [6]

Continua ele, dizendo que,

 (...) no espaçoso largo ergue-se a poética igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, cuja imagem Veneranda impõe à multidão de devotos romeiros o respeito e devoção com que se distingue o bom povo sanjoanense. Em frente a igreja eleva-se o simbólico cruzeiro, majestoso estandarte da redenção, como guarda avançado do Santuário, onde o Cântico dos Levitas, acompanhado de melodiosos acordes celebra na Páscoa do Espírito Santo a descida do Paráclito.

A seguir o autor dá destaque ao ambiente profano, onde a multidão é, por um lado, formada por formosas jovens e jovens mancebos e, por outro, por pândegos, que invadem os botequins e as barraquinhas pitorescas, formadas por folhas de verde pita, ...onde se aprecia a posta de lombo, a tostada costeleta de leitão, regados a roxo licor ou a branquinha brasileira.

A pausa é dada com o repicar dos sinos, quando começa a festividade religiosa no interior da igreja. Do coro partem as melodias, seguida da fala do sacerdote na tribuna. Todos ouvem em silêncio e a festa do dia termina com o Te Deum Laudamus. À noite, retomam-se os eventos profanos, quando: o largo iluminado enche-se de multidão que dança e assiste aos fogos de artifício. E assim vai, até o dia clarear, quando ... o sol nascente espanando as trevas, chama a todos à realidade de vida, e cada qual à seus afazeres. [7]

Para Matosinhos parece que acorriam parte significativa da população que residia no centro e arredores da cidade de São João del Rei, por ocasião das festas do Divino Espírito Santo. Os jornais dão conta desse procedimento, por meio da circulação dos trens, que saíam da estação central até a de Chagas Dória, pelo deslocamento das famílias para o arraial de Matosinhos, hospedando-se em pensões ou em casas de amigos e parentes, que lá residiam ou lá possuíam residências de veraneio. O “Arauto de Minas,” noticia em 1866, o movimento de translado das diversas famílias que, na véspera da romaria do Espírito Santo, passam a residir no arrabalde de Matosinhos, que, segundo o mesmo, transforma-se num verdadeiro bois de Bologne da sociedade sanjoanense. [8]

Em uma outra nota de jornal, é anunciado que as “animadas” festas de Matosinhos estão lotando o pitoresco arrabalde, com a presença de romeiros, grande concurso de povo. Os festejos ganham maior brilhantismo, na visão do cronista, com a afluência de “distintas famílias e elegantes senhoritas.” Num mesmo espaço, parece conviver, pelos menos durante os três dias de festa o chamado povo, a burguesia local e a aristocracia, intermediadas pela relação sagrado e profano, inseridas nesse catolicismo. A sociabilidade festiva, presente por meio dos divertimentos estende-se, de acordo o discurso do cronista,  desde a barraca do pequeno vendedor de doces à elegante e humanitária tômbola de damas de caridade. Os divertimentos se apresentam na forma de jogos diversos, botequins, carrocel e o excelente cinema do teatro municipal, ocorrido em um barracão artístico e confortável. Estamos já  em 1912. As touradas já não se fazem mais presente, como dantes. Outro destaque, nesse momento, é para a ordem pública. O cronista faz questão de assinalar que mesmo com a presença de cerca de 6000 pessoas a ordem pública esteve inalterada, o que segundo ele, atesta  o nível de civilidade e progresso da cidade. [9]

O assim chamado “povo,” misturado entre a população bem nascida e bem criada, que dirigia-se a Matosinhos, nas festas do Espírito Santo, sempre é destacada pelos cronistas dos jornais. Com raríssimas exceções são figurantes anônimos, que concorrem em quantidade para  o brilhantismo das festas. Contudo são eles, romeiros, devotos, foliões, donos de humildes barracas, que fazem da festa de Matosinhos, a mais popular, animada e concorrida da região e, por isso, motivo de preocupação das autoridades civis e religiosas.

                O Espírito Santo, segundo o santeiro e artista plástico Osni Paiva é sobretudo a comunhão e o amor que existe no seio da Trindade, entre a Pai, o Filho e o próprio Espírito Santo. E nós somos templos do Espírito Sacrário da Trindade. Podemos ter um pequeno vislumbre de quem seja o Espírito Santo quando compreendermos que, assim como o filho assumiu forma humana e se tornou Jesus de Nazaré, para elevar os homens e resgatá-los, assim também o Espírito de Deus, o Espírito Santo, para santificar e estabelecer os homens no amor e no diálogo com a Trindade, assumiu a forma de uma pomba (Jo. 1.32) e a de línguas de fogo (At. 2.3,4), aceitando também, as limitações da natureza criada por amor da criatura humana. Ele é o amor do Pai e do Filho. Chamamo-lo de Deus-Amor.

                Continuando, Osni Paiva relata: O verdadeiro motivo pelo qual as festividades de Matosinhos foram suspensas pelo então Bispo de Mariana, em 1924, se deve a uma Conferência Episcopal da Província de Mariana realizada em Juiz de Fora em abril de 1923, quando foram aprovadas algumas decisões, que vamos resumir em duas:

a)    Proibimos em absoluto os bailes em benefício de Instituições Católicas, bem como outras festas beneficentes com jogos de azar ou divertimentos de moralidade duvidosa;

b)    Proibimos igualmente as festas religiosas com jogos a dinheiro, nas praças ou em quaisquer lugares franqueados ao povo, determinando aos Rev. Vigários que recorram às autoridades e, no caso de nada conseguirem, suspendam imediatamente os atos do culto, seja na sede da Paróquia, seja em capelas. (artigos 15 e 16 das Resoluções - Jornal Ação Social - 12/06/1924).

As jogatinas de Roletas e Jaburus na dependência do artístico Pavilhão de Matosinhos, posteriormente também demolido, teriam contribuído para a drástica supressão da históricos festejos. A imprensa local, tendo à frente o poeta Bento Ernesto Júnior, protestou contra a drástica resolução do Rev. Bispo de Mariana. Dom Helvécio engabelou os descontentes com uma carta a Basílio de Magalhães, então Prefeito de São João del Rei, dizendo: “Mandei dar os passos precisos para a criação da Paróquia de Matosinhos,  talvez neste mês a inaugurar”. A Paróquia só seria criada em 1960, maculada logo de início pela lamentável demolição da velha Igreja de Matosinhos.

(1) Cavalhada - Passada a época dos cavaleiros andantes, das invasões dos Mouros, das conquistas de novos mundos, o Português que para ca veio, como bom ibero que era, consolava-se com as cavalhadas, como glorificação pomposa dos riscos a que se tinha exposto, na pessoa dos seus antepassados. A cavalhada evocava um episódio guerreiro entre os mouros e cristãos.  Dos cavaleiros solenemente vestidos de uma túnica branca, de espada na cinta, conduzindo lanternas, e o pisar imponente dos cavalos inquietos, constituíam realmente um espectáculo que chamava a atenção do povo. Os cavaleiros eram divididos em dois grupos, representando os cristãos e os mouros. Os cavalos e os arreios eram enfeitados com as cores dos cavaleiros e com muitos guizos. Tudo tinha um enredo.



[1] Arauto de Minas, São João del Rei, 17 de maio de 1884

[2] CINTRA, Sebastião de Oliveira. Festas de Matosinhos Antigamente. Op. Cit. p. 10

[3] Arauto de Minas, São João del Rei, ANO IXI, n. 10,  14 de junho de 1884

[4] Arauto de Minas, São João del Rei, ANO IXI, n. 10, 16 de junho de 1884

[5] Idem, p. 2

[6] Arauto de Minas, São João del Rei, n. 11, 19 de maio de 1877

[7] Variedade. Arauto de Minas, São João del Rei, n. 11, 19 de maio de 1877

[8] Arauto de Minas, São João del Rei, AnoX, n. 7, 14 de maio de 1886

[9] O Dia, São João del Rei, n. 59, 28 de maio de 1912

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